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Rodriguinho sobre saída do Cruzeiro: "Bahia veio como solução, paga em dia"

Marcello De Vico

Do UOL, em Santos (SP)

13/05/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Hoje no Bahia, Rodriguinho concedeu entrevista exclusiva ao UOL Esporte
  • Meio-campista recordou o momento de tristeza com a queda do Cruzeiro...
  • ... e falou sobre a mudança para o Bahia: "veio como solução pra um problema"
  • "Um time competitivo, organizado, um time que paga em dia", elogiou

Depois de três anos e mais de 100 jogos com a camisa do América-MG, clube que o projetou para alçar voos maiores no Brasil, Rodriguinho voltou a Minas Gerais no início do ano passado para defender o Cruzeiro. Não teve sorte. Além de uma lesão na região lombar que o tirou de combate por boa parte da temporada 2019, o meio-campista ainda viu de perto o momento de maior tristeza do clube em quase 100 anos de história.

A má administração por parte da diretoria e o escândalo financeiro resultaram na primeira e única queda da Raposa para a segunda divisão do Brasileirão. Sem dinheiro, o Cruzeiro fez acordo com alguns jogadores — em especial os de maior salário — para minimizar as despesas, entre eles Rodriguinho, que rescindiu contrato em fevereiro e encontrou uma nova casa: o Bahia. Tudo começou com o contato de um antigo amigo da época de América-MG.

"Quem entrou em contato primeiro comigo foi o Claudinho [Cláudio Prates], auxiliar do Roger [Machado], que já trabalha no Bahia há alguns anos. Nós trabalhamos juntos no América-MG e temos uma amizade muito boa, inclusive. Ele me ligou e perguntou qual era minha situação, o que estava passando na minha cabeça, e me fez um convite. Disse que ia falar com o presidente [Guilherme Bellintani] para ver a possibilidade de eu vir pra cá, sabendo que seria uma negociação difícil por valores, por essas coisas", recorda o meio-campista em entrevista exclusiva ao UOL Esporte.

Rodriguinho comemora após marcar pelo Cruzeiro contra o Deportivo Lara - Thomás Santos/AGIF - Thomás Santos/AGIF
Imagem: Thomás Santos/AGIF

Do caos e da incerteza do Cruzeiro para um clube organizado, que paga as contas em dia e está em ascensão no futebol brasileiro. Assim foi a mudança de ares de Rodriguinho.

"Só que acabou que tudo casou, tudo deu certo, com a possibilidade de poder sair do Cruzeiro no momento que eles estão passando, com problemas financeiros, super conturbado, querendo cortar gastos... O Bahia veio como uma solução para um problema, e com todas as glórias do Bahia, podendo jogar num time competitivo, organizado, um time que paga em dia, tem as suas contas todas em dia, faturando muito bem e tendo crescimento", acrescenta Rodriguinho.

"Apostei no projeto do Bahia, de poder voltar a jogar bem, recuperar minha melhor fase e tentar buscar excelência no que eu sei fazer pra tentar ajudar o Bahia a chegar onde ele espera, quem sabe uma Sul-Americana, uma Copa do Nordeste, beliscar uma Libertadores no Brasileiro. Acho que são objetivos que cabem ao Bahia, uma equipe competitiva e que pode chegar".

"CT do Bahia não deve nada pra ninguém"

Rodriguinho durante treino do Bahia - Felipe Oliveira / EC Bahia - Felipe Oliveira / EC Bahia
Imagem: Felipe Oliveira / EC Bahia

Em janeiro deste ano, o Bahia inaugurou o Centro de Treinamento Evaristo de Macedo, mais conhecido como Cidade Tricolor. Com uma estrutura de dar inveja a muitos clubes, o novo CT ganhou elogios de Rodriguinho, que está com 32 anos e acumula passagens por ABC, Red Bull, América-MG, Corinthians, Grêmio, Al Sharjah (Emirados Árabes), Pyramids (Egito) e Cruzeiro.

"Não deve nada pra time nenhum. Eles conseguiram fazer um excelente projeto, construíram uma megaestrutura. Um CT muito bonito pra categoria de base, pra futebol feminino. Tem muito espaço, tem hotéis pra todo mundo. É uma estrutura muito boa mesmo que eles conseguiram implantar aqui, e eu fico feliz de estar fazendo parte disso, de poder ter todo o material pra se trabalhar; e os profissionais também que são maravilhosos. Quanto a isso, o Bahia não está devendo nem deixando a desejar a clube grande nenhum", completa.

Leia mais trechos da entrevista:

UOL Esporte: Indo para o Bahia, agora. Não deu nem tempo de jogar muito. Foram dois jogos...

Rodriguinho: Infelizmente. Esse ano, joguei dois pelo Cruzeiro, agora, pelo Bahia, dois também e o campeonato acabou parando. Tá difícil dar uma continuidade. Tô feliz pelo ambiente, por ter estreado aqui, no Bahia. Me sentindo muito bem das lesões que tive e podendo dar, agora, continuidade ao trabalho pra que possa voltar a melhor fase da minha carreira, se Deus quiser.

UOL Esporte: Bom é que você está com 100% de aproveitamento, ainda, né? Dois jogos, duas vitórias.

Rodriguinho: Verdade, verdade. Cheguei num momento bom, o time está bem. O time é muito competitivo. Então, venho pra somar e pra ajudar.

UOL Esporte: Você falou da lesão. Está 100%? Não está sentindo mais nada?

Rodriguinho: 100%, graças a Deus, livre das dores. Isso aí que me deixa mais feliz ainda.

Rodriguinho carrega a bola durante sua estreia pelo Bahia, em jogo contra o Confiança-SE, pela Copa do Nordeste - Felipe Oliveira / EC Bahia - Felipe Oliveira / EC Bahia
Imagem: Felipe Oliveira / EC Bahia

UOL Esporte: Como você vê a estrutura do Bahia?

Rodriguinho: Não deve nada pra time nenhum. Realmente, eles conseguiram fazer um excelente projeto de poder mudar pra lá. O único problema, um pouquinho, é a distância de Salvador. É um pouco longe. Então, a gente fica tendo que pegar esse trânsito todos os dias. Mas, assim, tranquilo também. A gente é acostumado a fazer isso. Então, não tem problema nenhum. Uma megaestrutura que eles construíram. Um CT muito bonito pra categoria de base, pra futebol feminino. Tem muito espaço, tem hotéis pra todo mundo. É uma estrutura muito boa mesmo que eles conseguiram implantar aqui, e eu fico feliz de estar fazendo parte disso, de poder ter todo o material pra se trabalhar, os profissionais também que são maravilhosos, lá. Quanto a isso, o Bahia não está devendo e nem deixando a desejar de clube grande nenhum.

UOL Esporte: Como foi a negociação com o Bahia? Você chegou a falar com o Roger Machado antes?

Rodriguinho: Na verdade, quem entrou em contato primeiro comigo foi o Claudinho, o auxiliar do Roger, que já trabalha no Bahia há alguns anos. Nós trabalhamos juntos no América-MG. O primeiro contato feito foi por ele. Nós temos uma amizade muito boa, inclusive. Ele me ligou e perguntou qual era a minha situação, o que tava se passando na minha cabeça e me fez um convite. Falou que iria falar com o presidente [Guilherme Bellintani] pra ver a possibilidade de poder vir pra cá, sabendo que seria uma negociação difícil por valores, por essas coisas. Só que acabou que tudo casou, tudo deu certo, o problema financeiro do Cruzeiro, que vinha se passando. Então, a possibilidade de poder sair do Cruzeiro no momento que eles tão passando super conturbado, querendo cortar gastos.

O Bahia veio como uma solução pra um problema e com todas as glórias do Bahia, podendo jogar num time competitivo, organizado, um time que paga em dia, tem as suas contas todas em dia, faturando muito bem e tendo crescimento. Então, apostei no projeto do Bahia de poder voltar a jogar bem, recuperar minha melhor fase e tentar buscar excelência do que eu sei fazer pra tentar ajudar o Bahia a chegar onde ele espera, quem sabe uma Sul-Americana, uma Copa do Nordeste, beliscar uma Libertadores no Brasileiro. Eu acho que são objetivos que cabem ao Bahia, que é uma equipe competitiva e que pode chegar.

UOL Esporte: Você está com 32 anos, e agora com filho pequeno... Chega de sair do Brasil? Você acha que vai encerrar a carreira no Brasil ou ainda pensa em ir para fora?

Rodriguinho: Olha, com a maturidade a gente vai vendo que ainda dá pra ir pra fora, sim. Chegando uma proposta boa, aquela velha situação de sempre. A gente sofre mais um pouquinho, sem problema. Dependendo do lugar, também. Tem que ser uma coisa muito bem analisada até por causa da família, também. Temos que ver todas essas situações pra que a parte financeira possa suprir essa parte social, de a sua família inteira poder estar bem. É possível, sim, mas não sei se seria o momento, agora. Mais pra frente, quem sabe, encerrando carreira, tudo bem.

Leonardo Silva do Atletico-MG disputa lance com Rodriguinho do America-MG durante empate sem gols - Pedro Vilela/Agif - Pedro Vilela/Agif
Imagem: Pedro Vilela/Agif

UOL Esporte: E Emirados e Egito, o que você tem de lembrança? Passou algum perrengue?

Rodriguinho: Vários, vários, não tem jeito. Quem vai de primeira viagem, meu amigo, pode esquecer que sempre vai ter alguma coisa pra dar uma quebrada, a não ser que você fale um inglês perfeito ou pelo menos que você saiba um regular, sei lá, um regular tá bom pra você se virar. No começo, eu não sabia de nada. Meu inglês era super básico, eu não conseguia formular uma frase, nem ir a restaurante pedir alguma coisa, eu não sabia nada. Então, foi difícil porque pros Emirados eu fui sozinho. Chegando lá, tive ajuda de alguns brasileiros que jogavam comigo ou eram da comissão técnica, mas sempre é muito difícil porque nesses lugares, Emirados e Egito, os nativos, os egípcios ou árabes, eles não falam tão bem o inglês também.

Você se complica muito na comunicação, por mais que você saiba inglês, você vai passar alguns perrengues. A vida, em si, é muito difícil, no começo, até você se adaptar, conseguir sair, saber os lugares onde você vai, poder pegar um carro e ir pra um certo lugar. Você passa muitos perrengues. Passei muito tempo trancado em casa, uns três, quatro meses pra poder aprender um pouco mais de inglês pra tentar sair no restaurante, pedir uma comida, tentar me alimentar bem naquele lugar, sem ser em casa. Pra se virar sozinho, pra conhecer os lugares, é um pouco complicado. A gente vai dando um jeitinho aqui, ali, vai dando umas quebradas, mas não tem jeito, isso é da vida.

UOL Esporte: No ano passado, você acabou não jogando tanto por causa da lesão. Como foi isso no Cruzeiro? Quando você acha que caiu a ficha de: "Acho que o Cruzeiro pode cair mesmo"?

Rodriguinho: Nunca tinha passado na minha cabeça que a gente ia passar um momento como esse. Eu acho que a ficha, realmente, caiu, pra mim, porque até então eu acreditava que a gente ia se livrar, mas a ficha caiu, pra mim, depois daquela derrota do jogo do CSA, se eu não me engano. Perdemos no Mineirão, 2 a 1, se eu não me engano. Ali foi que eu vi que, realmente, as coisas estavam se encaminhando pra isso. Na verdade, a gente já tinha tido alguns sinais antes. Estávamos ganhando o jogo da Chapecoense, lá na Arena Condá, por 1 a 0, levamos o gol aos 49 do segundo tempo. Perdemos dois pontos aí. Vários jogos, assim, a gente acabou se perdendo no final do jogo, perdendo pontos importantes, que iam fazer falta lá na frente. Isso aí estava dando sinais de que, realmente, a gente tava se encaminhando pra uma coisa negativa.

Ao mesmo tempo, existia todo aquele problema extracampo, que influenciava muito dentro de campo. As atitudes tanto dos atletas, como comissão. A diretoria, então, estava perdida, realmente. Estava muito complicado de você administrar uma situação muito difícil extracampo, que refletia dentro de campo. Se você pegar o nosso time no papel, a gente não teria time pra cair nunca, mas até pelo o que os caras tinham feito dois anos trás, três anos atrás, um ano atrás. Então, foi uma situação muito complexa de se explicar e de entender o que estava acontecendo e que refletiu negativamente muito forte dentro de campo e por isso que os atletas todos, nós somos culpados também, não conseguiram segurar a pressão, naquele momento. A gente acabou cedendo e caindo, infelizmente.

UOL Esporte: Como foi ver isso tudo de fora? Você acha que a diretoria do Cruzeiro também teve culpa pelo rebaixamento?

Rodriguinho: É até difícil falar isso, mas foi uma boa parte. Infelizmente, isso afetou muito dentro de campo, muito. Foi muito complicado lidar e exercer a sua profissão tranquilamente, sabendo que estava tudo pegando fogo ao redor. Não tem como você entrar em campo e... Acho que as coisas negativas da diretoria atraem aquela bola na trave. Isso existe muito no futebol de a gente falar: 'Time quando não paga, a bola bate na trave e saí. Se paga, bate na trave, bate nas costas do goleiro e entra'. Eu acho que foi bem por aí mesmo. As coisas negativas foram muito fortes pra dentro, tudo dava errado.

Meia Rodriguinho, em treinamento do Cruzeiro na Toca da Raposa - Vinnicius Silva/Cruzeiro - Vinnicius Silva/Cruzeiro
Imagem: Vinnicius Silva/Cruzeiro

UOL Esporte: O clima acaba ficando ruim entre os jogadores também?

Rodriguinho: Fica horrível. Entra falta de confiança, entram os problemas que a gente tem. Então, fica muito difícil de você lidar. Quando o time começa a perder muito, a torcida se irrita, já começa a xingar, a confiança tá lá embaixo. Então, pra você exercer bem a sua função de atleta você tem que tá muito confiante no que você vai fazer. Isso prejudica muito.

UOL Esporte: Você recebeu o que você tinha do Cruzeiro? Já teve algum acordo?

Rodriguinho: (Risos) Mais uma pergunta boa. A gente fez acordo. Fizemos um acordo pra eles pagarem apenas o que eles me deviam. Se eu não me engano, parcelamos várias vezes pra que eles possam ter uma condição de se recuperar e poder cumprir o acordo que foi feito.

UOL Esporte: Você gosta de assistir futebol? Você é daqueles jogadores que, quando estão em casa, ligam a TV? Você é meio viciado ou quando você está fora do trabalho esquece que tem futebol?

Rodriguinho: Eu gosto de ficar mais de boa, mas, de vez em quando, eu assisto, principalmente, jogos bons, grandes. Alguns amigos quando jogam, também, eu vejo, mas não sou aquele ligadão, de ficar vendo futebol o tempo inteiro, não. Tenho até um sogro que se deixar é 24 horas que ele assiste futebol. Aí, eu o deixo numa televisão, vou pra outra, faço outras coisas. Não dá pra ficar vendo futebol 24 horas, pelo menos pra mim, até porque eu trabalho com isso, fica difícil. Mas eu gosto de ver alguma coisa ou outra, sim.

UOL Esporte: Qual você acha que é o pior problema do futebol brasileiro, hoje?

Rodriguinho: Agora, vai ser o calendário. Já era o calendário antes. A gente está vendo, ainda mais com essa pandemia, que o pessoal não aguenta ficar sem futebol. É por isso que a TV coloca jogo pro ano inteiro. A gente não tem descanso. Isso era um problema que nós tínhamos, porque ninguém consegue descansar, jogo atrás de jogo. Acho que deveria ser mais parecido com a Europa, diminuir, enxugar um pouco o calendário pra que a gente pudesse jogar de semana em semana. Acho que seria mais confortável pra todos os atletas, em termos de lesão, pra você preservar um pouco mais o atleta e tê-lo em alto nível em todas as partidas que você disputar.

Como tem muito jogo quarta, domingo, segunda, quinta, sábado, ninguém mais nem sabe. O calendário tem jogos todos os dias. Então, é bem complicado pra gente conseguir se recuperar de uma partida pra outra, pra gente poder dar 100%. Muitas vezes, a gente tem que jogar com muitas dores, com algum machucado, porque, realmente, não dá tempo de a gente se recuperar. Por isso, também, que tem tantos jogadores, os elencos tão aumentando, mas aí os times que são maiores têm mais vantagem sobre isso, porque até os reservas têm qualidades, muitas vezes, melhores do que times medianos ou pequenos.

Rodriguinho em sua estreia pelo Bahia, contra o Confiança-SE, pela Copa do Nordeste - Felipe Oliveira / EC Bahia - Felipe Oliveira / EC Bahia
Imagem: Felipe Oliveira / EC Bahia

UOL Esporte: Você acha que deviam aproveitar este momento para igualar o calendário com o do futebol europeu?

Rodriguinho: Acho que seria legal, hein. Seria um formato diferente, pra gente mudar um pouco, mas eu acho que seria legal, seria interessante.

UOL Esporte: Você acha que o jogador acaba falando menos do que quer, hoje em dia, por medo do que vão falar?

Rodriguinho: Sem dúvida. Tem que ser o politicamente correto, não tem jeito. Ficou muito profissional, e as pessoas têm que tomar cuidado no que falam, no que fazem. Isso é óbvio. Todo mundo tem que tentar ser o mais perfeito possível, pra que não tenha divergências de opiniões sobre a sua pessoa.

UOL Esporte: É chato isso?

Rodriguinho: Às vezes, é. Eu sou muito espontâneo. Eu gosto de falar o que penso, mas, até tendo esse meu jeito, eu tenho que, muitas vezes, pensar muito no que eu vou falar pra não gerar desconforto em ninguém.