Palmeirense Beting já foi ofendido pela torcida e bloqueado por Valdivia
Autor de um blog no UOL Esporte, comentarista na Fox Sports e na Rádio Jovem Pan, colunista na revista Playboy...Tudo isso ao mesmo tempo! Assim é o incansável Mauro Beting, jornalista esportivo há 26 anos. E diante de tanto tempo trabalhando com o futebol, não faltam histórias ao palmeirense "doente" e defensor de Tite na seleção brasileira. Entre elas, uma ‘mexericada’ que levou na testa de um torcedor (palmeirense!), a previsão totalmente errada em relação ao Leicester no Campeonato Inglês, os bloqueios do deputado federal Marcos Feliciano e de Valdivia no Twitter e o carinho que recebe de torcedores são-paulinos e corintianos. E ele conta tudo isso em entrevista exclusiva ao UOL Esporte.
UOL Esporte: Mauro comentarista de TV, Mauro comentarista de rádio, Mauro colunista, Mauro blogueiro, Mauro escritor. São muitos Mauros, mas qual é o seu preferido?
Mauro Beting: Eu vou na do meu pai, que era um grande jornalista, um grande professor, e por isso que ele adorava palestra. O Palestra Itália e dar palestras. Eu gostaria até de ganhar o salário, a grana que ele ganhava de palestras. Eu adoro fazer palestra, porque, no fundo, é uma aula. Você está conversando. “Ah, mas como é fazer televisão, rádio?”. Cara, rádio é que nem estar no telefone, né? Até acho melhor mandar Whatsapp. TV é uma maquininha em que você tem um cara aqui. De repente, tem milhões. Ou de repente tem quinze pessoas. O duro é ter sido professor universitário, como fui de jornalismo por quatro anos. Em uma aula às onze da noite de sexta-feira, vem alguém fazendo... [reproduz um bocejo, um sinal de desinteresse pela aula]. Aí que te baixa...
UOL Esporte: Gente olhando para o lado...
Mauro Beting: Gente olhando pro lado, gente nem aí. Aí é que te baixa a bola. O resto eu adoro fazer, até porque eu sou jornalista esportivo há 26 anos por ser torcedor de time há 49 anos. E isso que me levou pra cá, então eu gosto de fazer tudo isso. Escrever dá prestígio. Televisão dá popularidade e BBB. Agora, rádio, para mim, dá prazer. No fundo, o que a gente está fazendo aqui, e o que se faz normalmente em televisão, é conversar. E o rádio ouve mais. O nosso podcast aqui no UOL. A gente tem uma interatividade maior. A gente fala, mas escuta. E o cara pode ir com a gente no podcast ou no rádio... vai ao banheiro, vai pra cama – no bom ou no mau sentido –, vai pro metrô, vai pro ônibus, vai pra rua, vai pra qualquer lugar, vai pra PQP, mas vai. Então eu gosto de fazer absolutamente tudo, mas eu acho – e não é porque eu estou aqui – que, nos últimos anos, eu desenvolvi com os 14 livros que eu fiz, com os roteiros que eu escrevi para documentários que eu faço também... eu desenvolvi muito mais o texto nos últimos tempos.
Eu acho o rádio mais palestra porque é um contato, cara. É uma coisa de dar aula. Não que eu tenha essa pretensão professoral, mas eu acho que aprendo muito mais. Na TV, no blog e no rádio, embora haja o comentário, haja interação, é uma coisa meio de distância. Na aula, não. Você, numa palestra corporativa, que eu dou bastante, tem 45 minutos pra passar uma imagem pra caras que mal te conhecem, então é um desafio muito grande.
UOL Esporte: Pô, e com tantos Mauros que existem por aí, como é que você consegue encontrar tempo para fazer as coisas? Isso é o que mais me surpreende. Eu estava vendo... são mais de 10 livros, 14 livros...
Mauro Beting: 14 livros, dois documentários, mais uma série...
UOL Esporte: E produzindo mais?
Mauro Beting: E produzindo mais. Estou finalizando um documentário dos 100 anos do Palmeiras, mais uma série de outros documentários, escrevendo seis livros ao mesmo tempo – desde livros de futebol até a autobiografia do Zico, a autobiografia do Luiz Thunderbird, da MTV, livros do Fiori Gigliotti, retomar um projeto com o Osmar Santos. Tem muita coisa, cara. E é delicioso que eu tenho... com o Amaralzinho, o coveiro. Muitas parcerias. É que dá pra fazer tantas coisas, e eu tenho, entre tantos transtornos, eu devo ter – porque eu não tive coragem pra diagnosticar – TDAH (o transtorno de déficit de atenção com hiperatividade). A minha atenção é dispersa, mas a minha hiperatividade é fazer várias coisas ao mesmo tempo. Por exemplo: o livro oficial do centenário do Palmeiras eu escrevi enquanto fazia um telejornal no Fox Sports. Eu escrevia fazendo jogo. Um dos textos pra mim de maior repercussão, que foi sobre os 110 anos do Grêmio, eu escrevi cortando – ou colando – cabelo. Então, assim, eu faço tudo ao mesmo tempo agora, meio Titãs mesmo.
UOL Esporte: E a família? Mulher, filhos...Consegue vê-los? Quando você encontra tempo para dormir?
Mauro Beting: Graças a Deus, minha mulher é gerente comercial, reclama, mas ela está... a gente vai fazer três anos maravilhosos de casados, uma paixão de adolescência. É o segundo casamento. No primeiro, casado com a mãe dos meus filhos. Uma jornalista, mas, entre outras coisas, o desgaste por excesso de trabalho. Mas, ao mesmo tempo, pela origem do meu trabalho, de poder ir a um estádio, a um treino, por gravar o PES, os meus filhos me acompanham muito, meus enteados – eu odeio o termo –, os meus “enteamados”, meus filhotes também vêm junto. São quatro homens e mais uma caçulinha, menininha maravilhosa, então eu consigo agregar. Mas é difícil. Os enteados têm um pai maravilhoso deles, mas eu tento botar todo mundo no colo, tento fazer participar o máximo possível. O meu hobby é minha família. É o único jeito pra aguentar esse tipo de dia a dia. O meu dia a dia... tem muita gente que trabalha mais do que eu, mas em tantas coisas ao mesmo tempo...
UOL Esporte: Quando você encontra tempo para dormir?
Mauro Beting: Tem jogo tão chato no Brasil que, às vezes, eu durmo comentando. Não, é sacanagem. Mas uma vez eu tive que dormir no intervalo lá na Bandeirantes, no Jornal da Band, peguei a cadeira do Boechat e a cadeira do meu pai na época, deitei no intervalo, porque o meu diretor falou: “Cara, você está dormindo?”. Falei: “Eu tenho certeza”. Dormi no intervalo e, graças a Deus, eu durmo que nem médico. Dez, doze minutos e eu já acordo. Teve dia na semana passada em que eu dormi seis vezes durante o dia. Tinha dormido tipo quatro horas, eu fui dormindo antes de entrar no ar na TV, antes de entrar no ar na Jovem Pan. Eu fui aos poucos dividindo. Mas, em média, dá umas seis horas.
UOL Esporte: Você consegue desligar depois de tudo isso? Você chegando em casa, está acelerado, consegue deitar na cama e apagar?
Mauro Beting: Sim. Eu já consigo. E consigo ainda mais porque a minha mulher, a Silvana, faz assim: ela dá três toques na minha testa, eu capoto, ela me abraça, me beija e eu morro. É maravilhoso. Eu tenho um sono mais pesado do que o meu peso hoje.
UOL Esporte: E os seus "cinco minutos mensais de folga"? O que você gosta de fazer nesses seus cinco minutos?
Mauro Beting: [Risos] Mais ou menos. Dá uns dois dias de folga por mês. [Gosto de] Assistir futebol. Tirando futebol, até porque, quando eu não quero falar de futebol, os amigos vêm falar, os filhos, todo mundo vem falar. O porteiro, a porta vem falar, todo mundo vem falar. Música. A minha vantagem é a seguinte: eu escrevo ouvindo música. Então livros, blog no UOL, coluna na Playboy, eu escrevo ouvindo música. E, às vezes, randômica ou trilhas sonoras. Aliás, eu amo trilhas sonoras. Eu tive um programa com o Kid Vinil na Brasil 2000. Um dos meus livros é sobre o Ira!, sobre o Nazi. Sou apaixonado por rock, blues, música italiana, ópera, opereta. Eu gosto de muitas coisas musicais. Não estou citando, por exemplo, sertanejo, outras coisas musicais. Então eu gosto muito de música. Eu consigo ouvir. E cinema. Não vou dizer que eu seja cineasta ou documentarista. Eu faço documentário, é diferente. Mas eu gosto muito de cinema. Então, dentro do possível, eu escuto música e vejo filme.
UOL Esporte: Desculpa, você não tem duas horas pra ficar dentro do cinema?
Mauro Beting: Cara, é duro desligar o celular, botar no modo avião, no modo desligado, porque às vezes não dá. Até porque agora – não com a pretensão de cineasta – você começa a pensar como o cara fez a abertura, o enquadramento, a textura, a maneira como ele contou. Eu começo um processo que eu já tinha ao ler grandes autores – jornalistas ou escritores. “Puxa, como ele construiu legal esse parágrafo. Como é que ele encadeou o pensamento?”. Agora eu tenho essa pretensão de, no cinema, tentar achar algumas linguagens que, evidentemente, quem tem são os meus parceiros da produtora Canal Azul, que faz os documentários comigo. Mas também ter essa noção de... sempre gostei muito de cinema sem entender... buscar alguma coisa dessa linguagem, então eu já estou ficando meio maluco. Eu não consigo... isso eu aprendi com o meu pai, das poucas coisas. Ele não conseguia ler um livro só por ler. Ele lia estudando. Lia aprendendo. E cinema, pra mim, tem sido a mesma coisa. Documentário, nem se diga. Mas mesmo em ficção eu digo “nossa, que sacada!”, “que enquadramento!”, “que textura!”, “que edição de som!”. Mesmo com conhecimento baixo sobre isso, eu fico tentando pensar algo pra projetar pra algum trabalho meu.
UOL Esporte: Eu queria saber se você tem vontade de fazer mais alguma coisa. E o que você gostaria de não fazer?
Mauro Beting: Eu gostaria de trabalhar menos no dia a dia e continuar mais no resgate histórico. Mais documentário, mais livro, trabalhar mais com museu, trabalhar mais com exposição, resgatar objetos, memorabilia e, principalmente, histórias. Eu tive várias parcerias com outros museus, com o próprio Museu do Futebol, de trazer o ex-atleta pra dentro de campo. Eu queria fazer até um trabalho mais social com o ex-atleta. E aproveitar – é até um dos projetos que a gente está encaminhando com algumas empresas – pra tentar agregar mais o trabalho de base, de várzea e de crianças com futebol, com grandes marcas, com grandes empresas, com grandes ídolos. Trabalhar mais os ídolos no sentido de contar a história deles, de contar a superação. Não só o cara levantando o caneco, mas como é que ele chegou pra levantar o caneco, como ele vestiu a primeira camisa, chuteira, se é que ele vestiu, se é que ele usou, se é que tinha no “muquifo” onde ele jogava. Então contar esse tipo de história. E até um lado que era desenvolver uns personagens infantis que eu tinha com os meus filhos. Histórias que eu contava para os meus filhos pra fazê-los dormir. É uma piração que eu quero um dia fazer isso ainda. Arte e mais coisa com humor.
UOL Esporte: Às vezes, te cansa falar de futebol? Você já pensou “não quero mais saber de futebol, vou fazer outra coisa e vai ser única e exclusivamente um hobby”? Isso nunca passou pela sua cabeça?
Mauro Beting: Nunca. E uma pena que, com os meus amigos, como quaisquer amigos e amigas também, a gente fala muito de futebol. Eu me sinto em dívida com eles. Às vezes, a gente está num grupo de Whatsapp, brincando... eu queria falar mais de futebol, mas não dá. E agora, infelizmente... confio plenamente nos meus amigos, mas até por conta de alguns vazamentos que aconteceram com amigos meus de desabafos de Whatsapp pra grande mídia, de gente que trabalha com futebol, direta ou indiretamente, eu não falo mais nada. Mas, assim, é difícil... eu, quando estou num grupo, tento ficar – não é sexismo, mas é uma fato – mais com as amigas da minha mulher, parentes e tal, falando de outras coisas pra não ficar 298 horas falando de futebol. Mas, se eu ficar 299, não tem problema nenhum.
UOL Esporte: Eu queria saber: você se sente famoso? Você acha que você é famoso?
Mauro Beting: É horrível no país do BBB você ficar com esse sentimento, né? É um problema social gravíssimo. O que fazer com tantos ex-BBBs que estão aí pululando pela sociedade brasileira? Vendo o que foi a votação do impeachment na Câmara, você vê como são horrorosos os 10 segundos, 30 segundos pra dar um voto, pra falar, pra mandar um beijo, pra pedir a paz em Jerusalém, voltar correndo ao microfone pra mandar um beijo pro filho ou aniversário da neta. Então eu temo isso, mas, ao mesmo tempo, sendo filho de um cara muito famoso, e o que é mais gostoso: respeitado e querido, como era o meu pai, eu meio que fui me acostumando com essa coisa da fama. Não o artista, mas essa coisa de ser reconhecido.
UOL Esporte: Você deve ser reconhecido na rua.
Mauro Beting: Sim! O pessoal vem, te abraça, beija, te xinga, te cospe, te manda... a coisa mais violenta que eu recebi foi em Santo André, em 92. Foi uma “mexericada” na testa da própria torcida do Palmeiras. Por ser assumidamente palmeirense, eles querem que eu seja um porta-voz da torcida e um “porta-berro” da arquibancada, e eu não posso ser. E eu sinto mais essa cobrança. E essa coisa da rua pra mim... “ah, olha o Mauro Beting!”. É como se fosse assim: “olha o Cunha!”, “olha o Tio Patinhas!”, que é mais ou menos a mesma coisa. Dá na mesma. Então você ser reconhecido... “olha a Katiliane, do BBB 13.5!”. Pra mim, não muda, até porque eu me acostumei com o meu pai. E tento, dentro do possível, ser o mais humilde e modesto dentro do que não é humilde e não é modesto no jornalismo esportivo. Porque a gente, às vezes, se acha mais do que o Messi, a bola e o Pelé juntos. Então tento baixar essa bola. Acho gostoso o carinho. A torcida do Palmeiras me vê como uma espécie de um ídolo, até pelas carências. As pessoas pegam mais autógrafos meus. Já aconteceu – não vou falar com que jogador eu estava – do pessoal me reconhecer mais do que o jogador que tinha acabado de jogar.
UOL Esporte: Você lembra por que te jogaram uma mexerica? Se der pra contar, por que o cara estava tão indignado com você?
Mauro Beting: Na verdade, era comigo e com o pessoal que fazia o Mesa Redonda comigo na TV Gazeta, em 92. Era uma daquelas fases horrorosas do Palmeiras, no início da Parmalat, e eu estava cornetando, criticando muito...
UOL Esporte: Pré-fim do jejum?
Mauro Beting: Pré-fim do jejum. Exatamente. Praticamente onze meses antes. Era final de julho, começo de agosto de 92. Um jogo em Santo André, e eu estava criticando muito o Palmeiras, como todo mundo, mas apareci eu lá e os caras me mandando, me xingando, xingando também o Chico Lang. Era o Avallone que apresentava o programa, nosso colega aqui do UOL. E aí eu só vi a mexerica vindo. Ainda bem que abriu a mexerica, a mexerica estava meio aberta, então eu vi os gomos saindo, o negócio deu pra afastar e ela bateu ali no teto. Mas teve outra vez que foi divertidíssima. Estava um torcedor me abraçando no Palestra Itália antigo, tremia e berrava: “Mauro Beting, eu te amo!”. Ele falou umas dez vezes isso, pedindo pra tirar foto. “Mauro Beting, eu te amo!”. Aí passou um cara e falou: “E eu te odeio, seu corintiano enrustido filho da puta!”. Assim. Era exatamente isso. Tem um cara que me ama, que tremia de me ver, e o cara que me odeia e me acha um corintiano enrustido. E essa é a magia, a graça do futebol e, claro, do nosso trabalho.
UOL Esporte: Bem, pelas homenagens que você já fez ao Corinthinas ao São Paulo e ao Santos, deve ter palmeirense com raiva de você..
Mauro Beting: Muitos. Chegando aqui, um cara dizendo que meu pai está virando no túmulo. “Onde já se viu? Isso é uma vergonha pra família Beting! Elogiar ou enaltecer o Corinthians”. Tem um texto no dia do centenário do Corinthians, na Gaviões da Fiel, tinha o meu texto na entrada. Eu tenho praticamente o mesmo número de textos em livros do Corinthians do que em livros do Palmeiras. Tem um texto do Grêmio, dos 110 anos, que eles querem colocar na Arena do Grêmio. Tenho livros do Atlético Mineiro, do Flamengo. Estou escrevendo um do Zico. Neymar. O meu lado é exatamente esse. Quando eu falo do Flamengo, do Corinthians, do 31 de Abril de Presidente Timóteo, eu tento ser um torcedor do Dom Pernil Santa Coloma ou do Coronel Bolognesi. Eu me sinto como um torcedor. E do Palmeiras um pouquinho mais. Acho que eu crio essa identificação quando eu falo. “Olha o que o palmeirense falou do Corinthians”. “Olha o que o palmeirense falou do São Paulo, do Cruzeiro, do Grêmio”. E isso é muito gostoso, porque as pessoas percebem isso e me cobram: “É palmeirense, mas eu gosto dele”. E se me detesta, ó... “Detesto mesmo o palmeirense ou detesto o Mauro, ainda mais porque é porco”. E acho que está valendo. Faz parte do jogo.
UOL Esporte: Como comentarista, você consegue se conter, principalmente quando está jogando o Palmeiras?
Mauro Beting: Eu não me contenho porque, na dúvida, eu vou contra o Palmeiras. Se o Gabriel Jesus entra na área e o zagueiro do Corinthians puxa uma peixeira e arranca a cabeça dele, eu digo que, de repente, não foi o uso da força excessiva. Eu talvez marque o pênalti, mas não expulso o jogador. Ou, de repente, eu não sei se são os meus sete graus de miopia, se é meu cotovelo em dor ou se é o meu fígado. Então, na dúvida, eu vou contra o Palmeiras, assumidamente. Ou seja, eu sou mais cobrado pelo torcedor do Palmeiras do que por qualquer outro torcedor, porque eu tento ser o máximo isento, independente, imparcial e objetivo possível num meio passional, num meio que não é isento, que não é independente e que é apaixonado. E acho que eu tenho que ser torcedor porque só entende essa maluquice que é o futebol quem é torcedor. Se eu deixar de ser palmeirense... primeiro, acho que ninguém pode deixar de ser de time algum. Se o jornalista deixa de torcer pra um time, deixa esse jornalista de lado. E se ele inventa de torcer pro Dom Pernil Santa Coloma, ele está mentindo. Ele só está no futebol porque ele gosta de futebol e tem que assumir um time. E pode gostar de qualquer time. Eu respeito quem não abre o jogo. Repórter que está no gramado, narrador... exatamente hoje, dois anos da morte do Luciano do Valle, eu recebi várias manifestações assim: “Olha, o Luciano narra o gol do Corinthians com 16 segundos; o do Palmeiras ele narra com 15”. O cara conta mesmo! Não é nem a “minutagem”, é a “segundagem” de um gol de narrador. Então eu respeito quem não fala. Agora, não gosto do cara que ou deixa de torcer ou, pior, inventa um time e torce por outro.
UOL Esporte: Todos nós, um dia ou outro, falamos uma bobagem, escrevemos uma besteira. Queria saber se você já escreveu ou falou alguma coisa do Palmeiras que você tenha ficado muito arrependido?
Mauro Beting: Olha, do Palmeiras, não. Eu já tive problemas, fui processado pelo ex-presidente Mustafá Contursi. Ele até não era mais presidente. Não fui o primeiro a dar a notícia, foi a repórter Regiani Ritter, minha colega de Rádio Gazeta, mas fui quem melhor deu a notícia, mais profundamente explicou o que seria a Parmalat, e diziam que eu era vendido para a Parmalat, que eu não sabia de nada e tal. Quando falavam “ão, ão, ão, a Parmalat é ilusão”, eu falava “não, vai dar certo”. Então esse meu, digamos, acerto, essa informação mais privilegiada que eu tive da Parmalat foi uma grande felicidade. Em relação ao Palmeiras, não tem uma grande bobagem, tipo a que eu no início da temporada 2015/2016 na Inglaterra. Fox Sports, Leicester x Southampton. 4 a 2 para o Leicester. Antes de a bola rolar, eu falei: “Olha, o Leicester fez de tudo para ser rebaixado. Nos últimos nove jogos da temporada passada, ganhou sete e permaneceu na primeira divisão. Na minha opinião, agora tem tudo mesmo para ser rebaixado, porque contratou o italiano Claudio Ranieri, o pior entre os melhores treinadores. Um cara que acabou de afundar a seleção da Grécia, que perdeu para as Ilhas Faroe em Atenas, não vai salvar um time que não tem grandes jogadores. É um elenco limitado, que não vai fazer grande campanha e que, como eu acho e toda imprensa inglesa acha, vai lutar só para não ser rebaixado”. O Leicester vai ser campeão agora. Assim, qual é a moral que eu tenho pra falar qualquer coisa do Palmeiras ou qualquer outro clube se eu cornetei não só o Leicester, mas principalmente o Ranieri? E essa que é a graça do futebol.
UOL Esporte: Além do seu time, o Palmeiras, mesmo quando a gente fala alguma coisa exagerada quando é do nosso time do coração...
Mauro Beting: A gente é corneta! Se o seu filho está enfiando o dedo na tomada, você arranca ele e dá um tapa na orelha. Se é o filho do outro, você espera pra ver se queima mesmo.
UOL Esporte: De time rival, de Corinthians, São Paulo e Santos, você já falou alguma coisa que a torcida tenha ficado p*** da vida? E depois de algum tempo você tenha chegado a conclusão: “por que que eu falei isso?”
Mauro Beting: Teve em 2014, antes da Copa do Mundo. O Brasil venceu a Sérvia por 1 a 0 no Morumbi, um amistoso pré-Copa do Mundo. Aí o Fred estava caído e fez o gol. Aí eu me expressei muito mal no programa do Falcão à noite no Fox Sports, lá no Rio de Janeiro, dizendo que... o que eu queria dizer é que o Fred, sentado, estava fazendo mais gols que qualquer outro centroavante brasileiro. De fato, ele estava fazendo. Porque eu peguei, citei o gol na final da Copa das Confederações de 2013, contra a Espanha, aquele gol que ele estava meio caído e fez o gol. Mas, do jeito que eu falei, falei errado, falei mal mesmo. Falei que, sentado, o Fred estava jogando mais que o Luís Fabiano em pé. Até um dos sites que propaga textos legais... eu fiz uma série de textos pro Rogério Ceni, muito legais... um que eu fiz aqui pro UOL, quando completou cinco anos do centésimo gol, que foi num domingo de Páscoa... foi uma mensagem lindíssima do Rogério, que mandou uma mensagem lindíssima pra mim, muito bacana de receber o carinho do pessoal. E era essa a intenção, levantar a bola de um mito como o Rogério. Eu lembro que a torcida do São Paulo entrou rasgando – e com razão. E eu tive que fazer logo em seguida, na Fox mesmo e no blog que eu tinha em outro veículo, falei: “Gente, me desculpa. Luís Fabiano, me expressei muito mal. Não quero dizer que o Fred, sentado, joga mais que você”. Aí eu expliquei o que queria falar e, mesmo assim, não era uma boa explicação. E foi lamentável.
E coisas que eu fiz pro Palmeiras – aí sem cabotinismo –, mas é fato que nenhum outro cara fez. Eu fiz cinco preleções para os jogadores. Eu fiz, dos 14 livros, sete do Palmeiras, inclusive o livro oficial. Eu fui embaixador oficial do centenário, junto com Dudu, Ademir da Guia, Marcos e Evair. Eu apresentei quatro banquetes. Eu fui apresentador da festa popular, ali na Praça da Sé, do centenário. Estou fazendo a curadoria da Cantina Palestra, que vai ser lançada. Um monte de coisas. E ainda a torcida do Palmeiras diz: “Ah, você ganha dinheiro em cima do clube”. Primeiro, eu não cobro, porque acho que jornalista não pode cobrar de quem ele cobre jornalisticamente. E eu não posso cobrar uma paixão que não tem preço, que é o Palmeiras. E não só não cobro o Palmeiras, e cobro um terço do preço quando, por exemplo, vou apresentar a camisa nova da Adidas, vou apresentar o novo nome do estádio Allianz Parque, eu cobro muito menos, porque são parceiros do Palmeiras que pagam. E não só não cobro, como ainda dou dinheiro pro Palmeiras. Os royalties dos meus filmes e livros vão todos pro Palmeiras. Você pega um livro que vendeu mais de 100 mil cópias – não sei exatamente quanto –, como o do São Marcos... a grana que o Palmeiras vai ganhar com isso. O próprio livro oficial... tudo isso, royalties que eu pago e com enorme prazer. Claro que eu ganho dinheiro com o Palmeiras, mas eu dou dinheiro ao Palmeiras. O Palmeiras não perde dinheiro. E ainda me enchem o saco. E fora vários trabalhos que eu não cobro.
UOL Esporte: Eu queria saber como você vê as redes sociais, se você acha que você abusa, se já tomou alguma resposta atravessada, se você, às vezes, é bem palmeirense...
Mauro Beting: No Facebook, eu sou completamente. Eu sou mídia palestrina no Facebook. Aí é assim, aí é o meu mesmo. Instagram, Facebook, inclusive na fanpage do Facebook, eu sou Palmeiras. Alguns textos que eu não posso colocar em blog, coluna de jornal ou falar em rádio e TV. Na campanha toda da Copa do Brasil, eu cheguei a fazer quase três textos emocionais. Um deles foi usado para os jogadores e todos, pra torcida. “Vamos lá, dá pra ganhar do Fluminense”. “Vamos lá, dá pra ganhar do Santos”. E deu. Aí depois eu fiz um vídeo um com apaixonado pelo Palmeiras de Ribeirão Preto, o Vitor Galvão, que era usando Nessun Dorma e ficou um vídeo super viral. Mais de 300 mil visualizações, um negócio absurdo. E que foi, inclusive, por um amigo nosso que tá fazendo o meu novo filme do Palmeiras, o Paulinho Corcione. A gente botou no Allianz Parque depois, quando o Palmeiras deu a volta olímpica, Nessun Dorma, que é um ato de Turandot, ópera do Puccini. A gente botou no estádio. Aliás, era a minha versão. Baixei no iTunes e mandei pra diretoria do Palmeiras: “Toca se der certo”. Assim, eu faço um monte de coisa absurda, mas esse é o lado pessoal. É o lado Mauro palmeirense assumido. O profissional também faz isso. Pego essas coisas de paixão e tento colocar. Nas redes sociais, é divertido porque, por exemplo, o meu Twitter oficial é fake. Ele foi criado por um amigo jornalista do Rio, por uma amiga jornalista de São Paulo e por um outro amigo meu, professor de História no interior de São Paulo. Meus amigos me sacanearam, ficavam tirando sarro de mim no meu perfil e me deram um dia a senha. Aí eu comecei a tuitar algumas coisas e virou um perfil meio que de sucesso, principalmente só bobagem.
UOL Esporte: Você assumiu seu Twitter "fake oficial"?
Mauro Beting: Continua sendo fake oficial. Eles até não fazem mais. Tem um outro amigo que me ajuda, mas, basicamente, sou eu. Mas continua sendo fake oficial. É uma pena que eu fui bloqueado pela Geisy Arruda, pelo Marco Feliciano e até pelo Valdivia. Eu lamento que eles me bloquearam, porque, diferentemente de vários queridos colegas, eu não pertenço às organizações block – não a que editava a Revista Manchete ou era dona da TV Manchete. Mas os colegas hoje que você fala “bom dia” e o cara já está bloqueando; eu, ao contrário. Aqueles malas básicos, que te trollam, são chatos mesmo, te xingam... eu não só não bloqueio, como passo a seguir. Eu persigo. E aí, o que acontece? Eles me bloqueiam. Eu nunca bloqueei nenhum. Acho que são 150 mil seguidores meus no Twitter e eu nunca bloqueei ninguém. Aliás, eu sou bloqueado por alguns que eu passo a seguir. Quando às vezes eles vão muito além, aí eu sacaneio mesmo, retuito o que eles falam. Aí eu deixo os meus fãs ou seguidores detonarem o cara. Normalmente quando falam alguma bobagem muito grande. Mas, assim, o que eu faço: normalmente não bloqueio ninguém, passo a seguir e é divertidíssimo, porque aí eu acabo sendo bloqueado por Marco Feliciano e pela Geisy Arruda também, o que é uma pena.
UOL Esporte: A gente sabe que tem sempre aqueles que levam muito a sério tudo que é falado em relação ao esporte.
Mauro Beting: Claro. E é fundamental que tenha os que levam muito a sério e os que não levam também.
UOL Esporte: Estamos acabando já. Sei que o Milton Neves é um grande amigo. Ele te elogiou pra burro na entrevista que a gente fez. Além do Milton Neves, você tem outros grandes amigos no jornalismo?
Mauro Beting: Ah, muitos! Amigos e fãs. Vou usar uma frase do Datena. Ele falou que eu sou uma das poucas unanimidades do jornalismo porque sou o único cara que ninguém fala mal. Eu sei que tem cara que fala mal.
UOL Esporte: Eu ia perguntar logo na sequência. Tem algum cara de quem você não goste?
Mauro Beting: Olha, eu sou muito da paz e acho que é muito legal. Se alguém me dá porrada, eu meio que... não é por orientação cristã, não... eu dou a outra face. Eu durmo feliz, cara. Mesmo os quatro caras que me processaram, o Nabi Abi Chedid... aliás, por conta de amizade, o Nabi só não me processou porque o advogado dele era meu amigo. O Eduardo José Farah, falecido. Mustafá Contursi. Todos esses caras que me processaram me cumprimentavam numa boa antes, durante e depois. Metia o pau, mas, tirando o saudoso Juvenal Juvêncio, com quem eu não tinha realmente um bom relacionamento, todos os caras com quem eu briguei, até o Eurico Miranda, quem quer que seja, Luiz Zveiter... segue o jogo. Não tem problema. Jogador é a mesma coisa, treinador e jornalista ainda menos. Aliás, em várias brigas na Justiça... um com outro, outro com um, eu que fazia o meio-campo. E meio-campo assim: “Cara, não pega tão pesado, ele está querendo uma conciliação”. Nunca deu certo, mas quase sempre eu conseguia falar com todas as partes, e é uma coisa que me deixa feliz. Não como jornalista, como pessoa, porque eu discordo de alguns mestres que eu amo de paixão no jornalismo que acham que a notícia está à frente das pessoas. Eu acho que não. Eu acho que primeiro está a pessoa; depois, está o jornalismo.
UOL Esporte: Para completar: seleção brasileira vai bem com o Dunga?
Mauro Beting: Então, desde 2002, depois da Copa da Ásia, eu queria o Tite. Depois de 2014, nem preciso dizer que [queria] ainda mais o Tite. Respeito muito o Dunga como pessoa, como um cara sério, como profissional, entendedor de futebol e também como treinador. Eu gostaria de ver o Tite. Mas vamos de Dunga. Até quando der. E não sei até quando vai dar.
UOL Esporte: O Palmeiras vai bem com o Cuca?
Mauro Beting: Muito bem. Esse é um cara que há muito tempo eu queria. Eu gostava já dele como jogador. Como treinador, a gente tem um ótimo relacionamento. Não é por isso. Se fosse assim, eu colocaria minha mãe, gostaria de ver minha mãe como treinadora. Mas eu acho que ele é o treinador ideal, com a maturidade ideal pra esse elenco do Palmeiras.
UOL Esporte: E por que você não se dava com o Juvenal?
Mauro Beting: Eu respeitava demais o conhecimento dele do São Paulo. Achava admirável. Ele era o Jânio Quadros do futebol, ou seja, falava um monte de pataquada, mas você parava pra ouvir. É questão de, sei lá, química. Ele nunca me tratou mal. Eu também não tratava mal, não descia a porrada. Eu não sei por quê. Eu respeitava tudo que ele fez no futebol. Discordava de muitas das coisas que ele fez no futebol, principalmente o momento do São Paulo se deve muito a tudo aquilo que ele fez de errado. E, principalmente, uma coisa que eu não tolero, seja Dualib, seja Mustafá, seja Juvenal, seja todo mundo, que é a continuidade, o continuísmo que infelicitou o São Paulo e o próprio Juvenal.
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