Como pressão sobre Tite ameaçou chegada de Rodriguinho ao Corinthians
Resumo da notícia
- UOL Esporte conversou via vídeo com Rodriguinho, ex-Corinthians
- Hoje no Bahia, jogador relembrou a chegada dele ao Alvinegro
- "Eu estava assistindo ao jornal esportivo e falavam: 'Tite vai cair'"
- "Se chegasse outro treinador, não sei o que poderia acontecer"
- Rodriguinho também recorda a interferência externa na final de 2018
As conquistas recentes dos títulos da Copa Libertadores, Mundial de Clubes da Fifa — ambos em 2012 — e Recopa Sul-Americana (2013) não impediram que Tite, até então em alta com a torcida alvinegra, vivesse momentos de turbulência com o Corinthians em 2013. Uma sequência de oito jogos sem vitórias no mês de setembro daquele ano — incluindo uma derrota por 4 a 0 para a Portuguesa — fez o técnico balançar no cargo e, por pouco, não impediu uma contratação que, mais para frente, iria se tornar importante para outras glórias do clube, como as conquistas do Paulistão de 2017 e 2018 e, em especial, o Brasileirão de 2017.
"É interessante como Deus nos coloca no caminho certo das coisas", recorda Rodriguinho em entrevista ao UOL Esporte. Depois de iniciar a carreira no ABC e passar pelo Bragantino, o meio-campista conseguiu atrair os holofotes para si com grandes atuações pelo América-MG, clube que defendeu por mais de 100 jogos. Não só alguns clubes brasileiros viram em Rodriguinho um jogador em potencial, mas também países de fora como o Al-Sadd (Qatar).
"Eu estava no América-MG e chegou uma proposta de um time do Qatar, o Al-Sadd. Era uma proposta boa para o América-MG na época, e para mim também, maravilhosa. Ia ganhar muito bem, era mais novo [25 anos], fazer a minha vida lá fora e, depois, voltaria para o Brasil numa situação mais tranquila. Saí de uma concentração de um jogo pela Série B e fui para casa, porque já tinha chegado o fax com a proposta feita", conta o jogador, hoje no Bahia.
"O treinador, na época, era o Silas, que treinou o Grêmio. Ele foi até o meu quarto para gente conversar. Falei que a proposta tinha chegado, que queria me mudar para o Qatar e não tinha mais cabeça para jogar aquele jogo, precisava ir para casa arrumar minhas coisas para poder viajar. O jogo seria na terça, e a viagem na quinta. Falei que precisava de tempo para poder fazer isso, ele me liberou da concentração, e fui para casa. Só que árabe é meio complicado, muitas vezes eles têm alguns problemas, não cumprem algumas coisas."
A longa espera fez Rodriguinho desistir de seguir para o Qatar. Mas a cabeça não estava mais no América-MG. Com isso, o destino do meio-campista ficou incerto, até surgir o interesse do Corinthians. Uma conversa por telefone com o técnico Tite encheu Rodriguinho de esperança.
"Passei um mês em casa esperando, e eles não mandavam a passagem, não mandavam o visto, diminuíram a proposta para o América-MG, queriam diminuir a minha proposta. Começou toda essa confusão. Então, eu falei: 'Não quero mais ir para lá. Já cansei disso'. Voltei a treinar separado, porque também não tinha mais cabeça para jogar no América-MG. Aí apareceu a proposta do Corinthians, era o Tite o treinador", recorda o meio-campista.
"Eu lembro até hoje: o Tite perdeu uma partida para Portuguesa por 4 a 0, e falavam que ele iria embora do Corinthians. Eu estava assistindo ao jornal esportivo em casa e falavam: 'Tite vai cair, não vai cair'. Eu já entrei em desespero porque era ele que me queria lá, já tinha falado com ele, inclusive, por telefone. Se chegasse outro treinador, não sei o que poderia acontecer, já estava tudo certo com o Corinthians. E eu fiquei muito aflito em casa. Felizmente, os próprios jogadores o seguraram. Passou uma semana e eu cheguei ao Corinthians numa fase bem conturbada. Era uma equipe muito vencedora, mas que passava uma dificuldade naquele momento", completa.
A polêmica interferência externa: "juiz viu que errou e voltou atrás"
Em 2018, o Corinthians voltou a disputar uma final de Campeonato Paulista contra o arquirrival Palmeiras após quase 20 anos — a última havia sido em 1999, no famoso jogo das embaixadinhas de Edílson. E a partida entrou para a história. Não apenas pelo título emocionante e pela virada corintiana em pleno Allianz Parque (após derrota em Itaquera), mas também por um lance que até hoje gera debate: a suposta interferência externa e o pênalti de Ralf em cima de Dudu que a arbitragem acabou voltando atrás na metade do segundo tempo.
Rodriguinho foi um dos grandes personagens daquela partida. Foi dele, ainda na etapa inicial, o gol que levou a decisão para os pênaltis. Depois, foi a vez de Cássio brilhar e garantir o título. Mas e a interferência externa aconteceu?
"Eu acho que não. Eu acho que foi atitude mesmo do árbitro, junto com o quarto árbitro e os bandeiras. Ele viu que errou e voltou atrás em tempo recorde, na minha opinião. Nem com VAR ele voltaria atrás tão rápido. Eu acho que ele acertou, isso que importa. Ele não teve, na minha opinião, interferência externa de nenhuma forma", analisa Rodriguinho.
A polêmica tomou conta dos noticiários pós-jogo e nos dias que seguiram e acabou até, de certa forma, ofuscando um dos gols mais importantes da carreira de Rodriguinho. Mas nada que diminuísse sua alegria: "A gente fica um pouco bravo porque ofuscou um pouco o que aconteceu, mas a felicidade que a gente tinha, naquele momento, de ter cumprido objetivo, de ter dado o título ao Corinthians, de ter feito história, passa por cima de tudo isso".
VEJA OUTROS TRECHOS DA ENTREVISTA
UOL Esporte: Como está sendo essa quarentena para você? Está difícil ficar sem sair de casa?
Rodriguinho: É monótono. Ninguém está aguentando mais. 49 dias, 50, se eu não me engano, que estamos sem treino, sem futebol. A gente está tentando fazer o que dá dentro de casa. Correndo pelo condomínio, fazendo exercício em casa para gente tentar manter o que a gente puder de atividade para tentar, assim que o futebol voltar, voltar bem.
UOL Esporte: Os jogadores do Bahia seguem treinando de casa?
Rodriguinho: Sim, de casa. Tinha sido conversado uma possível volta na próxima segunda-feira [ontem, dia 11], mas acabou que não vai acontecer, ainda. Então, está todo mundo dentro de casa.
UOL Esporte: O que você pensa sobre os times que estão antecipando a volta aos treinos, como Inter e Grêmio? É precipitado? Vocês têm conversado sobre isso com o pessoal do Bahia?
Rodriguinho: A única conversa que tivemos foi essa. Estava marcada uma possível volta para o dia 11, acabou que não foi. Se eu não me engano, autorizado pelo Ministério da Saúde, apesar de todos os cuidados que o Bahia está providenciando para que possa se voltar às atividades. Mesmo assim, ainda acharam inviável voltar agora a treinar por causa dos riscos. Então, acho prematuro, realmente, você começar a querer forçar uma volta do futebol quando o país ainda está passando por dificuldades.
UOL Esporte: O que mais está fazendo falta nesta quarentena?
Rodriguinho: Por incrível que pareça, a gente tenta sempre fugir da rotina, mas aquela rotina, realmente, de poder encontrar amigos ou de trabalhar, isso acaba fazendo falta porque a gente passa muito tempo sem fazer nada. Então, acaba nos consumindo. A gente tem que procurar outras atividades para que possamos passar nossos dias mais tranquilos e serenos possíveis.
UOL Esporte: O que você está fazendo de bom? Muita série?
Rodriguinho: O jeito é esse. Ver série, live, ligar pros amigos, conversar com alguém para tentar distrair a cabeça. Cuidando do filho também. Tá novinho, com três meses.
UOL Esporte: E como está sendo essa experiência?
Rodriguinho: Está sendo legal. Vida diferente de pai, de estar em casa toda hora, é o primeiro filho. Então, todas as sensações novas, aquele amor que todo mundo fala que a gente sente por um filho já floresceu aqui, está muito legal poder acompanhar o crescimento dele e toda essa parte de bebê, de criança.
UOL Esporte: Por um lado acabou sendo bom?
Rodriguinho: Olhando o lado positivo das coisas, com essa parada sem futebol a gente está podendo aproveitar a família e, principalmente, para mim, neste momento.
UOL Esporte: A quem você é grato no futebol?
Rodriguinho: Tem alguns. Agradeço a todos os meus professores, primeiro, que foram os primeiros com 7, com 8, com 10 anos... Primeiro, futsal, depois, futebol de campo. Vamos lá: Helder, Cacau, Andrey Valério, depois, vamos pra Ernani Passaglia, que foi meu treinador no futsal também, já adulto. Tem um cara que eu sou muito grato também, Marcelo Veiga, que foi um dos meus primeiros treinadores profissionais, quando eu saí de Natal. Tem vários treinadores com quem eu trabalhei que me deram ajuda para crescer taticamente, fisicamente, pessoalmente.
Tite é um cara que, putz, eu vou agradecer pelo resto da minha vida. Esses aí que são menos conhecidos também são tão importantes quanto, até porque me tiraram de um lugar em que o futebol não é tão visto, até trilhar um caminho bom, até chegar a esse nível que nós estamos hoje. Então, são pessoas que eu agradeço de coração mesmo, de terem me ajudado a crescer para conseguir chegar num nível muito bom que é o sonho de tanta gente. Nós somos tão privilegiados de fazer uma coisa que nós gostamos e que tantas pessoas queriam fazer, e ainda ser bem remunerados. Isso aí ainda é o bônus da situação.
UOL Esporte: E a parte ruim do futebol? Eu vi uma entrevista sua falando da falta de privacidade. Você acha que ainda vale a pena, o lado bom acaba superando o lado ruim?
Rodriguinho: Lógico, sem dúvida. O lado bom supera, e muito. Por isso que todo mundo, quando é pequeno, sonha em ser jogador de futebol. Existem aqueles problemas, concentração, muitas viagens, você não parar em casa... Por exemplo, se o seu filho vai nascer e você está concentrado em outro Estado, não tem como você ver o nascimento do seu filho. Você perde um aniversário da sua mãe, não pode estar junto com as pessoas que você ama porque elas também têm as suas vidas. São coisas que são ônus, que a gente acaba tendo com a profissão, mas são pequenas perto da gratidão que nós temos por exercê-la
UOL Esporte: A falta de privacidade te incomoda muito?
Rodriguinho: Já incomodou mais, até porque eu era solteiro (risos). Aí, já me incomodou mais. Agora, como você é um cara mais família, mais tranquilo, então, não incomoda tanto, porque você fica mais em casa. Quando você quer sair para algum lugar, você, muitas vezes, não quer ser visto ou quer ficar de boa, na sua. Aí, incomoda um pouco. Muitas pessoas também perdem a noção da forma como falam com você. Alguns te agridem ou te abordam de uma forma negativa, quer trocar ideia como se fosse seu amigo de muitos anos. Isso acaba irritando um pouco, mas também são coisas que dá para tirar de letra, sem problema.
UOL Esporte: Você já teve medo alguma vez na sua carreira, por essa questão de torcida, de alguma ameaça?
Rodriguinho: Eu não sei nem se eu posso a usar expressão que eu ia usar aqui, não, mas tudo bem. Eu passei uns cagacinhos aí.
UOL Esporte: Qual foi a pior?
Rodriguinho: No Corinthians, a invasão de 2014. Essa aí foi uma das piores. Foi tensa. [cerca de cem torcedores invadiram o CT Joaquim Grava e promoveram um quebra-quebra]
UOL Esporte: Qual foi o maior jogo da sua carreira?
Rodriguinho: Agora é difícil. Eu acho que o jogo contra o São Paulo, a semifinal, em Itaquera, também foi um jogo espetacular para mim, porque a gente tava sendo eliminado da semi. No final do jogo, eu consegui fazer o gol nos acréscimos, aos 49, se eu não me engano, levando o jogo para os pênaltis. Até hoje, eu vejo vídeos da torcida naquele dia, que Itaquera estava daquele jeito, como sempre. Foi muito bonita também a festa que fizemos lá, foi incrível. Momentos que são inesquecíveis, para mim, no Corinthians, eu tenho vários. Por exemplo, torcida que foi a treino, quando era jogo contra Palmeiras ou São Paulo. Momentos que a gente desceu fora do estádio, em Itaquera, por exemplo, que passamos no meio da torcida para ir pro treino. Vários momentos assim que ficam na memória, realmente, daquele que tempo que foi muito bom.
UOL Esporte: Você acha que isso faz muita diferença? Essa questão de a torcida ir a treino, de vocês passarem no meio deles... Faz diferença na hora do jogo?
Rodriguinho: Eu acho que dá uma motivação a mais, sem dúvida. Deixa os guerreiros com sangue nos olhos mesmo. Parece que você está indo para guerra, realmente. Eu acho que isso faz muito bem ao atleta de alto nível para você poder se manter 100% focado.
UOL Esporte: Qual foi a derrota mais doída da tua carreira?
Rodriguinho: Rebaixamento, né. Rebaixamento é um momento muito triste que a gente passa, que eu não desejo para ninguém.
UOL Esporte: E algum em que você estava em campo?
Rodriguinho: Uma vez perdemos pro Audax uma semifinal, em Itaquera. Tava em campo, bati o pênalti, perdi também. Esse aí foi tenso, foi triste demais. A gente tava do lado da nossa torcida, nunca imaginava que o Corinthians ia perder, dentro de Itaquera, pra um time pequeno, que era o Audax, só que tinha um grande trabalho do Fernando Diniz, que todo mundo sabe, até hoje, que é um excelente treinador, e jogadores também que ele tinha, na época, e não eram reconhecidos, que são excelentes jogadores, como o Camacho, o Tchê Tchê, vários jogadores que tiveram grande destaque, Bruno Paulo. Então a gente perdeu, em Itaquera, eu acabei perdendo o pênalti. Foi triste, velho. A cobrança no Corinthians você sabe como é que é. É complicado.
UOL Esporte: Voltando um pouco do Corinthians, você citou o América-MG... Foram mais de 100 jogos, é muita coisa. O que você tem para falar da passagem pelo América-MG?
Rodriguinho: Cara, foi incrível. Me senti muito bem morando em Belo Horizonte, primeiro. O América-MG fez uma homenagem para mim pelos 100 jogos, trouxe minha família de Natal para ver o 100º jogo, com quadro, aquela coisa que se faz, mas nunca tinha acontecido comigo, até então. Eu me senti muito bem de ter sido reconhecido o trabalho que eu fiz no América-MG. Foi uma época muito boa da minha vida. Fiz muitos gols, muitas assistências. Uma época que me projetou pro futebol nacional. Times com mais expressão do que o América-MG se interessaram por mim. Eu tenho um carinho especial pela torcida. Então, foram momentos muito bons que passei também no América-MG.
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