David Neres supera expulsão na escola e banco no Ajax para chegar à seleção
Menos de três anos após estrear como profissional no São Paulo, David Neres chegou à seleção brasileira principal. O atacante foi chamado por Tite ontem para disputar dois amistosos no fim deste mês, contra Panamá e República Tcheca. A convocação foi motivada pelo corte de Vinicius Júnior, do Real Madrid, mas coroa o crescimento do tímido e decisivo Neres com o Ajax, sensação da Liga dos Campeões da Europa.
O jogador de 22 anos começou 2019 longe de seus melhores momentos. Depois de ser destaque do Campeonato Holandês na última temporada, o atacante entrou em rodízio no time titular, chegou a ficar no banco e esteve perto de ser negociado para o futebol chinês. Mas bastou uma chance em seu cenário favorito para Neres ganhar fôlego e voltar aos holofotes.
Desde as categorias de base do São Paulo, o jovem que cresceu em Perus era reconhecido por crescer em jogos grandes. Seu rival favorito era o Corinthians. Não à toa, um de seus três gols como profissional no Tricolor foi justamente sobre o rival alvinegro. Além disso, a promoção aconteceu quando o time paulista brigava contra o rebaixamento no Campeonato Brasileiro de 2016. Neres não sentiu a pressão e ajudou a equipe a escapar da Série B.
Essa personalidade forte pôde ser vista pelo mundo todo nas últimas semanas, quando os jovens do Ajax se depararam com o poderoso Real Madrid nas oitavas de final da Liga dos Campeões. Curiosamente, Neres precisava encarar um de seus concorrentes pelo sonho de chegar à seleção brasileira. E, no primeiro duelo com Vinicius Júnior, os dois empataram com uma assistência cada, mas o atacante do time espanhol voltou para casa com uma vitória por 2 a 1.
A desvantagem não intimidou o Ajax, assim como o famoso estádio Santiago Bernabéu não preocupou David Neres. Antes do confronto de volta, o ex-tricolor confidenciou a amigos que estava confiante. Era o tipo de jogo favorito do garoto. E enquanto Vinicius Júnior viveu drama com lesão e eliminação, Neres conheceu a glória ao marcar um dos gols e participar do feito histórico dos holandeses, que venceram por 4 a 1.
Na quarta-feira, quando o diagnóstico de Vinicius Júnior se tornou público, Neres, seus representantes e seus familiares lamentaram pelo incidente com o ex-flamenguista, mas já mostravam otimismo. Para eles, a convocação de Tite seria algo natural, consequência do trabalho. Ainda assim, não deixou de ser motivo de festa.
No campo, Neres abandona timidez e nervosismo
Tranquilo, tímido, na dele. Quem convive com David Neres costuma repetir muito essas expressões na hora de tentar descrever o jogador fora de campo. Longe dos gramados, escolhe a dedo os amigos, se abre com poucos, mas tenta ajudar todo mundo que um dia esteve a seu lado. É difícil vê-lo dar entrevistas. A combinação câmera e microfone ainda assusta um pouco.
Mas basta sentir o cheiro da grama para que a personalidade se transforme. Sai o "Dedê" calado e aparece o Neres confiante. Foi assim quando estreou pelo profissional do São Paulo, em 2016, contra o Fluminense. Ao ser chamado pelo então técnico Ricardo Gomes, sentiu frio na barriga e tremeu de nervoso. Foi só pisar em campo para deixar tudo isso para trás e, em um dos primeiros lances, ajudar a construir o gol de empate do Tricolor.
Neres diz que funciona melhor com a adrenalina dos jogos. Quando está pilhado, acelerado, consegue se soltar até nas entrevistas, como foi na Florida Cup deste ano, após marcar na vitória do Ajax sobre o próprio São Paulo. Na ocasião, mostrou também outra de suas versões: o piadista.
Ao ser pergunta se a camisa tricolor que trocou na partida havia lhe caído bem, o atacante não hesitou: "No meu corpo qualquer camisa cai bem (risos)". Pérolas do tipo divertem os amigos. Também na viagem para os Estados Unidos, encontrou colegas da base são-paulina no aeroporto. O goleiro Lucas Perri, hoje no Crystal Palace, comentou que Neres "estava mandando na Holanda". A resposta foi imediata: "não mando nem na minha casa".
Craque de bola, pesadelo na escola
O São Paulo sempre tratou David Neres como uma de suas principais promessas. O jovem passou dez anos nas categorias de base do clube, conquistou até uma Libertadores pelo time sub-20, mas chegou a dar um certo trabalho para o clube. Afinal, foi expulso do colégio, e o bom desempenho escolar sempre foi um pré-requisito para os garotos seguirem em Cotia.
"Cheguei no São Paulo em 2007, com dez anos de idade e fui conquistar títulos no sub-20. Foi uma trajetória difícil lá, por conta de problemas na escola. Mas no fim deu certo. Fui expulso da escola, mas consegui dar a volta por cima (risos). Tive um problema com a diretora da escola, mas tá tranquilo", contou Neres, em entrevista à SPFCtv, em 2016.
De Cotia ao Bernabéu, embalado pelo funk
Neres sempre jurou ser um cara sossegado, caseiro. Nas folgas, sempre gostou de ficar em casa com os pais. Até por isso, sempre leva os pais para a Holanda. O atacante não gosta nem de perder tempo com jogos de videogame. Mas há duas coisas que pautam seus momentos de lazer: baralho e funk.
No São Paulo, dizia formar dupla imbatível com Luiz Araújo, atualmente no Lille, da França. Suas vítimas preferidas eram o volante Wesley e o zagueiro Rodrigo Caio. As comemorações, no truco nos jogos, sempre foram embaladas pelo funk. Mas não espere que os hits mais populares do ritmo saiam das caixas de som de David Neres.
O "proibidão" é o estilo favorito do garoto, que faz questão de mostrar as músicas para os companheiros de Ajax conhecerem. Foi assim após a histórica vitória sobre o Real Madrid na última terça-feira. Os atletas do time holandês festejavam no vestiário do Santiago Bernabéu embalados pelo funk brasileiro.
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