Saiba por que a Arena Pernambuco pode se tornar o estádio mais caro da Copa
A Arena Pernambuco, estádio construído pela empreiteira Odebrecht e pago pelo governo daquele Estado para receber cinco jogos da Copa do Mundo de 2014, teve um custo fixo ainda não revelado, mas que, segundo as autoridades estaduais, deverá ficar na casa dos R$ 700 milhões.
A Odebrecth tem uma concessão para exploração do equipamento esportivo por 30 anos. Até lá, além do valor fixo que vem recebendo parceladamente por ter construído a arena, a empreiteira tem, por contrato, uma receita garantida de R$ 73 milhões por ano. Se a operação do estádio não resultar nesta receita, o contribuinte pernambucano completa o caixa da empreiteira baiana.
Conforme o UOL Esporte mostrou em reportagens recentes, por causa dessa cláusula contratual, o desembolso a mais do Estado com o estádio poderá chegar a R$ 1,76 bilhão, ou até ultrapassar esta cifra, fazendo com que o preço total da arena supere com folga a casa dos R$ 2 bilhões.
O contrato original estabelecido entre as partes em junho de 2010 previa uma projeção de receita para arena de R$ 73 milhões por ano a ser obtida com a renda de, pelo menos, 20 jogos por ano de cada clube grande de futebol da capital: Sport, Santa Cruz e Náutico.
Mas, dos três times que deveriam jogar suas principais partidas lá nos próximos 30 anos, somente o Náutico – o de menor torcida – assinou contrato com a administradora do estádio. Com isso, a receita do arena sequer se aproxima do mínimo previsto em contrato. O TCE-PE (Tribunal de Contas de Pernambuco) calcula que, a seguir esta toada, o governo estadual repassará à Odebrecht uma média de R$ 60 milhões anuais ao longo dos próximos 30 anos.
Este não é, porém, o único motivo a levar a Arena Pernambuco a ser uma fonte de receita garantida para a Odebrecht, e de prejuízo para os cofres públicos. O problema maior reside nessa receita anual presumida, de R$ 73 milhões, prevista em contrato assinado em 2010 pelo então governador Eduardo Campos (PSB).
Como se chegou à cifra de R$ 73 milhões por ano como receita a ser garantida pelo Estado? De acordo com o contrato assinado com a empreiteira, foi através de pesquisas de mercado e análises conjunturais sobre o futebol pernambucano, encomendadas pelo governo estadual para balizar a parceria com a Odebrecht. O problema é que as conclusões a que chegou este estudo não são, segundo o TCE-PE, compatíveis com a realidade.
Veja, abaixo, os principais pontos que chamaram a atenção do órgão de fiscalização no contrato de parceria do governo de Pernambuco com a Odebrecht.
A Odebrecht Properties, empresa do grupo que controla o estádio, enviou uma nota ao UOL Esporte com seu posicionamento acerca da questão. Leia ao fim desta reportagem.
1 - Ocupação superestimada de camarotes
A projeção da receita operacional com camarotes (R$ 13,4 milhões), business seats (R$ 16,5 milhões) e assentos premium (R$ 17,6 milhões), totalizou R$ 47,5 milhões ao ano. Não existe no país uma receita como essa com tais assentos. A receita auferida em 2013 com cadeiras cativas e camarotes, no Estádio do Morumbi, em São Paulo, por exemplo, atingiu R$ 16,73 milhões, o que representa um terço da receita projetada para os produtos semelhantes ofertados na Arena da Copa de Pernambuco.
Não existe no contrato uma justificativa para o valor de receita mínima estipulado, a não ser a expectativa de que uma arena multiuso moderna como a de Pernambuco atrairia muito mais público aos estádios. Ainda não aconteceu.
2 - Programas de fidelidade superestimados
A projeção da receita operacional para cliente do Mercado Consumidor (assento premium e pacotes de jogo - programas de fidelidade), no total de R$ 40,82 milhões, não foi confrontada com dados do cenário real oriundos da série histórica dos jogos do Sport, Náutico e Santa Cruz, tais como: média de público, taxa de ocupação do estádio e receita auferida.
Para se ter uma ideia, isso representa uma receita média anual de R$ 14 milhões de cada um dos três clubes. Pois bem, segundo o orçamento oficial do Corinthians para 2015, o clube vai arrecadar R$ 6,25 milhões com o "Fiel Torcedor", seu programa de fidelidade. Em 2014, o segundo time de maior torcida no Brasil arrecadou R$ 5 milhões com o programa.
3 - Falta de projeção de receita
Como descreve o TCE-PE: "Não houve indicação do valor projetado (preço) para cada produto que compõem a Receita Operacional Projetada (camarote, business seats, assentos premium e pacotes de jogos). Tampouco, o valor projetado por cada time (Sport, Náutico e Santa Cruz) e por produto, considerando o perfil econômico dos torcedores desses times."
Quer dizer, o contrato previu uma receita mínima a ser garantida, mas não ancorou tal projeção em dados econômicos. Não há elementos que mostrem ser possível alcançar a receita que se estipula. O contrato não contempla uma ponderação sobre média de público de cada um dos times - que são bem diferentes - para assim montar um modelo de negócio com chances de alcançar a receita presumida.
4 - Dados infundados ou inconclusivos
Novamente, nas palavras do TCE-PE: "A projeção da Receita Operacional foi embasada exclusivamente numa pesquisa de mercado, tanto para os produtos ofertados ao Mercado Corporativo como para o Mercado Consumidor. O universo dessa pesquisa compreendeu 88 entrevistas corporativas e 288 entrevistas com consumidores".
Isso significa que, para balizar as previsões de receita do contrato, apresenta-se uma pesquisa com 88 representantes de empresas e 288 torcedores. Chegou-se à conclusão de que uma receita anual de R$ 73 milhões seria possível de ser alcançada entrevistando menos de cem torcedores de cada um dos clubes, com perguntas como se ele "passaria a frequentar mais estádios de futebol se houvesse mais conforto e segurança nas praças esportivas".
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Assim, em relatório enviado ao governo de Pernambuco no início deste mês, o TCE-PE afirma: "Diante dessas fragilidades, é possível que o valor projetado da Receita Operacional (R$ 73,26 milhões/ano) encontre-se superestimado, e ainda que Náutico, Sport e Santa Cruz jogassem anualmente as 60 melhores partidas na Arena, conforme prevê o contrato, aquela receita não seria atingida, gerando Contraprestação Adicional (despesa) a ser paga pelo Estado à Concessionária."
O governo deverá responder nas próximas semanas se pretende ou não rever as cláusulas contratuais. Por ora, afirma que "não há dispositivo contratual que imponha automaticamente a suspensão dos pagamentos" e que " tem mantido com a Concessionária um diálogo permanente no sentido de construir a melhor estratégia com vistas a potencializar a capacidade de geração de receitas de negócio, ao mesmo tempo em que iniciou, com a Concessionária, discussões quanto aos itens de custos, despesas e receitas do empreendimento".
Nota da Odebrecht Properties sobre a matéria do UOL Esporte
Acerca da reportagem “Saiba por que a Arena Pernambuco pode se tornar o estádio mais caro da Copa”, publicada pelo UOL, a Arena Pernambuco Negócios e Investimentos S.A esclarece que os custos de construção do estádio conceitualmente não devem estar associados às receitas referentes à operação.
A reportagem adicionou ao valor da construção os aportes do parceiro público pelo prazo do contrato da Parceria Público-Privada, de 30 anos, sem considerar a possibilidade de a concessionária aumentar as suas receitas e, consequentemente, diminuir a contraprestação pública, o que já aconteceu nos meses de novembro (R$ 2,6 milhões) e dezembro (R$ 3,7 milhões) devido ao crescimento das receitas. Dessa forma, para fazer a comparação em relação as demais arenas, o mesmo critério deveria ser aplicado.
O contrato de Parceria Público-Privada que viabilizou a Arena Pernambuco, chancelado por órgãos de controle e fiscalização como TCE, MPF, MPPE e Alepe, prevê dois tipos distintos de contraprestação do Governo do Estado: o ressarcimento de investimentos em obra e a contraprestação relativa à operação e manutenção da Arena, nos moldes:
- Investimento feito para a construção da Arena – equivalente a 75% do valor da obra que só começou a ser pago após a conclusão da obra – R$ 389 milhões (base maio/2009), acrescido da correção monetária;
- Parcelas mensais para pagamento da operação – destinadas a amortizar os financiamentos remanescentes da obra e o custo financeiro desses empréstimos, além de pagar também tributos, despesas e custos de operação e de manutenção da Arena.
A Arena foi construída em 18 meses, com o padrão estabelecido pela FIFA sem a utilização de recursos públicos, tendo a Arena Pernambuco Negócios e Investimentos S.A aportado recursos próprios e dado garantias para obter financiamentos bancários.
O governo do Estado pagou à Concessionária parte dos investimentos feitos para a construção. Ele amortizou a parcela principal do financiamento e pagou parte da correção monetária, uma vez que esse valor é posição maio/2009.
Já a operação, que prevê o compartilhamento de riscos das variações das suas receitas, fechou com prejuízo operacional de R$ 28,4 milhões, em 2013, e o resultado em 2014 foi também negativo. A frustração da receita projetada deu-se, entre outros fatores, pelas questões de mobilidade, como as melhorias no transporte público, e a não concretização das 60 melhores partidas dos três maiores clubes pernambucanos.
Os resultados da operação em novembro e dezembro já começam a mudar as perspectivas e são reflexo dos esforços da Arena Pernambuco Negócios e Investimentos S.A para a viabilidade financeira do negócio. Com o intuito de reduzir os custos do Governo e oferecer um conteúdo ainda mais diversificado aos pernambucanos, a Concessionária negociou contrato de naming rights e, além do contrato de 30 anos com o Clube Náutico Capibaribe, atraiu jogos do Sport e Santa Cruz, além de diversos eventos corporativos. Como consequência, as contraprestações do governo foram menores em novembro (R$ 2,6 milhões) e dezembro (R$ 3,7 milhões) devido ao aumento de receitas. Nos meses anteriores a contraprestação foi de R$ 5 milhões.
O Náutico levou cerca de 20 mil torcedores em algumas de suas partidas pela Série A do Campeonato Brasileiro de 2013. O Sport chegou a ter público de mais de 37 mil pessoas e o Santa Cruz atingiu mais de 30 mil torcedores em jogo realizado em 2014. Para 2015, a Arena já fechou contrato de mais dez jogos do Sport e seis do Santa Cruz, estando em negociações para aumentar a quantidade de partidas com esses parceiros.
A PPP tem um prazo de 30 anos e, apesar da inauguração da Arena Pernambuco ter ocorrido em maio de 2013, o estádio ainda não teve um ano pleno de operações, visto que nos períodos que antecederam a Copa das Confederações e a Copa do Mundo houve restrições do uso do gramado e de outros espaços da Arena pela FIFA. Com ações de aprimoramento da mobilidade e outras obras de infraestrutura, com os investimentos federais adquiridos pelo Governo na ordem de R$ 1,5 bilhão, o alcance à eficácia contratual é possível, sendo dispensadas as contraprestações públicas.
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