Por que a dona da Bola de Ouro abriu mão de disputar Copa do Mundo feminina
A Copa do Mundo de futebol feminino não terá uma das melhores atletas do planeta. Dona da primeira Bola de Ouro entregue pela France Football a uma mulher, Ada Hegerberg tem apenas 23 anos e já fez mais de 250 gols na carreira. Com o Lyon, conquistou as três últimas edições da Liga dos Campeões, e, em 2016, foi eleita pela Uefa como melhor jogadora da Europa.
O histórico impressiona, mas a norueguesa optou por não defender mais a seleção e não desfilará seu bom futebol no Mundial da França.
Quem viu a reação tímida de Ada ao ouvir uma pergunta sobre seu "rebolado" logo após ganhar a Bola de Ouro (veja abaixo) não imagina que a atleta é, na verdade, uma jovem mulher de personalidade forte e muito passional com as ideias que defende.
Filha dos treinadores Gerd e Erik e irmã de Andrine, que joga pelo PSG, ela cresceu em um lar que sempre valorizou a igualdade e foi incentivada pela mãe a usar a própria voz de forma positiva. Por isso, desde 2017, quando decidiu deixar a equipe da Noruega, Ada já se reuniu com a Federação Norueguesa de Futebol e colocou na mesa as demandas que, em sua visão, fariam o futebol feminino evoluir no país.
"O futebol é o maior esporte na Noruega para as mulheres e tem sido assim por anos, mas, ao mesmo tempo, as mulheres não têm as mesmas oportunidades que os homens. A Noruega tem um grande histórico no futebol feminino, mas é mais difícil agora. Nós paramos de falar sobre desenvolvimento e fomos superados por outros países", afirmou à CNN.
O fato de que Ada encontrou desigualdade de gênero em seu caminho pode ser chocante para alguns brasileiros. Afinal, estamos falando da Noruega, o país que anunciou um acordo em 2017 que iguala os salários das seleções masculina e feminina. A entidade que rege o futebol norueguês ofereceu um aumento às mulheres da equipe e propôs aos homens uma pequena redução salarial, que foi prontamente aceita.
Portanto, o que falta? "Nem tudo na vida é sobre dinheiro", respondeu ela. "Algumas boas mudanças seriam necessárias para eu considerar um retorno ao time. Não é questão de eu mudar de ideia ou não. A questão é que a federação e a seleção precisam evoluir, e há um longo caminho neste sentido", explicou em entrevista à rede NRK, da Noruega.
Ada criticou os dirigentes da federação. Consequentemente, começaram a circular histórias sobre uma atleta supostamente "difícil" e "direta demais" na forma como conversava com as colegas de seleção.
"Se as pessoas têm um problema comigo ou minhas atitudes, espero que venham falar diretamente comigo, cara a cara. Ninguém fez isso", rebateu Ada, com firmeza, em entrevista ao jornal britânico Independent.
"Obviamente, eu adoraria jogar pelo meu país. Eu tenho sido muito crítica e direta com a federação sobre o que eu sentia que não estava bom o suficiente para a seleção e para a minha carreira", disse. "Eu sei o que quero, e conheço meus valores. Portanto, é fácil tomar decisões difíceis quando você sabe por quais valores vale a pena lutar. Sou verdadeira comigo mesma", completou.
Renunciar à seleção não parece ter sido tão fácil quanto Ada diz agora. Ao jornal Independent, ela já revelou ter perdido noites de sono antes de oficializar a decisão; só relaxou recentemente, ao entender que foi justa com seus próprios ideais. "É sobre preparação, atitudes, profissionalismo. São pontos bem claros que levantei diretamente para eles", declarou.
A vencedora da Bola de Ouro não desbancou Marta na premiação por acaso: a jovem atleta é extremamente competitiva e cresceu em um ambiente que estimulou esta personalidade. No recesso de janeiro de 2019, por exemplo, ela e Andrine treinaram intensamente em casa, na neve, e sob instruções do pai. Parece loucura, mas, para Ada, isto é "relaxar".
"Pai, você é a minha rocha. Por favor, permaneça em forma. Vou precisar dos seus cruzamentos para treinar por mais uns 10 anos", escreveu Ada ontem (18), no Instagram, para celebrar o aniversário do pai.
Ela já passou de 250 gols na carreira e estipulou uma meta pessoal de marcar pelo menos 50 por temporada. Se mantiver este ritmo, chegará facilmente aos 300 gols até o fim de 2019, quando terá 24 anos de idade. "Será um desafio manter esta média, mas é preciso encontrar soluções quando as coisas são desafiantes", disse, tranquila, à CNN.
"Eu estou animada para trabalhar em cima de cada detalhe e permanecer no topo pelo maior tempo que puder. (...) Estou focada em jogar 100% do meu melhor futebol pelo Lyon. É claro que tenho ambições mesmo sem jogar pela seleção", acrescentou. O clube a ajuda muito neste sentido: das 14 atletas que concorreram com Ada pela Bola de Ouro, seis são colegas de time.
Não é difícil concluir que o Lyon é referência. "O que é ótimo sobre o Lyon é que nós somos um grupo muito competitivo, mas nos conhecemos muito bem. Então o que acontece em campo permanece no campo", explicou Ada. Martin Sjogren, técnico da Noruega, deixou claro à AFP que gostaria de tê-la no elenco, mas é tão objetivo quanto ela:
"Torço para que Ada mude de ideia e que possa ser parte da seleção da Noruega no futuro. Porém, como treinador de uma seleção, você sempre quer ter os melhores atletas à disposição, mas não pode focar nos que não querem fazer parte da equipe".
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