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Isolamento, vaidade e ruptura. O que motivou a renúncia de Falcão?

Carlos Falcão renunciou ao cargo de presidente do Vitória - Divulgação/Vitória
Carlos Falcão renunciou ao cargo de presidente do Vitória Imagem: Divulgação/Vitória

André Uzêda

DO UOL, em Salvador

24/03/2015 05h00

Pontualmente às 18h30 da noite da última segunda-feira (23) o texto de renúncia de Carlos Sérgio Falcão, até então presidente do Vitória, foi enviado por e-mail aos pouco mais de 300 conselheiros do clube.

Às 19h, começaria a reunião -- meramente protocolar -- que selaria seu destino à frente do rubro-negro.

A mensagem em massa foi seu último ato como presidente. Quando a reunião deu início, e a carta foi entregue ao presidente do conselho em exercício, os trâmites foram meros registros oficiais. Oficiosamente, Falcão já estava afastado da presidência do Vitória.

Eleito por aclamação em dezembro de 2013, ele teria seu mandato em vigência até o fim de 2016. Um triênio que não se chegou a cumprir alvejado por insucessos na esfera esportiva e uma sucessão de erros políticos na condução do poder.

Em campo, a sequência negativa no ano de 2014 foi: derrota no Baiano (sem vencer nenhum clássico Ba-Vi), eliminação com goleada na Copa do Nordeste (levou 5 do Ceará nas quartas-de-final) e rebaixamento para a Série B do Brasileiro -- ao perder um jogo que bastaria vencer, em casa, para o desinteressado Santos para se livrar degola.

Soma-se isso a perda dos campeonatos de base nas categorias inferiores (ponto no qual o Vitória há tempos logra mais sucesso que o rival Bahia) e derrota até nas disputas de Remo, esporte que o rubro-negro é tradicionalíssimo no estado.

Fora da esfera esportiva, Falcão foi se afastando da sua diretoria à medida que os revés se sucediam. De estilo diferente do seu antecessor (e padrinho político) Alexi Portela preferia delegar funções a cobrar presencialmente seus comandados.

"Ele tinha a alma de um empresário e não de um administrador. Às vezes ele delegava uma função a um diretor e esquecia de cobrar o resultado. O cara fazia o que queria com a pasta", diz um dos conselheiros, à sombra do anonimato.

Outros conselheiros reclamam da vaidade do agora ex-presidente.

"Não tratava bem os funcionários. Ele era meio arrogante, principalmente no trato com os mais humildes", contam.

Alguns relatam até um piti que ele teria dado ao encontrar um funcionário que teria estacionado o carro na vaga da presidência dentro do Barradão. "Ele quase foi à loucura com aquilo", dizem.

Nos bastidores, comenta-se ainda que a saída de Falcão esteve relacionada a um possível afastamento dele com Portela.

Quando o Vitória foi eliminado pelo Colo-Colo, no último sábado (21), estopim da crise esportiva que derrubou Falcão, o filho de Portela usou as redes sociais para criticar publicamente a gestão do sucessor do pai.

Alexi Portela, porém, negou a ruptura. Da França, onde está viajando, ele falou com o UOL sobre a renúncia de Falcão.

"Falcão é um cara competente que ajudou demais minha gestão. Tanto que foi o nome indicado para me suceder. Era o mais preparado para isso. Infelizmente os resultados não vieram e a pressão, após o rebaixamento, acabou atrapalhando a continuidade do seu mandato", disse.

A reportagem tentou contato com o presidente Falcão, que manteve o celular desligado após o pedido de renúncia. Ele é conselheiro do Leão há mais de 20 anos e, fora do futebol, atua como empresário -- sem ligações com a bola.

Pelo estatuto do Vitória, o presidente do Conselho em exercício tem 10 dias para marcar novas eleições e até 30 para viabilizá-la.

A direção interina do Vitória quer marcar novas eleições para o último dia de março. As eleições serão nos mesmos moldes da anterior, com voto apenas dos conselheiros do clube. A oposição, porém, defende quer voto aberto para todos os sócios.

COMEMORAÇÃO

Integrantes de grupos de oposição do Vitória comemoraram a renúncia do presidente  Falcão.

Walter Seijo, integrante do movimento Vitória Século XXI, e vice-presidente do clube nos anos 1990, classificou a gestão de Falcão "como amadora" e responsável "por atrasar o clube".

"Quando saímos, deixamos o Vitória como um clube profissional. Hoje é uma gestão amadora. Parece futebol dos anos anos 1960. Trouxemos jogadores como Aristizábal, Petkovic e Bebeto. O Vitória de Falcão tem jogador como Edinei (zagueiro que falhou na partida contra o Colo-Colo) e tantos outros inexpressivos", disse.

Larissa Dantas, também integrante deste movimento, questionou o modelo eleitoral que vai eleger o próximo presidente do rubro-negro.

"É um modelo viciado. O conselho que elegeu Falcão vai ser o mesmo que elegerá o próximo presidente. Nós acreditamos que este conselho está irregular e, por isso, contestamos essa eleição na Justiça. Exigimos uma intervenção judicial no Vitória para restabelecer a democracia".  

A principal organizada do Vitória, a torcida Os Imbatíveis, publicou nota em seu site oficial exigindo a renúncia do ex-mandatário horas antes dela ser consumada.

Em nota, a torcida disse que:  "tivemos um ano de 2014 trágico, o qual perdemos absolutamente tudo e passamos por momentos vergonhosos. Mesmo com o pedido de parte da imprensa e da torcida pela sua saída, nós continuamos com o nosso apoio.  Acreditamos que com o tempo e principalmente com os erros cometidos tudo seria superado e aí então veríamos resultados melhores. Mas a melhora não aconteceu e o tempo nos mostrou que é hora de mudanças".

No portão que dá acesso ao estádio do Barradão, torcedores se organizaram para pressionar os conselheiros a exigir a renúncia do então mandatário do Leão.
Quando chegou a notícia da renúncia eles comemoraram do lado de fora.

"Parecia festa de largo", comentou um dos conselheiros.

A reunião que terminou com a queda de Falcão estava marcada há mais de três meses. Nela, inicialmente, seriam discutidas a aprovação de contas referentes ao ano anterior. Apenas o último ponto era sobre "o que ocorrer" -- e, ironicamente, acabou sendo o principal do encontro.