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Michael foi treinado por Tite, virou modelo e acha que Neymar se veste mal

Michael Camiloto era jogador de futebol e virou modelo - WAY Model
Michael Camiloto era jogador de futebol e virou modelo Imagem: WAY Model

Felipe Pereira

Do UOL, em São Paulo

09/04/2019 12h00

Maycon passou 17 anos da vida se preparando para ser jogador de futebol. A carreira ainda engatinhava quando recebeu um não definitivo. Uma lesão no joelho pendurava as chuteiras do capitão do time júnior do Caxias. Era uma tarde de uma quinta-feira, abril de 2003.

Na noite do mesmo dia, Maycon virou Michael Camiloto. Ele ainda não sabia que seria rebatizado, mas a grafia estrangeira ajudaria na nova profissão: a de modelo internacional. O currículo dele é pesado. Trabalhos para Gucci, Dolce & Gabbana e Giorgio Armani. Michael está com 33 anos e pode-se dizer que defendeu o Barcelona e o Real Madrid do mundo da moda.

Como acontece com muitas estrelas de futebol, o princípio da história dele é similar ao de milhões de meninos. Ele ainda era Maycon e, como quase todos os garotos de Vargeão, cidade agrícola do interior de Santa Catarina, adorava jogar bola. Presenteado com o dom do futebol, teve um caminho diferente dos demais.

Começou como goleiro de futsal e, na hora de defender a cidade vizinha num campeonato estadual de base, já jogava na linha. Um olheiro se interessou pelo menino, com então 13 anos. A aprovação na peneira virou festa. No ano seguinte, Maycon mudou para a Serra Gaúcha.

"Brinco com minha mãe até hoje. Como você me deixou fazer isso?"

O modelo Michael Camiloto nos tempos de base do Caxias - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Imagem: Arquivo Pessoal

Alegria e choro na base do Caxias

Maycon era um zagueiro no estilo de futebol força do interior do Rio Grande do Sul, trombador quando precisava. Mas ele diz que tentava sair jogando quando tinha a bola no pé. Ser ambidestro ajudava na função. Era bonito de ver, menos para o técnico.

"Às vezes eu pegava a bola lá atrás e fazia aquela virada de jogo para a outra lateral. 'Quer me matar do coração?' gritava o treinador".

Fora de campo, a vida era dura. Maycon chorava de saudade. Quando voltava para casa, uma vez a cada trimestre, o adeus era com a mãe e o filho aos prantos. O consolo estava no desempenho nos gramados. Treinar com os meninos mais velhos virou rotina. O zagueiro ganhou a braçadeira de capitão e chegou a treinar com os profissionais algumas vezes.

"Na época o time principal era treinado pelo Tite. Cheguei a fazer uns dois ou três treinos com ele".

Michael Camiloto, modelo internacional - WAY Model - WAY Model
Imagem: WAY Model

Tite já falava titês

Maycon conta que o técnico tinha a fama de ser muito bravo. Acrescenta que, pelo que vê nas entrevistas pela televisão, o treinador está mais sereno. Uma coisa que não mudou é a coerência. Uma característica que era ainda mais visível é o modo de falar.

"Ele já era assim com o titês. Era até pior. Morando e convivendo com pessoas da Serra Gaúcha aflorava ainda mais. Além do sotaque, tinha um dialeto de palavras que se usa na região."

Mas Tite e Maycon tomaram caminhos divergentes. Hoje, o treinador se veste de seleção brasileira. O uniforme do ex-zagueiro é muito mais alinhado: ternos e roupas das maiores grifes do mundo. Não foi uma opção, mas imposição do corpo.

Michael Camiloto trabalhou para Gucci e Giorgio Armani - WAY Model - WAY Model
Imagem: WAY Model

Lesão interrompe carreira promissora

O fim da carreira de Maycon não ocorreu na velocidade de um lance. Foi como um vazamento sutil que ao longo do tempo se encarrega de condenar o teto de um apartamento. A única diferença é que a lesão no joelho se mostrou irremediável.

Era final de 2002 quando uma dorzinha apareceu. Maycon foi liberado para as festas de final de ano com a certeza de que o tempo curaria. Mas nem os beijinhos de mãe resolveram. Ele lamenta que time do interior não tem a estrutura para fazer aquele monte de exames que viram o atleta do avesso.

Não se sabia se era cartilagem, ligamento ou outro motivo. Maycon voltou a tentar jogar em abril e a dor estava lá. Ainda mais forte. Com o time precisando aliviar as contas, o zagueiro-promessa entrou numa barca de dispensas.

"Foi muito triste, estava no Caxias havia quatro anos, não esperava. Chorei bastante. Fui dispensado com outros amigos, todos se sentindo mal."

Michael Camiloto foi o sétimo principal modelo do mundo - WAY Model - WAY Model
Michael e Carol Trentini, uma das principais brasileiras nas passarelas internacionais
Imagem: WAY Model

Na hora certa e no lugar certo

A carreira de futebol terminava sem um jogo profissional. Meio contra vontade, Maycon foi ao shopping à noite acompanhar o desfile de um goleiro do time júnior. Uma funcionária da agência de moda que organizou o evento ignorou a passarela e cresceu o olho para um jovem que agora era ex-projeto de jogador de futebol.

"Até então não sabia o que era ser modelo. Vivia tanto no mundo do futebol que moda era coisa de outro planeta. Ela se apresentou e me deu um cartão. A gente conversou no dia seguinte e combinou de ir a Porto Alegre. Fizemos umas fotos e mandamos para o pessoal de São Paulo, que gostou das polaroides".

A metamorfose de Maycon para Michael Camiloto já havia acontecido, mas ele não sabia. Patrício, um jogador com passagens por Vasco e Grêmio, é da mesma cidade que ele e estava no Guarani. Conseguiu um teste para ele no time, tentativa de manter a possibilidade da carreira de jogador em aberto. Não rolou.

Mas a passagem por Campinas rendeu um contato com pessoas próximas a Serginho Chulapa. O ex-atacante da seleção brasileira conseguiu um teste no São Paulo. Michael era todo animação, porque tinha chance de jogar no clube do coração.

"Cheguei achando: 'agora vai!' Serginho me levando, maior artilheiro da história do São Paulo. Também não rolou. Quando cheguei, o time de juniores estava viajando para um torneio na Espanha e o elenco estava fechado".

Michael Camiloto era capitão na base do Caxias - WAY Model - WAY Model
Imagem: WAY Model

Um dia que durou três meses

A funcionária da agência de moda que Michael conheceu em Caxias insistiu para ele procurar os parceiros em São Paulo. No dia da viagem de volta, um ex-jogador bateu no escritório. Explicou que tentou mais um time e não tinha dado certo, por isso estava disposto a ser modelo. Os futuros patrões perguntaram se aceitaria morar em São Paulo. O 'sim' teve implicações imediatas.

"Fui cortar cabelo e fiz fotos. À tarde, falaram que conseguiram um teste. Eu tinha passagem de volta à noite e pediram para ficar. Não conhecia ninguém e liguei para o Patrício. Eu fiquei morando na casa dele em Campinas".

Michael engatou um trabalho atrás do outro e em cinco meses não dependia mais de ninguém para pagar as contas. Passado um ano, estava com viagem marcada para Paris. Foi como ser vendido para um clube na Europa. Também foi época de provação. A temporada da moda exige ficar fora no Natal e Ano Novo encarando uma senhora friaca.

"Eu falo que jogar no Caxias foi a escola que tive para o que viria a enfrentar no mundo da moda. Eu era muito novo e amadureci rápido no clube. Não haveria nem São Paulo sem morar em Caxias. Vargeão tem 3,5 mil habitantes e o pessoal da minha cidade olha para São Paulo achando que é um bicho sete cabeças. Meu pai e minha mãe viam Cidade Alerta e achavam que era um assalto a cada esquina".

Michael Camiloto foi descoberto enquanto acompanhava um desfile - WAY Model - WAY Model
Imagem: WAY Model

Um dos maiores do mundo

Michael teve certeza que estava no caminho certo quando foi convidado para uma campanha da Gucci em outubro de 2005. O modelo conheceu o lado glamouroso da profissão ao desembarcar nos Estados Unidos. Ele teve problemas para tirar o visto, perdeu o voo e aterrissou só a roupa do corpo. Cenário digno de uma catástrofe, mas não no caso dele.

"Cheguei em Los Angeles com motorista me esperando, hotel cinco estrelas. Fiz prova de roupa e no dia seguinte comecei a fotografar".

O modelo já viajou por 30 países e trabalhou para Giorgio Armani, Dolce & Gabbana, Michael Kors e Ralph Lauren. Michael já foi o sétimo colocado no ranking do site especializado Models.com. Não é pouca coisa.

"Nunca pensei em ser top, mas sempre encarei a moda com muita seriedade. Tem gente que encara como diversão. Gente que acha que ser modelo é aventura, não dura. Eu fui tomando decisões para que fosse algo duradouro."

O modelo Michael Camiloto - Way Model - Way Model
Imagem: Way Model

Não curte o estilo de Neymar

A carreira tomou outra direção, mas Michael nunca deixou de gostar de futebol. O roteiro das passagens pelo Brasil incluía visitas ao Morumbi. O modelo aliou as duas frentes quando o São Paulo lançou uma edição comemorativa da jaqueta usada pelo time em 1992.

"É a que Telê Santana usava naquele ano, quando ganhamos a primeira Libertadores. Comprei duas. Uma eu uso e a outra está guardada no plástico de relíquia".

Questionado sobre os jogadores que se vestem bem, Michael não citou nenhum nome. Mas reclamou do estilo de dois atletas conhecidos pelo gosto duvidoso.

"Tem os que se vestem mal. Neymar e Daniel Alves para mim não dá. Estilo que não gosto. Não me vejo usando. Sou mais clássico, mais simples. Eles têm coisa voltada para high fashion [alta moda]".

Michael prefere a alfaiataria de Armani, sua marca favorita. Ele diz que se sente poderoso ao usar um terno da grife. Leva este estilo para a faculdade, agora que voltou a morar no Brasil. O modelo diz que gostaria de esticar a carreira até os 50 anos, mas sabe que pode não acontecer, por isso está se preparando.

Estuda investir em equipamentos médicos da área de estética e performance. O modelo também é ligado ao mercado financeiro e imobiliário. Faz aplicações desde cedo e lê bastante sobre economia e política. A faculdade é para aliar o conhecimento que adquiriu a uma base acadêmica. Provavelmente, sendo o mais bem vestido da turma.