CBF age politicamente para vetar escolha de clubes no STJD e cria mal-estar
Após realizarem diversas reuniões e uma votação, os clubes brasileiros tinham decidido trocar um dos dois representantes a que tem direito no pleno do Superior Tribunal de Justiça Desportiva, substituindo o auditor João Bosco por Luis Felipe Bulus para o próximo mandato de quatro anos, que começa em julho deste ano. O UOL Esporte apurou que a Confederação Brasileira de Futebol se incomodou com a decisão e passou, com a ajuda de algumas federações estaduais e atuação pessoal do presidente Rogério Caboclo, a pressionar politicamente dirigentes de times para retificarem o voto e escolherem o nome de Bosco, preferido e indicado da entidade.
O pleno do Superior Tribunal de Justiça Desportiva é, por lei, composto por membros indicados por diferentes categorias: atletas, clubes, CBF, OAB e árbitros. As equipes têm direito a dois nomes, e a CBF também indica dois julgadores. A entidade agora é acusada de também exigir que os clubes indiquem, em uma de suas vagas, um nome escolhido por ela, para além dos dois aos quais teria direito. Procurada, a confederação disse que "a CBF não participou nem participará deste processo".
No final do ano passado, alguns clube da Série A começaram a discutir um novo nome para os próximos quatro anos — seus representantes eram José Perdiz e João Bosco, e havia entre alguns dirigentes e departamentos jurídicos a avaliação de que Bosco tinha entendimentos mais favoráveis à CBF do que aos clubes em julgamentos envolvendo ambas as partes.
Em uma votação não unânime, com votos favoráveis de pelo menos 12 clubes — a reportagem do UOL Esporte apurou que Flamengo, Fluminense, Botafogo, Vasco, Atlético-MG, Athletico-PR, Palmeiras, Bahia, São Paulo, Santos, Grêmio e Inter estavam entre eles — foi tomada a decisão de indicar para o ano que vem, ao invés de Bosco, o auditor Luiz Felipe Bulus. Esse bloco já seria suficiente para garantir a mudança nos nomes.
A partir daí, vários clubes e dirigentes ouvidos pela reportagem relatam uma resposta política agressiva da CBF contra a nomeação. O presidente da entidade, Rogério Caboclo, entrou pessoalmente em contato com os presidentes de clubes para solicitar a nomeação de Bosco e pressionar politicamente contra a mudança. Em São Paulo, Reinaldo Carneiro Bastos, presidente da Federação Paulista de Futebol (FPF), também atuou entrando em contato com diretorias.
O lobby fez com que alguns clubes revissem suas decisões — casos de Santos e de São Paulo. A reportagem tentou contato com os dois clubes, que não responderam ao questionamento sobre a nomeação. A interferência gerou mal-estar em várias equipes, que questionam os motivos por trás da insistência em ter na indicação dos clubes o que seria, de fato, uma terceira indicação da CBF. Além disso, acusam a entidade de estar atingindo um movimento de união de times em meio à crise causada pela pandemia do coronavírus.
De dois anos para cá, advogados e diretores jurídicos dos clubes formaram um movimento chamado 20-Jur, com reuniões periódicas e aproximação entre as principais equipes brasileiras. O movimento foi seguido por dirigentes de marketing e depois, pelos executivos financeiros, que formaram a Associação Brasileira de Executivos de Finanças do Futebol. Este grupo do mundo jurídico defende o critério técnico para esta eleição no STJD.
Os movimentos e o diálogo conduziram as agremiações à formação da Comissão Nacional de Clubes (CNC), que atua sob o guarda-chuva da CBF, mas com independência, reunindo representantes das principais equipes do país. A CNC comemorou no último mês uma de suas maiores vitórias ao fechar, sem participação externa, a venda direitos de transmissão internacionais do Brasileirão.
A CNC também vem mantendo reuniões frequentes sobre o futuro do futebol brasileiro, debatendo temas como redução de salário dos jogadores, suspensão de pagamentos dos direitos de transmissão dos Estaduais e Brasileirão por parte da Globo, além da retomada das atividades. A interferência política em uma escolha que é, legalmente, dos clubes, é vista como algo que pode minar o movimento de união.
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