Briga na floresta e arruaça no exterior. São os hooligans da vez na Europa
O perfil dos grandes estádios europeus mudou nas últimas décadas, mas o espírito hooligan segue vivo dentro de arquibancadas como as do Feyenoord. O time holandês enfrenta o Manchester United nesta quinta-feira, em partida da Liga Europa considerada de alto risco. Mesmo na era de violência controlada dos torneios da Uefa, a torcida de Roterdã coleciona incidentes no século 21 e desponta como a mais problemática da atualidade, pelo menos no lado oeste do continente.
Nas últimas décadas, a Uefa conseguiu amenizar o comportamento de torcidas extremistas de países como Inglaterra e Itália, com medidas de elitização de estádios. Mas parte dos fãs do Feyenoord se esforçou contra essa "socialização" e preservou uma nostalgia dos anos 80, momento de ápice da violência no futebol do continente. Somente neste século, os hooligans de Roterdã provocaram a expulsão do time de um torneio, brigaram no exterior, destruíram cidades como visitantes e até marcaram pancadaria com rivais para o meio de uma floresta.
Cerca de 7 mil fãs do Feyenoord são esperados na Inglaterra nesta quinta-feira, quando a equipe enfrenta o Manchester United pela Liga Europa. No entanto, menos da metade viajará com ingressos para entrar no estádio Old Trafford (são 3.100 bilhetes disponíveis). O clube enviará seu próprio aparato de segurança para a partida, com stewards e agentes infiltrados, para evitar comportamentos inadequados de seus seguidores. Já os sócios-torcedores, que têm direito a entradas, precisarão usar braçadeiras vermelhas de identificação.
Mesmo assim, a apreensão está no ar, evidenciada no noticiário de véspera, tanto na imprensa inglesa quanto na holandesa. Entrevistado por um jornal local, o chefe de polícia de Roterdã, Frank Pauw, admitiu que não teve poder legal para evitar que fãs violentos do Feyenoord embarcassem para a Inglaterra. Em Manchester, as autoridades prepararam aparato de segurança de caráter extraordinário e revelaram evidências de que os visitantes tenham comprado cerca de 4.500 ingressos para assentos do time de casa.
A animosidade entre os torcedores violentos de Feyenoord e United remete à temporada 1997, quando holandeses e ingleses promoveram uma célebre pancadaria em Roterdã. Neste episódio, na Liga dos Campeões, hooligans destruíram cercas de separação dentro do estádio e brigaram fora dele – antes e depois da partida. Por fim, o ônibus do Manchester foi alvejado por pedras e rojões na saída da arena.
"A cidade de Roterdã tem três times profissionais, mas somente os torcedores do Feyenoord têm reputação ligada ao hooliganismo", comentou Ramon Spaaij, professor de Sociologia da Universidade de Amsterdã e da Universidade de Victoria, pesquisador do tema nos últimos 15 anos. "Existem algumas razões para isso, como a forte raiz de classe trabalhadora da torcida e o apelo a jovens em busca de excitação e aventura, potencialmente incluindo a violência. Isso devido à reputação violenta crescente dos torcedores e sua rivalidade profunda com a torcida do Ajax", acrescentou o acadêmico, em entrevista ao UOL.
Batalha medieval na floresta e destruição da história em Roma
Em novembro de 2006, o Feyenoord foi expulso da Copa da Uefa em razão do comportamento de sua torcida em uma partida contra o Nancy, na França. Na oportunidade, os hooligans holandeses arrancaram assentos para atingir policiais e destruíram barreiras de vidro na área interna do estádio.
A rivalidade com os torcedores do Nancy então ficou como um assunto pendente e foi alimentada pelos hooligans do Feyenoord durante anos. Na última semana, um chocante vídeo de embate de "acerto de contas" entre fãs dos dois times foi divulgado nas redes sociais. Uma década após o incidente da Copa da Uefa, os vândalos rivais marcaram uma pancadaria de características medievais bem no meio de uma floresta na Holanda. Reforçados por "ultras" do Strasbourg, os visitantes franceses levaram a melhor.
Os hooligans do Feyenoord também chocaram o continente em 2015, quando vandalizaram uma região do centro histórico de Roma, antes de uma partida da Liga Europa. Os holandeses destruíram a Fontana della Barcaccia, uma fonte de 400 anos, e depois enfrentaram a polícia local – 33 torcedores acabaram presos. Após o incidente, o clube limitou o acesso da torcida a ingressos para compromissos fora do país.
Já no jogo de volta contra a Roma, em Roterdã, a torcida do Feyenoord se envolveu em mais uma polêmica. Na oportunidade, a arbitragem paralisou a partida duas vezes, depois que bananas infláveis foram arremessadas para dentro de campo. A suposição era de que o objeto servisse como uma ofensa racista ao atacante marfinense Gervinho, mas os fãs alegaram que a imagem da fruta representa uma antiga tradição na arquibancada do time.
"O hooliganismo ainda existe na Europa, mas mudou nos últimos anos. Não vemos mais incidentes em grande escala nos estádios, em razão das políticas de controle nos países europeus. Mas os incidentes isolados ainda existem, refletindo a sobrevivência de uma subcultura hooligan", afirmou o acadêmico holandês Ramon Spaaij. "Essas brigas envolvem menos pessoas do que os incidentes do passado, mas acontecem longe do olhar das autoridades e, portanto, geralmente não leva a prisões", concluiu.
Os mais durões da Holanda também se emocionam
Geralmente os holandeses estão entre os torcedores mais queridos em Copas do Mundo e Eurocopas, com animação e simpatia, espalhando a cor laranja. Mas, em nível de clubes, torcidas como a do Feyenoord às vezes comprometem essa reputação com episódios marcantes. Neste ano, por exemplo, durante uma briga dentro do estádio com fãs do Willem II, um seguidor de Roterdã foi arremessado arquibancada abaixo. Essa foi mais uma cena do impressionante repertório de confusões dos hooligans do time.
Especialistas dizem que o “marco zero” do hooliganismo holandês se deu em 1974, quando a torcida do Feyenoord foi brutalmente atacada por fãs do Tottenham Hotspur, em um confronto internacional. Dez anos depois os times se reencontraram em um torneio Uefa, e desta vez os violentos de Roterdã estavam mais preparados, fazendo os rivais pagarem pelo incidente anterior.
No entanto, a temível arquibancada do Feyenoord também é capaz de gestos bonitos, como o registrado no último final de semana. No caso em questão, 30 mil torcedores do time de Roterdã acenderam luminosos na entrada da equipe em campo, em homenagem ao jogador Tonny Vilhena, que perdeu a mãe, morta após uma longa batalha com uma doença. Para agradar ou incomodar, os fanáticos holandeses certamente serão ouvidos na partida desta quinta em Manchester.
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