Topo

House of Vasco: alianças, traições e o enredo de filme da eleição do clube

Alexandre Campello durante eleição presidencial do Vasco - Paulo Fernandes/Vasco - Paulo Fernandes/Vasco
Imagem: Paulo Fernandes/Vasco

Bruno Braz

Do UOL, no Rio de Janeiro

20/01/2018 07h03

Série norte-americana de sucesso, House of Cards conta a história de um político ambicioso que, tramando conspirações e alianças, chega ao poder dos Estados Unidos. Ao analisar todo o enredo da eleição do Vasco, que resultou surpreendentemente em Alexandre Campello como o presidente do clube no próximo triênio, faz-se uma analogia quase perfeita com a trama televisiva.

Traições, articulações e junções se arrastaram pelos corredores de São Januário desde o início de 2016. A consequência foi um desfecho inédito na centenária história cruzmaltina: nunca um vencedor no pleito entre os sócios havia sido derrotado na votação do Conselho Deliberativo.

Para entender todo este tabuleiro político, o UOL Esporte contará por partes esta história:

Ato 1: A trupe de Eurico 

Fernando Horta (esq), José Luiz Moreira (centro) e Luis Fernandes (dir) - Bruno Braz / UOL Esporte - Bruno Braz / UOL Esporte
Fernando Horta (esq), José Luiz Moreira (centro) e Luis Fernandes (dir)
Imagem: Bruno Braz / UOL Esporte

Vencedor na eleição do fim de 2014, Eurico Miranda colocou seus homens de confiança nos principais cargos do Vasco: vice-geral (Fernando Horta), presidente do Conselho Deliberativo (Luis Fernandes), presidente do Conselho Fiscal (Otto de Carvalho), presidente da Assembleia Geral (Itamar Ribeiro), vice-jurídico (Paulo Reis), vice de futebol (José Luiz Moreira).

Ato 2: O início da debandada

Rebaixado no Campeonato Brasileiro de 2015, Eurico Miranda viu o início da debandada de parte de seus aliados acontecer no começo do ano seguinte, quando seu fiel escudeiro, amigo familiar e ajudante financeiro José Luiz Moreira abandonar o barco por não concordar com algumas decisões tomadas pelo presidente. O ex-vice de futebol carregaria meses depois outros em sequência. Na cronologia do tempo saíram: Paulo Reis, no início de 2017, Otto de Carvalho, no meio de 2017, e Fernando Horta, em agosto de 2017.

Ato 3: A primeira virada de lado

Inconformados com os rumos de Eurico, os rebelados do presidente passam a ser articular para formar uma oposição. São eles: Fernando Horta, Otto de Carvalho e José Luiz Moreira. A ação geral revolta entre os pares de Miranda, com acusações de traição.

Ato 4: Os opositores

Do outro lado do cenário político, se encontravam os opositores que lançavam suas candidaturas. Eram eles: Julio Brant, vice-colocado em 2014, Alexandre Campello – com o apoio do terceiro colocado de 2014 Roberto Monteiro, e Otto de Carvalho.

Ato 5: As alianças 

Julio Brant e seu vice, Alexandre Campello, comemoram após apuração - Bruno Braz / UOL Esporte - Bruno Braz / UOL Esporte
Brant e Campello ainda como aliados comemorando vitória entre os sócios
Imagem: Bruno Braz / UOL Esporte

Com o clima esquentando cada vez mais, os grupos políticos passaram a se articular. Eurico Miranda, sempre muito forte, despontava como franco favorito para a reeleição. Por conta disso, um forte movimento nas redes sociais e nas arquibancadas clamou por uma união das oposições. Primeiro Otto de Carvalho largou a candidatura e declarou apoio a Horta. Em seguida, os dois opositores mais fortes, após muitas reuniões, se aliaram: Brant e Campello. O jogo começava a virar.

Ato 6: A eleição

Eurico foi derrotado novamento na justiça - Clever Felix/estadão conteúdo - Clever Felix/estadão conteúdo
A polêmica urna 7 da eleição do Vasco que rendeu batalhas judiciais
Imagem: Clever Felix/estadão conteúdo

Com fortes indícios e acusações de irregularidades na associação de pessoas ao clube, a Justiça entrou em ação e, no dia 7 de novembro de 2017, a eleição entre os sócios acontece com a urna 7 separada das demais por determinação dos tribunais com 691 pessoas suspeitas.

Vendo que Eurico caminhava para a vitória, Fernando Horta, em meio a processo, abandona a candidatura e declara apoio a Brant e Campello.

Na apuração, equilíbrio entre as urnas tirando a 7, que tinha uma ampla maioria de votos para Eurico, numa disparidade incomum em comparação com as outras.

Ato 7: A Justiça

Com os indícios de irregularidades cada vez mais fortes, tendo como base reportagens investigativas da imprensa, a Justiça decide anular a urna 7. Com isso, Julio Brant passa a ser o vencedor.

Na sequência, Eurico tenta uma série de ações nos tribunais com o objetivo de validar a urna da discórdia, mas não tem sucesso. O clima é de fim de festa para os apoiadores de Miranda.

Ato 8: O racha

Julio Brant, em alinhamento com Campello, caminha a passos largos para ratificar a vitória no Conselho Deliberativo. No decorrer dos dias, porém, há um distanciamento entre ambos.

Base de Alexandre, a “Frente Vasco Livre” anuncia, no último domingo, em nota oficial, que não participará mais da diretoria executiva. Era o primeiro indício do racha.

Dia 18 de janeiro de 2017, véspera da eleição no Conselho. Em campo, o Vasco perde em casa para o Bangu, por 2 a 0, na estreia no Campeonato Carioca. Minutos depois, Campello abre uma transmissão ao vivo no Facebook e declara: não será mais o vice-geral de Brant. O rompimento estava sacramentado.

Ato 9: A segunda virada de lado

Nos bastidores, os aliados de Eurico veem uma brecha para continuarem, de certo modo, no poder, e procuram o grupo de Campello através de Roberto Monteiro. Eurico, que havia entrado com um pedido de tutela antecipada no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para tentar anular a urna 7, retira a ação ainda na noite de quinta. Os indícios ficam cada vez mais fortes.

Ato 10: O grande ato

Dia 19 de janeiro de 2017. Chega o grande dia do Conselho Deliberativo. As especulações dos grupos de Campello e Eurico juntos ficam cada vez mais fortes. Julio Brant, vendo que o barco ia afundar, anuncia de última hora o apoio do lendário ex-presidente Antônio Soares Calçada como vice-geral aos 94 anos. A ação tem como tentativa obter votos entre os conselheiros natos, mas o movimento não é suficiente.

Às 20h, no início da reunião, se confirmam as suspeitas: os grupos de Campello e Eurico se unem e juntam seus votos. Pela primeira vez na história do clube, um candidato se torna presidente sem ter vencido a eleição nas urnas entre os sócios.

“Não existe nenhum acordo com o Eurico. Ele não terá membros na nossa gestão nem na vice-presidência e nem em cargo executivo. É uma chapa pura de oposição. Mais do que isso são ilações”, garantiu o vencedor.

Brant, ainda perplexo, fez acusações:

“O que teve aqui é uma vergonha, uma mancha na história do Vasco. Jamais aconteceu isso, do desejo do sócio ser desrespeitado. O segundo lugar se uniu com o quarto. Talvez o encanto de ser o presidente motivou a traição dele (Alexandre Campello). Quase dois mil sócios votaram na gente para tirar o discurso euriquista do Vasco. Se olharem o Conselho Fiscal, é tudo aliado do Eurico”.

Embora tenha se tornado o novo presidente, Alexandre Campello só tomará posse na próxima segunda-feira (22). Até domingo, o clube seguirá com uma diretoria administrativa determinada pela Justiça entre Eurico Miranda, Julio Brant e Fernando Horta.