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Nazismo, fome: as desconhecidas histórias do árbitro de Brasil x Itália-82

Reprodução do livro com foto de Klein (à esquerda) com Pelé, em 1994 - Reprodução
Reprodução do livro com foto de Klein (à esquerda) com Pelé, em 1994 Imagem: Reprodução

Dani Blaschkauer

Do UOL, em São Paulo

30/09/2017 04h01

Abraham Klein tem uma relação com o futebol brasileiro bem próxima. Amigo de Pelé, já apitou sete jogos da seleção, sendo dois em Copas do Mundo: a vitória sobre a Inglaterra, em 1970, e a derrota para a Itália, em 1982.

Mas o que pouco sabe sobre o ex-árbitro israelense é que para chegar a um campo de futebol, ele teve que fugir e se esconder dos nazistas. E que só virou juiz graças ao Exército israelense.

Judeu romeno, ele viveu escondido junto com a mãe e seis tias durante a Segunda Guerra Mundial. O pai havia ido antes para a então Palestina, em 1937, para tentar encontrar um lugar melhor para a família.

Com o avanço das tropas nazistas para o leste europeu, Klein sobreviveu em sua cidade natal, Timisoara (fica no oeste romeno, perto da Hungria e da Sérvia).

No período pós-guerra, em 1947, e já com 13 anos, ele e outras 500 crianças foram levados de trem para a Holanda para um projeto patrocinado pelo governo local e também pela organização judaica The Joint para dar suporte às famílias sobreviventes da guerra.
“Toda a família do meu pai foi morta. Ele escapou porque foi para a Palestina em 1937”, conta Klein.

A viagem de trem para a Holanda, porém, não foi das mais tranquilas. Pouca comida e sem os pais, as crianças tiveram que aprender a dividir o que havia. Fosse de roupa ou de comida por três dias.

“Quando chegamos na Holanda e nos serviram a comida, todos atacaram os pães. Daí disseram: ‘calma, tem muito mais que pão’”.

Depois de um ano na Holanda, ele se reencontrou com a mãe e partiu para o agora já criado Estado de Israel. Lá, pôde morar novamente com seu pai.

Aos 18, porém, se alistou no Exército. E foi quando novamente sua vida o levou para algo inesperado: o futebol.

Fez o serviço militar por três anos. Em meio a fortes treinamentos,  guerras e conflitos, ele conheceu um alfaite por acaso. “Meus pais pediram para ir buscar umas calças com ele”.

O alfaite Jonas era árbitro e contou um pouco do que era o trabalho ao rapaz. Vendo que Klein estava interessado, levou o jovem para um jogo. Jonas acabou se machucando e pediu para Klein ser seu substituto.

“Disse a ele que não sabia as regras. Ele respondeu perguntando se eu já havia jogado. Afirmei que sim e ele disse: ‘As regras são muito simples. Alguém faz falta, você apita. É o que você precisa saber agora.”

E daí foi um pulo para virar árbitro nos jogos do Exército até entrar na federação israelense, em 1958, aos 24 anos.

Em 1965 estreou com o árbitro internacional e cinco anos depois chegou para a sua primeira Copa.

Estava em franca ascensão quando sofreu o primeiro baque profissional. Ficou fora da Copa de 1974. Por segurança, a Fifa vetou o seu nome alegando segurança. A entidade tinha medo que houvesse um novo atentado no Mundial, como aconteceu nos Jogos Olímpicos de Munique, em 1972.

“Me senti mal quando não fui convidado em 1974. Como sabe, eu apitei seis jogos, incluindo a final do Mundialito de 72 entre Brasil e Portugal. Depois do jogo, o presidente (da Fifa) e o comitê de arbitragem me prometeram que eu seria convidado para o Mundial de 1974”, disse.

Klein, porém, não desanimou e teve nova chance em 1978 e também em 1982. Nesse tempo, se aproximou de astros do futebol como Charlton e Pelé. “Quando vi os dois juntos, em 1970, foi como um sonho”, conta.

“Hoje não tenho um time preferido, mas sempre gostei do futebol brasileiro, principalmente da seleção de 1970”, afirma. “Pelé virou meu amigo. Escreveu o prefácio do meu livro (O árbitro dos árbitros, de 1994). Ele é o melhor do mundo, está ao lado de astros como Michael Jordan e Roger Federer.”