Torcidas antifascistas marcam ato contra Bolsonaro em várias capitais
Coletivos antifascistas de torcedores têm se articulado para várias manifestações contra o governo Bolsonaro (sem partido) e a favor da democracia no próximo domingo (7). Inspirados pelo protesto de corintianos, palmeirenses, são-paulinos e santistas anteontem na Av. Paulista, militantes de esquerda pretendem "disputar as ruas" com os apoiadores do presidente.
Manifestações puxadas ou apoiadas por esses coletivos já estão confirmadas no Rio de Janeiro, em Belo Horizonte e em Salvador. Em Porto Alegre, atos desse tipo têm acontecido há ao menos três semanas. Em São Paulo, membros da "Gaviões da Fiel" definiram na manhã de hoje que estarão nas ruas no domingo. Torcidas de outros estados conversam ao longo da semana para confirmar data e local de suas manifestações.
"Já há atos confirmados na maioria dos estados do Nordeste, as torcidas estão fechando apenas os detalhes", afirmou o contador Bruno Tito, de 33 anos, do "Bahia Antifa". Uma manifestação conjunta com outros cinco coletivos de futebol está marcada para o farol da Barra, no domingo.
Defensores do isolamento social, os grupos antifascistas viveram um dilema antes de decidir chamar seus membros para se aglomerarem nas ruas. Torcedores de outras capitais do país apontam as ações de corintianos como o incentivo que faltava para eles decidirem romper a quarentena.
"Já tínhamos sido convidados para participar de atos de rua, mas por causa da pandemia avaliamos que não era o caso de incentivar as pessoas a sair de casa", disse o jornalista Luan Toja, de 30 anos, da "Botafogo Antifascista". "Mas agora que o movimento se popularizou, reavaliamos e entendemos que é hora de pegar essa onda. Não podemos deixar as ruas dominadas pela extrema-direita."
Para tentar evitar o espalhamento do novo coronavírus, os militantes orientam seus companheiros a usar máscara e álcool em gel, além de tentar manter certa distância uns dos outros. Eles cogitam pedir ajuda de enfermeiros com termômetros para verificar se participantes estão com febre na entrada de cada manifestação. Mesmo assim, admitem que o risco de contaminação é alto.
"Somos a favor do isolamento social, mas combater o fascismo e as ameaças à democracia também são atividades essenciais", afirmou Leandro Bergamin, um programador de 42 anos membro do coletivo "Democracia Corinthiana". "Não podemos deixar que a pandemia sirva de desculpa pra que outros problemas sociais relacionados à má-gestão da coisa pública matem mais gente do que a covid-19."
Sem futebol, protestos saíram da micropolítica para a macro
Criados há menos de dez anos, esses coletivos são formados majoritariamente por torcedores de classe média, jovens e universitários. Entre suas bandeiras mais recorrentes, estão o combate à homofobia, ao machismo, ao racismo, à elitização do futebol e à atuação violenta da polícia militar em estádios. Eles costumam se reunir em páginas na internet e grupos de Whatsapp, e combater hábitos antigos da cultura das arquibancadas.
"Obviamente, fazer graça daquele time que foi para a série B e que talvez não volte é permitido e desejado", diz o texto de boas-vindas do grupo de Whatsapp do "Galo Antifa". "Contudo, NÃO será tolerado se referir a cruzeirenses como 'marias' pela misoginia que o termo carrega."
Com a eleição de Bolsonaro e o apelo do governo federal ao simbolismo extremista, os coletivos passaram a ganhar popularidade. E, com a pausa do futebol por causa da pandemia, deslocaram seu eixo de atuação da micropolítica da bola para a macropolítica nacional.
Um estudante universitário de 21 anos da "Galo Antifa" afirmou que seu grupo ganhou mais de 1500 seguidores no domingo, quando saiu por Belo Horizonte contra o governo. O ato não chegou a encontrar uma manifestação de bolsonarista no mesmo horário porque a Polícia Militar agiu desviando seus trajetos.
Também há registros de manifestações semelhantes em Porto Alegre e Curitiba. Na capital paranaense, um movimento antifascista e antirracista foi interrompido com bombas pela polícia no fim da noite de ontem depois que manifestantes depredaram a fachada de bancos e prédios públicos.
"O antifascismo é um movimento anticapitalista", afirma a jornalista Hevilla Wanderley do grupo "Belo Antifascista", do Botafogo de João Pessoa-PB. "Ele não está interessado apenas em derrubar o Bolsonaro. Queremos tirar o Bolsonaro e continuar lutando para botar o povo no poder."
No Nordeste, as torcidas antifascistas se articulam no grupo Tau (Torcidas Antifascistas Unidas) que incorporam às suas pautas elementos locais. Uma ação na final da última Copa do Nordeste, por exemplo, promoveu panfletagem para conscientizar o público contra o preconceito a nordestinos.
Hevilla afirma que seu grupo discute a possibilidade de chamar um ato em defesa da democracia para o próximo domingo. Aos domingos, tradicionalmente, um conjunto de bolsonaristas tem se reunido na frente de um quartel do exército em João Pessoa para pedir intervenção militar no país.
Hevilla diz não saber como evitar que seu grupo responda com violência caso seja agredido pelos militantes de direita.
"Não propagamos violência. Mas como boa marxista, trabalho com condições materiais", afirma. "O fascismo é violento. Quando os 300 de Brasília marcham com tochas na mão e dizem que estão armados, eles estão sendo violentos", afirma ela, em referência a um grupo extremistas que tem feito ações na capital. "Podemos ter diálogo com quem está em cima do muro, mas com fascista não se dialoga, se combate."
Chance de violência e insegurança limitam participação
Em abril, uma mulher que protestava contra atos antidemocráticos foi agredida por um homem em Porto Alegre. No domingo, a manifestação da esquerda na Paulista foi dispersada com bombas, depois que militantes trocaram provocações e agressões.
Em Copacabana, depois que um ato com torcedores do Flamengo foi interrompido pela polícia, um homem conhecido como "Capitão Léo", ex-presidente da "Torcida Jovem" rubro-negra, gravou um vídeo incitando seus colegas a "fuzilar bolsonaristas" no domingo que vem.
O vídeo foi criticado nas redes sociais pelo deputado Daniel Silveira (PSL), o mesmo que havia momentos antes ameaçado "descarregar" sua arma no peito de "um comunista safado" que ele encontrasse nos atos.
Em um encontro com apoiadores na manhã de ontem, o presidente Bolsonaro pediu para que seus defensores não se manifestem no domingo e evitem confrontos com oposicionistas.
Os episódios e os discursos de violência levam os ativistas antifas a limitarem suas convocações. O coletivo "Torcedores pela Democracia", que reúne oito grupos de esquerda no Rio, mantém reuniões durante a semana para definir a hora e o local de seu protesto no domingo. Uma imagem circulou pelo Whatsapp convidando a população a um ato em Copacabana, mas o grupo lançou uma nota negando que ela tenha partido de seus membros.
"Não sabemos de onde isso veio, mas não da gente", afirmou o servidor público Ronaldo Tavares, de 40 anos. "Estamos ainda discutindo o local e a forma do ato e temos essa dificuldade de garantir a segurança da manifestação. Essa galera é raivosa e não temos espaço democrático pra nos manifestar."
Organizadas maiores tentam se desvincular de protestos
Membros de torcidas organizadas tradicionais foram vistos em protestos pela democracia nos últimos fins de semana, mas a diretoria dessas agremiações tem vindo a público para negar que elas estejam convocando protestos.
A "Torcida Jovem" (Flamengo), a "Força Flu" (Fluminense), a "Força Jovem" (Vasco), a "Dragões da Real" (São Paulo) e a "Leões da TUF" (Fortaleza) foram algumas que publicaram notas para dizer que não participam como instituição dos protestos de rua.
"A torcida Dragões da Real não acredita em imposições antidemocráticas, por isso não orienta seus associados a seguirem partidos ou assumirem uma orientação política. Cada um é livre para fazer suas escolhas", informou a nota da segunda maior organizada do São Paulo.
A própria Gaviões da Fiel não tomou uma posição oficial em favor dos atos puxados por seu membros nos últimos fins de semana. A diretoria prefere focar suas ações em atividades assistenciais, como a doação de alimentos e materiais de limpeza, atitude compartilhada com outras organizadas.
O UOL Esporte apurou com pessoas em contato com a direção das agremiações que elas preferem não entrar no debate da política nacional para evitar represálias futuras e a criminalização de suas atividades.
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