Agente foi de aposentadoria precoce a maior negócio de brasileiro no United
Um dos responsáveis pela venda de Fred ao Manchester United, Fábio Mello se tornou uma figura bem-sucedida no futebol. Mas não do jeito que sonhava inicialmente. Revelado pela base do São Paulo, passou por Athletico-PR, Atlético-MG e Fluminense como jogador. Em 2005, aos 30 anos, decidiu interromper a carreira como atleta. À época, foi estudar gestão esportiva enquanto aguardava uma nova proposta de algum clube. Sem algo que agradasse, teve que tomar uma difícil decisão: aposentar-se de forma precoce.
A escolha não parecia nada razoável para quem trilhava um caminho de grandes clubes do futebol brasileiro. O então meio-campista, no entanto, se preparava para trocar as chuteiras pelo terno e a gravata. A ideia era trabalhar com gestão esportiva.
"Eu via, naquele momento, a minha carreira instável e com poucas chances de decolar novamente. Foi quando voltei a estudar e fiz um curso de gestão esportiva. Treinava de manhã e à tarde e aguardava contatos dos empresários com possíveis propostas. Voltei a estudar à noite e entrei na faculdade. No primeiro semestre de faculdade tive propostas que não me agradaram e, ao mesmo tempo, percebi que o curso de gestão esportiva estava me agregando muito. Então preferi concluir o curso", disse Fábio Mello ao UOL Esporte.
Mesmo sem ter propostas que o agradassem no mercado da bola, Fábio Mello reconhece que a decisão de encerrar a carreira foi uma das mais acertadas da vida.
"Foi uma decisão muito difícil, mas muito bem estruturada e pensada. O respaldo familiar foi fundamental. Meus pais, meus irmãos e minha esposa acompanhavam de perto cada passo. Hoje, depois de quase quinze anos, acho que foi um dos maiores acertos da minha vida. Eu imaginava o cenário da minha carreira como atleta, até onde poderia ir, como era a minha posição no mercado e a minha característica. Sempre tive mais qualidades técnicas que físicas. E a questão física estava prevalecendo cada vez mais e está assim até hoje. Ficaria difícil atletas com a minha característica se consolidarem. Foi com muita dor e foi muito difícil assumir essa decisão. Decidi que era melhor me preparar para outra oportunidade. Era fundamental entender o cenário", comentou.
"Eu pensei: se eu começar a me preparar o pessoal da minha geração estará jogando ainda, os meus técnicos seguirão no comando dos clubes e o meu relacionamento com eles seria fundamental para essa nova atividade. Imaginei que ali teria uma sequência de atuação mais sólida. Uma hora o atleta para, ele encerra a carreira. O grande negócio é entender o momento. Eu parei aos 30 [anos]. É difícil parar de jogar, parar de treinar, tudo isso é muito difícil, mas chega um ponto da carreira que o futebol começa a te machucar porque você não consegue mais produzir, não consegue mais atuar em alto nível e você vai perdendo o reconhecimento. Antes que começasse a me machucar mais, eu preferi parar", acrescentou.
Dois anos após a decisão de parar, Fábio Mello começou a atuar como agente, profissão que o transformou em figura influente no futebol. O primeiro cliente foi o amigo Réver, que se transferiu por empréstimo para o Al-Wahda, dos Emirados Árabes Unidos, em 2007. No ano seguinte, a carteira de clientes já estaria maior. Além do zagueiro, outro ex-companheiro de equipe passou a contar com o trabalho do empresário: o goleiro Victor. Foi ele quem levou a dupla do Paulista de Jundiaí para o Grêmio.
"No final de 2007 e início de 2008, o Mano Menezes indicou o Victor para o Grêmio. O Réver, que estava nos Emirados Árabes, voltou para o Paulista de Jundiaí e logo após o Paulistão negociei ele com o Grêmio também. Foram duas importantes negociações que fiz em 2008. Nesse mesmo ano, o Grêmio foi Vice Campeão Brasileiro tendo Victor e Réver como grandes destaques. Então, assim como eles, tive um surgimento muito rápido no mercado. Acredito que a relação pessoal e transparente que mantenho com os atletas e com os clubes desde o início da carreira como agente foi o grande diferencial. Você pode ser um agente jovem buscando espaço no mercado, mas se trabalhar de forma profissional buscando sempre o equilíbrio e bom senso nas negociações, naturalmente as coisas acontecem", comentou.
E foi isso que aconteceu com o até então inexperiente Fábio Mello. Sem know-how na área, precisou aliar os conhecimentos adquiridos como atleta e a boa relação no futebol com a teoria da faculdade de gestão esportiva para conseguir dar um salto na nova profissão.
"A partir de 2008/2009 minha relação com os clubes brasileiros ficou muito próxima. Para manter essa relação aquecida é importante, durante toda a temporada, identificar as principais necessidades dos clubes, analisar o potencial dos atletas, conhecer as categorias de base e saber quem são os expoentes, assim como é o caso do nosso atleta Gabriel Verón, atacante do Palmeiras, que foi campeão e eleito melhor jogador do Mundial Sub 17. Tudo isso faz com que você ganhe cada vez mais espaço", afirmou.
No decorrer da década seguinte ampliou o número de clientes, consolidou ainda mais as relações com o mercado e viu Victor receber a convocação para a Copa do Mundo 2014. Porém, o auge ainda estava por vir. Foi em 2018 que Fábio Mello fez a negociação mais importante da carreira como agente: a venda de Fred do Shakhtar Donetsk para o Manchester United por 55 milhões de euros (R$ 240 milhões à época). O negócio foi sacramentado em junho daquele ano. Todavia, o processo para a inserção no mercado europeu se iniciou bem antes.
"A concretização da negociação do Fred com o Manchester United foi o ápice da minha trajetória, mas para chegar no Manchester United tive a necessidade de criar uma nova estratégia para a empresa e isso foi mais ou menos em 2015/2016. Identifiquei que precisava criar minha conexão direta com clubes europeus. Naquele momento, ou o mercado vinha atrás do nosso atleta diretamente ou um agente trazia a proposta. O que eu fiz? Convidei alguns amigos que jogaram em grandes clubes europeus, que eram referências em determinados países, e apresentei um projeto de parceria para eles. O Gilberto Silva tinha jogado comigo no Atlético (na verdade eu que joguei com ele, né) e eu o convidei para trabalhar com nossos atletas em clubes na Inglaterra e na Grécia e, em decorrência deste projeto, em uma das nossas primeiras viagens, o Gilberto acabou sendo convidado para ser diretor-executivo do Panathinaikos. Com isso fomos obrigados a segurar a parceria. Ele voltou depois de um ano e reativamos", declarou.
"Foi aí que veio o projeto do Fred. Ele estava em altíssimo nível no Shakhtar, convocado para a seleção brasileira. Houve uma recusa pela proposta do Manchester City em janeiro/18 porque o Shakhtar estava nas quartas de final da Champions League. Eles não quiseram vender. Seguramos a negociação, alinhamos com o Shakhtar e na janela antes da Copa do Mundo conseguimos concretizar a operação com o Manchester United que na época era comandada pelo Mourinho. O fato de concretizar uma negociação desta magnitude é muito gratificante, mas a visão de identificar e convidar o Gilberto Silva para iniciar nossa entrada no mercado europeu foi fundamental. Ele é um cara incrível, ídolo na Inglaterra e uma referência para os brasileiros que jogam na Premier League. Foi um momento especial" completou.
Referências e combate ao preconceito na função
Bem articulado, Fábio Mello tem boa relação com outros empresários. Não à toa define aqueles que são referências no cargo. Juan Figer, Giuliano Bertolucci e Eduardo Uram aparecem na lista.
"Todos têm uma importância no mercado, mas vou citar três grandes agentes que para mim são referências. O primeiro é o senhor Juan Figer: fui atleta dele, fui representado por ele no melhor momento da minha carreira. A forma como ele lidera as negociações e a relação que tinha e ainda tem com os clubes é admirável", comentou.
"Outro que admiro é o Giuliano Bertolucci: tem a confiança e muito boa relação com os principais clubes europeus. E uma pessoa que sou grato por ter me ensinado muito é o Eduardo Uram. Ele me acolheu em 2008/2009, me deu oportunidades importantes e aprendi muito com ele. A forma como ele conduz as negociações, como ele se relaciona com o mercado, como se relaciona com os clubes, sempre muito sério, leal e educado. Sempre me senti à vontade na sala do escritório dele. Na maioria das vezes, o pai e o filho dele estavam presentes e isso é um valor muito importante pra mim. Sou muito grato ao Uram", acrescentou.
Defensor do trabalho que exerce no futebol, luta contra o preconceito e os julgamentos à função no mercado da bola: "As pessoas acompanham a rotina dos clubes, dos dirigentes, dos atletas, mas poucos conhecem de fato o trabalho dos agentes. Se houvesse uma cobertura específica para entender melhor a dinâmica do nosso dia-a-dia, o pessoal validaria mais [o nosso papel]. Um movimento cada vez mais comum nesses últimos tempos é a participação dos pais em parceria com os agentes. Sinceramente acredito que isso fortalece muito a relação. Quando o pai começa a viajar, participar das reuniões, ele passa a entender melhor o trabalho e naturalmente a informação chega no atleta/filho de uma outra forma e, assim, passam a dar ainda mais valor para a relação. Exemplo disso é o pai do Lyanco (Marcelo), zagueiro do Torino e nosso capitão da Seleção Olímpica, que hoje se tornou um grande amigo e representante da empresa em alguns assuntos na Europa. O fato dele morar em Torino fortalece nossa parceria".
"Tenho convicção que a nossa atividade é fundamental para o desenvolvimento do nosso mercado. Temos exemplos de grandes empresas na Alemanha, na Inglaterra, nos principais mercados e aqui não é diferente. Precisamos nos respeitar, trabalhar em conjunto e entender que quanto mais forte o futebol brasileiro estiver melhor será para todos", concluiu.
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