Topo

Mecânico e auxiliar de contabilidade solicitaram passaporte de Ronaldinho

JORGE ADORNO/REUTERS
Imagem: JORGE ADORNO/REUTERS

Ricardo Perrone

Do UOL, em Assunção (PAR)

13/03/2020 17h48

Na última quinta (12), o caso Ronaldinho vivenciou um de seus depoimentos mais tensos. Durante três horas, Sebastián Medina e Iván Ocampo, apontados como os despachantes que cuidaram da documentação paraguaia falsa usada por Ronaldinho Gaúcho, Assis e pelo empresário Wilmondes Sousa Lira para entrarem no país, contaram sua versão dos fatos.

Ao UOL Esporte, o advogado Gerardo Chamorro, defensor de Medina e Ocampo, fez um relato surpreendente sobre as declarações que seus clientes prestaram às autoridades.

Ele começa com uma informação de cair o queixo. Os profissionais que intermediaram a obtenção da documentação paraguaia de Ronaldinho não são despachantes. Ocampo é mecânico. Medina atua como auxiliar contábil.

Segundo Chamorro, eles implicaram um funcionário do Departamento de Imigrações do Paraguai, Bernardo Arellano, que já havia sido processado no caso.

O enredo tem ainda o "sumiço" de US$ 15 mil e obtenção de passaportes paraguaios apenas com o uso de cópias de cédulas de identidade brasileira.

Ocampo e Medina estão detidos e no momento da entrevista aguardavam a Justiça marcar audiência para saber se terão prisão preventiva ou domiciliar decretada ou ainda serem liberados. Eles são acusados de associação criminosa, produção de documentos públicos com conteúdo falso e uso desses documentos.

Abaixo, conheça a história de um mecânico e um auxiliar de contabilidade com papel importante no roteiro responsável por colocar um dos jogadores de futebol mais famosos do planeta em prisão preventiva ao lado de seu irmão no Paraguai:

"Meus clientes comentaram no depoimento que receberam o pedido da senhora Dalia para ajudar no pedido de três passaportes paraguaios para Ronaldinho, Assis e Wilmondes.

Em setembro ou outubro eles tinham feito o passaporte da senhora Paula (mulher de Lira). Acontece que os meus clientes não são despachantes. Iván é mecânico e Sebastián é auxiliar de contabilidade

Na primeira vez em que a senhora Dalia perguntou se eles conheciam alguém que pudesse fazer os passaportes, os dois conversaram com o amigo do Sebastián, Wilson Arellano, que é filho de um senhor, Bernardo Arellano, que trabalha no Departamento de Imigrações do Paraguai.

Eles perguntaram ao Bernardo se ele conhecia algum despachante para fazer o documento. Ele respondeu que sim, que faziam isso no Departamento de Imigrações. Segundo meus clientes, ele cobrou uma quantia para fazer. Isso por praticidade e rapidez, de forma legal.

Elas aceitaram e poucos dias depois estava tudo pronto.

Como deu tudo certo e o passaporte da senhora Paula é legal, tanto que ela não foi processada, no final de novembro, conforme disseram meus clientes, a senhora Dalia consultou Iván sobre se eles poderiam fazer mais três passaportes e três documentos de identificação (similares à carteira de identidade brasileira).

Ele e Sebastián falaram com o senhor Arellano. A resposta foi, como contaram meus clientes em seus depoimentos, que poderia ser feito, mas custaria o dobro. Como eram mais pessoas, ele teria mais trabalho. Até porque a senhora Paula já tinha o 'carnê de radicação' (parte do processo para estrangeiro obter passaporte paraguaio) e esses três (Ronaldinho, Assis e Lira) não tinham. Eles acreditavam que era tudo legal.

Um é mecânico, o outro auxiliar de contabilidade. Eles não conhecem a legislação (nota da redação: para um estrangeiro obter passaporte paraguaio ele precisa viver pelo menos três anos no país, além de antes passar pelo processo de "radicação"). Paula pediu tudo isso para Iván porque ele é de confiança, os dois se conhecem há muito tempo, ele faz trabalhos esporádicos para ela.

Meus clientes disseram que Arellano só pediu a cópia da carteira de identidade dos três brasileiros. Ele afirmou que tinha contatos na polícia brasileira e conseguiria os outros documentos. Ficou encarregado de tudo. E tudo seria legal.

Em dezembro, conforme os depoimentos, Arellano avisa que precisa fazer um depósito de garantia de US$ 5 mil por pessoa. Esse foi valor seria devolvido quando os documentos ficassem prontos. Iván e Sebastián reclamaram que ele não tinha avisado isso antes. Iván avisa à senhora Dalia, que também reclama, mas facilita o dinheiro para os pagamentos.

Como meus clientes não sabem fazer essas coisas, eles pediram a uma amiga para cuidar do depósito. Em janeiro, acho que no dia 8, ele entrega os passaportes.

Senhor Iván retira os documentos e, em sua ignorância, sai todo contente e feliz. Ele achava que era tudo legal, entregou os documentos para senhora Dalia.

No começo de fevereiro, conforme eles falaram no depoimento, a senhora Dalia pergunta sobre o dinheiro dado como garantia. Eles perguntaram a Arellano, e ele respondeu: 'fiquem tranquilos. Vou dar um papel para vocês e vocês conseguem retirar no banco".

Meus clientes contam que procuraram a mesma amiga que cuidou do depósito. Ela verificou e disse que com aquele documento não seria possível retirar o dinheiro. De novo, eles reclamaram com Arellano, que falou: 'vou solucionar'. Ele não resolvia e sempre ficava falando que iria resolver.

Iván, então, resolveu investigar e descobriu que os documentos não eram legais. Eles avisaram para o Ministério do Interior na segunda-feira da semana em que Ronaldinho chegou ao Paraguai. Contaram quem era o funcionário da imigração que havia cuidado dos passaportes. Por que não avisaram Ronaldinho por meio de Dalia que os documentos eram falsos e não poderiam ser usados? Não sei, não lembro se falaram isso."