Brasileiro virou 'Polvo' após brilhar contra CR7 e Tevez: "ficou até hoje"
Resumo da notícia
- Fernando Reges saiu do Brasil aos 19 anos e hoje é destaque do Sevilla
- Volante ex-Vila Nova já passou por Porto, Manchester City e Galatasaray
- Bicampeão da Liga Europa, ele já trabalhou com Pep Guardiola no City
- "Não tem tanta coisa diferente do que os técnicos portugueses tinham", diz
- Ainda no Porto, Fernando ganhou o apelido de "Polvo" após um jogo contra o United
Bicampeão da Liga Europa por Porto e Sevilla (seu atual clube), Fernando Reges está no Velho Continente há 13 anos. Ele deixou o Brasil cedo, aos 19, depois de dois anos jogando no profissional do Vila Nova-GO, e nunca mais voltou. Por lá, conquistou títulos por todos os clubes que passou, chegou a trabalhar com Pep Guardiola no Manchester City e ganhou um apelido curioso: Polvo.
A alcunha surgiu em 2009, depois de uma partida épica dele e do Porto contra o Manchester United de Cristiano Ronaldo, Wayne Rooney e Carlitos Tevez, sob o comando do lendário Alex Ferguson. Era o jogo de ida das quartas de final da Liga dos Campeões, no Old Trafford, e o time português, então comandado por Jesualdo Ferreira, ex-Santos, arrancou um empate por 2 a 2.
Fernando Reges ganhou os noticiários de Portugal pela boa atuação na partida, com direito a desarmes nos principais destaques dos Red Devils. O apelido pegou e não saiu mais.
"Foi a torcida do Porto, logo quando eu cheguei. Estávamos fazendo uma temporada muito boa, fomos campeões do Campeonato [Português] e da Taça de Portugal. E também fomos muito bem na Champions League; acabamos sendo eliminados pelo Manchester United nas quartas, mas conseguimos fazer um jogo espetacular na primeira mão, no campo do United, 2 a 2 [jogo de volta, em Portugal, foi 1 a 0 para os ingleses]", conta em entrevista exclusiva ao UOL Esporte que pode ser vista no vídeo acima.
"E foi quando o pessoal do Porto começou a me chamar de Polvo por ter roubado a bola de tantos jogadores de tanta qualidade como Cristiano Ronaldo, Rooney, Tevez, e começaram a me chamar de Polvo porque tinha muitas pernas, estava em todos os lados, roubava muitas bolas, e ficou até hoje. No Galatasaray, no Manchester City, e aqui em Sevilla é igual", acrescenta o volante de 33 anos.
Pep Guardiola x técnicos portugueses
Fernando Reges jogou seis temporadas pelo Porto até chegar ao Manchester City, na metade de 2015. Primeiro, trabalhou com Manuel Pellegrini. Depois, foi a vez de ser comandado pelo técnico que hoje é considerado por muitos o melhor do mundo: Pep Guardiola. Mas se com o chileno Fernando era titular, o mesmo não aconteceu com o ainda treinador dos Citizens.
"Eu tinha mais um ano de contrato [quando Guardiola chegou ao City]. Só que joguei pouco com ele, tive poucas possibilidades, e aí cheguei nas pessoas que trabalhavam comigo e disse: 'sei que tenho mais um ano de contrato, mas preciso jogar mais', e foi quando surgiu a Turquia, porque todos os outros clubes que me queriam, na Itália, na Espanha, queriam por empréstimo. Só que como eu só tinha mais um ano de contrato, o City não queria deixar. Mas eu queria sair pra jogar. E foi quando surgiu a possibilidade de o Galatasaray me comprar", conta Fernando.
O brasileiro reconhece as qualidades de Pep, mas também faz uma ressalva: "É um treinador diferenciado. Quando você vê um treinador e todo mundo fala dele, é porque algo diferente ele tem. E quando a gente via o Barcelona jogar, a gente falava 'o que esse cara tem que os outros não têm?'. Aí comecei a trabalhar com ele e comecei a prestar atenção, né? Estou trabalhando com o melhor treinador do mundo, então vou ver o que ele faz diferença. Ele tem muitas coisas boas, só que não tem tanta coisa diferente do que os técnicos portugueses tinham".
"O único detalhe é que ele trabalha no detalhe, ele preza pelos mínimos detalhes possíveis. Mesmo no treinamento, ele quer que você faça um passe muito bem feito, quer cobrar tudo que você vai fazer, e essas coisas fazem muita diferença. Então o time dele está sempre por cima em relação aos outros", acrescenta.
Jesualdo: "excelente, não teve tempo no Santos"
Demitido do Santos no início de agosto, Jesualdo Ferreira foi outro técnico a fazer parte da carreira de Fernando. E o português deixou boa impressão no volante, que viu falta de paciência do Santos com o ex-treinador do Porto.
"Meu primeiro ano no Porto foi com o Jesualdo. Eu, quando o Santos falou que ia contratar o Jesualdo, fiquei muito feliz. Falei: 'vai ser um treinador que vai mostrar que é muito bom', porque ele realmente é muito bom. Ele me ajudou bastante. Quando cheguei à Europa, cheguei totalmente cru em termos táticos. No Brasil você aprende muitas coisas técnicas, mas, em termos táticos, o Brasil perde muito pra Europa", afirma.
"E aprendi bastante com ele, um treinador que tem paciência com os jovens, ajuda bastante, então pensei que seria um treinador que faria uma revolução muito grande no Santos, até porque o Santos aposta nos jovens. Mas, infelizmente, não teve tempo pra isso e pelo que eu vi nas redes sociais estava com problemas financeiros e acabaram não tendo paciência com ele. Mas ele é um excelente treinador", opina Fernando Reges.
Segundo ele, a falta de paciência dos clubes brasileiros com seus treinadores é um assunto frequentemente abordado nos noticiários portugueses.
"Em Portugal fala-se muito disso. Todo treinador precisa de tempo, para adaptar o time, conhecer os jogadores... Ele chega ao Santos e precisa de um tempo de adaptação, conhecer o futebol brasileiro, conhecer os jogadores, e em seis, sete meses, é impossível fazer isso. Teria que ter, no mínimo, dois anos, pra poder colocar seu futebol, sua filosofia em prática. Os portugueses, quando falam do Brasil, dizem isso: que tem muito talento, mas que não têm paciência com os treinadores. Aí fica muito difícil trabalhar assim", analisa.
Procurado pelo Palmeiras
Desde que deixou o Brasil, em 2007, Fernando Reges diz ter sido procurado por apenas um time para retornar ao país: o Palmeiras, que na época tinha Alexandre Mattos como gerente de futebol. Mas a ideia de deixar o futebol europeu não passou pela cabeça do volante.
"Depois que eu saí do Brasil, chance quase zero de voltar. Em todos clubes que passei, sempre tive possibilidade de ir pra outro clube na Europa. A última ligação que eu tive foi do Alexandre Mattos, quando estava no Palmeiras. Ele me perguntou se eu queria regressar ao Brasil, disse que naquele momento não queria, porque eu tinha outras opções, e nunca mais tive algum tipo de contato pra voltar ao Brasil", recorda Fernando, que ainda explica os motivos que o fazem continuar, ao menos por enquanto, atuando em solo europeu.
"Já vamos pra 13 anos [de Europa], e agora a gente quer ficar sempre aqui. Pra mim o Brasil é o melhor país do mundo, em termos de tudo. O problema do Brasil é que você não tem a segurança que tem na Europa, e a segurança é o mais importante, ainda mais quando você tem mais filhos. Então, essas coisas você pensa duas vezes... E você fala: 'melhor eu ficar aqui porque tenho meus filhos, posso ter um problema'... Claro que não acontece em todos os lugares, mas pode acontecer. Aqui na Europa também pode acontecer, mas é muito mais difícil", diz.
"Fora a instabilidade que o país gera. É muita confusão política, coisas que a gente não queria passar, e minha família sente muito com isso. A gente tem estabilidade aqui, mas às vezes pensa 'vou voltar, quero estar perto da minha família', o Brasil é um país espetacular, eu posso comer bem, tem um clima espetacular, praias espetaculares, o povo é muito bom, não tem povo melhor, mas a gente pensa em segurança e acaba falando 'não, vou ficar aqui mesmo.'"
Festa sem torcida na Liga Europa
Fernando já havia levantado a taça da Liga Europa pelo Porto, em 2010/11, após vitória na decisão contra o Braga, também de Portugal. Dessa vez, porém, a festa no campo não contou com um ingrediente muito importante: a torcida, uma vez que, devido à pandemia, a emocionante vitória sobre a Inter de Milão na Alemanha foi disputada com portões fechados.
"Esse que é o pior. Você ganhar um título tão importante e não poder comemorar, ter torcida no momento", brinca. "Mas nossa equipe estava tão unida, procurando tanto esse título, que depois fizemos uma festa tremenda entre a gente ali no vestiário, no hotel... Era uma coisa que a gente sabia que não poderia escapar, então fizemos a nossa própria comemoração", diz.
Além da Inter de Milão, o Sevilla precisou desbancar times de tradição ao longo do mata-mata para chegar à conquista, como a Roma (oitavas) e o Manchester United (semi).
"É um título muito difícil. Se você olhar a Liga Europa, nas fases finais jogamos contra quatro equipes, e as três eram favoritas contra a gente: Roma, Manchester e Inter de Milão. A única equipe que a gente era supostamente favorito era o Wolverhampton [quartas], então é uma competição muito difícil, com grandes equipes, então é um título muito importante", completa o jogador, que tem mais dois anos de contrato com o Sevilla.
Hoje, às 16h (de Brasília), Fernando Reges entra em campo pela Supercopa da Europa: seu time, o Sevilla, campeão da Liga Europa, encara o Bayern de Munique, vencedor da última Liga dos Campeões, na Arena Puskas, na Hungria.
VEJA OUTROS TRECHOS DA ENTREVISTA:
Seleção brasileira
Só tive chance na base. Fui convocado em 2007 pra jogar o Sul-Americano, joguei, ganhamos, mas a partir daí não tive nenhuma chance, nenhuma possibilidade, nenhuma ligação sobre a seleção. Claro que é o sonho de qualquer jogador tentar chegar à seleção, mas não tive essa possibilidade, acho por ter saído muito novo do Brasil e não ser tão visto no futebol brasileiro, porque saí com apenas 19 anos jogando apenas duas edições da Série B, ninguém me conhecia e acabei ficando sem esse reconhecimento. Acho que o que também pode ter sido prejudicial é que eu fiquei muito tempo no futebol português, porque não é tão visto no Brasil como o espanhol, o inglês. Talvez se eu tivesse saído mais cedo pro futebol espanhol ou inglês seria mais bem visto e podia ter essa possibilidade.
Chance mais real foi com Felipão
A possibilidade mais próxima que eu senti que poderia ter algo de seleção foi antes da Copa de 2014, era o Luiz Felipe Scolari. Ele esteve em Portugal e a imprensa falava muito de mim, ele gostava muito do meu futebol e eles começaram e especular o meu nome. Foi também quando surgiu a possibilidade de jogar na seleção portuguesa, e perguntaram pro Felipão se eu poderia ir pra seleção portuguesa, e ele disse que era uma escolha minha. E eu optei: se tiver a possibilidade de ir pra seleção portuguesa, eu vou, porque é um país que me acolheu, um país que eu amo, que me ajudou em todos os aspectos, e se tivesse a possibilidade, eu ia. Mas eu não pude jogar pela seleção portuguesa porque já tinha jogado pela seleção brasileira sub-20. Se eu tivesse dupla nacionalidade na época, aí sim eu poderia escolher.
Ida muito cedo para a Europa
Foi muito difícil. Um menino que saiu de Alto Paraíso (GO), que não tem clube, uma cidade que vive do turismo, não tem nada a ver com futebol, e saí aos 15 anos pra conseguir fazer teste, fiquei seis meses no Gama, depois fui para o Vila Nova, fiz um teste e acabei ficando, em 2004. Eu joguei no juvenil e, no final de 2004, eu já me profissionalizei, e fui diretamente para o profissional. Então foi uma carreira totalmente diferente, porque eu não esperava chegar tão rápido no profissional, e não tive base. Foi por teste e cheguei ao profissional muito rápido, apenas 10 meses no juvenil, diretamente ao profissional. Fiquei apenas dois anos no Vila Nova, e em 2007 já fui vendido para o Porto. Minha carreira sempre foi muito regada de coisa sobrenatural. Sempre digo que é Jesus na minha vida. Claro que a gente tem que trabalhar, fazer nossa parte, mas também precisamos daquela ajuda de Deus.
Ajuda do irmão com adaptação
Eu tive muitas dificuldades. Primeiro por ter saído muito rápido de Alto Paraíso e em quatro anos já estava na Europa. Você chega numa cidade com 19 anos, sem conhecer ninguém, vivendo sozinho, e de repente você pega o inverno europeu... Em Goiânia não tem inverno nenhum, é calor o tempo todo [risos]. E foi uma diferença muito grande. Apesar da língua ser igual, quando você chega em Portugal você não entende os portugueses, é complicado. Foi uma adaptação muito complicada. Meu irmão teve uma parcela muito grande em poder me ajudar. Jogador brasileiro sofre muito, quando chega na Europa você tem que passar por essa etapa, que é muito complicada, até porque, quando você tem 19 anos, você quer estar com os amigos, quer sair, fazer algo diferente, então tive que abdicar disso e pensar só em futebol. Mas foi uma adaptação muito complicada.
Primeiro eu fui, e depois de três meses ele chegou. Só que em dez dias ele já queria ir embora, 'aqui eu não fico' [risos]. E ele é só dois anos mais velho do que eu. E minha mãe falando com ele no telefone acabou o convencendo de ficar comigo, e passados seis meses eu falei: 'ó, vamos voltar para o Brasil', tem outros clubes que eu posso ir lá, porque eu estava emprestado, e ele: 'não, nós ficamos, agora vamos até o final'. Ele me ajudou bastante. Talvez se ele não tivesse comigo nessa época eu tivesse desistido. Foi uma mão direita que me deu força pra seguir.
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