Muito longe do glamour: Irmão de Deyverson é goleiro da 3ª divisão do Rio
A mesma família; duas realidades diferentes. Enquanto Deyverson aguarda ansiosamente a oportunidade de estrear com a camisa do Palmeiras – atuará no domingo, contra o Sport, segundo o técnico Cuca -, o irmão Anderson Brum vive uma realidade totalmente oposta no futebol. O glamour de um time grande fica para o caçula, enquanto o mais velho enfrenta os conhecidos problemas estruturais dos pequenos clubes nacionais.
Se Deyverson é atacante e chega como o “9” ideal procurado por Cuca, Anderson é goleiro. Jogador do Angra dos Reis, clube da terceira divisão do futebol do Rio de Janeiro, o irmão mais velho do novo contratado palmeirense encara as dificuldades comuns aos clubes de menor expressão: promessas não realizadas e dificuldades nas questões financeiras.
“Estamos desde o início o campeonato com salários atrasados, porque a prefeitura de Angra e os órgãos públicos aqui e empresários falaram, prometeram que dariam apoio, mas não recebemos nenhum. Estamos aqui à mercê, mas acreditando no projeto ainda”, afirmou o goleiro de 31 anos, em entrevista exclusiva concedida ao UOL Esporte.
A reportagem procurou o Angra dos Reis para comentar a questão dos salários atrasados. Em conversa no último sábado, o diretor de futebol Roberto Gilvaz admitiu este problema, mas destacou o esforço do clube para cumprir o combinado com os atletas.
“Tem alguma coisa para acertar. Está sendo pago, e somos um dos únicos da Série B-2 que paga. Os atletas comem, dormem em alojamento com ar-condicionado, têm internet, estrutura de viagem também. Pequeno atraso que podemos ter hoje é pelas dificuldades que temos”, disse Roberto Gilvaz.
“O clube não tem trato com empresários, a prefeitura não pode dar dinheiro, só pode indicar parceiros para nos ajudar. A nossa luta é muito grande, somos um dos únicos o talvez o único que paga salários. Dizem que somos o ‘time grande da B-2’”, acrescentou o dirigente.
Primeiro colocado na classificação geral da Série B-2, o Angra dos Reis, clube que ganhou projeção nacional por episódios peculiares (torcedor solitário e o motorista perdido), acabou derrotado na semifinal do primeiro turno para o Araruama, que terminou com o vice-campeonato desta primeira metade da divisão de acesso no Rio de Janeiro.
Os salários atrasados e as dificuldades estruturais se tornaram comuns na carreira de Anderson Brum. No entanto, o irmão mais velho de Deyverson já vivenciou uma realidade distinta, de Série A. Entre 2004 e 2005, defendeu o Figueirense e dividiu o dia a dia com jogadores e profissionais extremamente ligados ao Palmeiras – tanto na história quanto na atualidade.
“Cheguei nos juniores e pude fazer parte do elenco, que era bem forte. Tínhamos jogadores renomados como Edmundo, o César Prates, o Clebão, o Sergio Manoel e o Michel Bastos, hoje no Palmeiras. O Oscar Rodríguez, hoje treinador de goleiros do Palmeiras, foi meu treinador lá no Figueirense”, conta, nostálgico.
A carreira, desde a passagem por Santa Catarina, se transformou, especialmente depois de um grave problema físico. Quando defendia o Teresópolis, Anderson Brum lesionou o joelho e dependeu de um favor de um amigo do pai, Carlos, para operar e retornar aos gramados.
“Foi meu pai quem conversou com este cara que trabalhei e disse: ‘meu filho é jogador, mas não pode jogar por lesão’. O cara, por obra de Deus mesmo, falou que tinha um médico ortopedista que devia um favor para ele de amigo, e que este favor seria retribuído para me ajudar”, relembra Anderson Brum, que “se virou” no tempo em que ficou parado.
“Tinha certeza que voltaria para um time de expressão, mas aí tive a lesão e comecei a trabalhar vendendo salgado com a minha esposa; vendíamos churros também. Meu irmão fez parte deste processo difícil e doloroso, porque me sentia injustiçado. Não pela lesão, mas pelo que o clube fez comigo. Pagaram-me até o fim do contrato, mas não deram assistência para a minha recuperação”, acrescentou.
De freguês a orgulho do mais velho
A relação futebolística entre Deyverson e Anderson veio desde cedo. Ainda crianças, brincavam no Rio de Janeiro. A posição adotada pelo mais velho, o gol, encantava até o atacante, que chegou ao Palmeiras agora para preencher a lacuna ofensiva esperada por Cuca – Borja vive fase irregular, e Willian, artilheiro palmeirense no ano com 13 gols, sofreu uma lesão muscular e ficará afastado por até seis semanas.
“Quando chegavam as minhas férias, ia para o campo com meu primo Rodolfo, e o Deyverson sempre ficava pedindo para jogar. A gente ficava brincando de acertar o travessão, e o Deyverson demonstrou habilidade para bater na bola logo ali. Eu sou goleiro hoje, mas ele gostava das duas posições; gostava de jogar no gol também”, recordou, que, a cada período livre, ouvia boas histórias do irmão.
“Cada vez que voltava de férias, falavam da evolução do Deyverson. Até tinha um procurador na época, mas perdi o contato e não consegui ajuda-lo. Aí meu pai tratou de tomar a frente, apoiar e dedicar a própria vida ao meu irmão, pela gente”, contou à reportagem Anderson Brum, que levava a melhor pela diferença de idade (cinco anos).
“Deyverson era meu freguês quando íamos para o campo; tanto meu quanto do meu primo. Hoje é difícil segurar o menino, me orgulho muito de ser o irmão dele. As pessoas do bairro falavam que ele tinha orgulho de dizer que era meu irmão, assim como hoje também tenho muito orgulho de dizer que sou irmão do Deyverson”, diz de maneira carinhosa, prestes a ver o irmão estrear por um grande clube do futebol brasileiro.
Trabalho com Anderson ajudou a trazer Deyverson "de volta"
Conforme dito pelo próprio atacante palmeirense na apresentação e pelo pai, Carlos, em reportagem publicada pelo UOL Esporte, Deyverson por pouco não abandonou a carreira. O hoje badalado atacante do Palmeiras só reencontrou o caminho da bola após enfrentar a realidade longe dos gramados com o irmão, afastado do futebol na época pela lesão no joelho.
“Deyverson disse que largaria o futebol e ia seguir outro rumo. Minha mãe veio conversar comigo e dizer que meu pai estava irritado, quase dando uns tapas nele. Nossa família deixava de comprar coisas para si para o Deyverson treinar lá no Tigres do Brasil, que era distante de casa. Meu pai dizia: ‘me deixa, seu irmão é fogo’. Ele precisava desabafar, e eu tinha que fazer a ponte da amizade”, relatou Anderson Brum.
“Era com ele [Deyverson]. Mas, aí, o Deyverson começou a trabalhar e viu que era difícil. Ele chegou a trabalhar para mim, mas fazia tudo errado [risos]. O Deyverson dava o troco antes de a pessoa pagar!”, recorda-se o goleiro e irmão mais velho.
Anderson também agradece por Deyverson abdicar de outra decisão no meio do caminho: ser cantor de pagode. O atacante palmeirense, fã do gênero e de artistas como Belo, até cantou na apresentação na Academia de Futebol, em cena “reprovada” pelo irmão mais velho.
“Deyverson montou um grupo de pagode e falou que viraria cantor; meu pai cedeu espaço na associação para eles ensaiarem. Fui em alguns ensaios, tocavam pagode; alguns lugares de mais estrutura chamavam para eles tocavam. Mas eles eram desafinados, como você pôde ver na apresentação”, brincou.
“Não dava para ele ser cantor, muito fora do tom, desafinado, não dá (risos). Graças a Deus, o Deyverson hoje é um jogador respeitado na Europa e tenho certeza que conquistará o respeito aqui no Brasil”, encerrou o irmão sob a expectativa de no domingo, a partir das 16h, assistir ao primeiro jogo do irmão pelo Palmeiras.
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