Neto pagou faculdade e ajudou ex-zagueiro a combater vício em cocaína
O ex-zagueiro Alceu virou amigo do ex-atacante Neto quando os dois davam seus primeiros passos no Guarani, de Campinas. A vida levou os juvenis a trilhar caminhos diferentes: enquanto Neto se tornou ídolo do Corinthians e hoje é uma das vozes mais influentes da crônica esportiva nacional, Alceu passa seus dias em uma clínica de recuperação de dependentes químicos no litoral de Santa Catarina.
"Estou limpo há três anos oito meses e três dias", contou o ex-zagueiro, com passagens pelo Avaí e Athletico-PR, ao UOL Esporte, há duas semanas. "Só por hoje." Os antigos amigos se encontraram pela última vez na sede da TV Bandeirantes, há sete anos, quando Neto deu R$ 150 para Alceu voltar para casa, em Santa Catarina.
Alceu Pereira Júnior lembra que tinha feito a viagem até a capital paulista durante uma crise, para pedir dinheiro ao amigo, que sempre o ajudou em momentos de necessidade.
"Cheguei na frente da Bandeirantes e pedi para falar com o Neto. Eu fui fazendo uso de drogas durante toda a viagem. Era claro e visível o meu estado. Só no meu físico, na minha fisionomia, já dava pra perceber. O Neto desceu, olhou bem nos meus olhos, e falou: 'Sabe a vontade que eu tenho agora, seu filho da p***?'"
O apresentador se mostrava indignado com a recaída do amigo, que costumava frequentar sua casa e conviver com sua família. Alceu conta que Neto foi a única pessoa do futebol que lhe estendeu a mão quando todas as outras lhe viraram as costas.
"Ele me ajudou a comprar o meu carro. Eu ia duas vezes por ano a São Paulo e ficava na casa dele. Ele pagava passagem de avião pra mim. Eu viajava pra Campinas com ele e com a esposa. Ele pedia para o motorista me levar pra fazer compras, dava dinheiro pra eu comprar coisas pra minha filha. Ele me deu dinheiro pra eu levar as minhas filhas no [parque] Beto Carrero, me ajudou a montar uma escolinha de futebol, me mandou 40 bolas novas. Conhecidos dele no Rio Grande do Sul me mandavam material esportivo..."
O comentarista também fez questão de pagar a faculdade de psicologia para que o amigo tivesse uma profissão e ganhasse uma nova perspectiva de vida, longe da dependência química. Mas o vício em cocaína fez Alceu largar o curso antes de concluí-lo.
"O Neto perguntou: 'Alceu, você tem um sonho na sua vida? Qual que é o teu sonho?' Eu falei que era fazer faculdade, ter conhecimento. A minha família toda fez faculdade, o único que não conseguiu fui eu. Ele perguntou qual faculdade eu gostaria. Nessa época, eu trabalhava em uma comunidade terapêutica, e disse que queria psicologia. Ele falou: 'Então você vai lá, faz o vestibular e, enquanto eu tiver condições na minha vida, a tua faculdade eu pago.' E foi assim que aconteceu. Eu fiz o vestibular, passei e ingressei. Recaí no final do meu sexto semestre e larguei sem me formar."
O ex-zagueiro chegou a ser preso por furtar uma jaqueta em uma loja e teve o carro que Neto ajudou a comprar apreendido. A decepção que causou ao amigo que investiu tanto em sua recuperação provocam lágrimas nos olhos de Alceu, que se emociona ao comentar a última vez que viu Neto.
"Ele me perguntou se eu tinha dinheiro para ir embora, e eu disse que não. Ele me levou até o carro dele, pegou a carteira e me deu R$ 150. Com ironia, disse: 'Ó, dá um monte de pedrinha [de crack] aí'. Eu nunca mais falei com ele. Ele me ajudou, não passou a mão na minha cabeça, não foi conivente com o meu erro. Isso só me fez admirar ainda mais a pessoa que ele é e aumentar a gratidão que eu tenho por ele até hoje. Mesmo ele não falando comigo, não tiro a razão dele."
Alceu se internou e se sente recuperado, pelo menos momentaneamente. Depois de resolver seus problemas com a Justiça e quitar boa parte de suas dívidas, se dedica a ajudar outros dependentes químicos a combater o vício. Ele, que começou a usar cocaína com antigos companheiros do Athletico-PR, é voluntário na comunidade terapêutica Instituto Passo a Passo no Caminho.
A casa abriga cerca de 30 homens em situação de rua e com dependência química em Palhoça, no litoral catarinense.
"Dou palestras, recebo os acolhidos, divido com eles a experiência que eu tive na ativa e hoje em recuperação. Sou adicto [viciado] desde os meus 11 anos. Conheci a cocaína em 1992, com 27 pra 28 anos. No início era esporádico. Hoje, depois de começar a frequentar os Narcóticos Anônimos e depois de ser internado, tenho entendimento do que é essa doença", conta Alceu, que hoje tem 55 anos e valoriza as pequenas conquistas de sua nova vida.
"O meu nome está limpo. Hoje eu consegui comprar uma televisão pra mim. Eu valorizo meu estado hoje, o fato de eu estar limpo. Tudo isso pra mim é uma conquista. Quem sabe se a gente reativar essa amizade... seria exemplar pra realmente verem que a recuperação realmente funciona. Eu estando bem, as pessoas que gostam de mim vão querer estar próximo de mim."
O ex-zagueiro espera que um dia possa voltar a encontrar o comentarista da Band, para quem gostaria de pedir perdão pelos desapontamentos que causou.
"Eu queria dizer para o Neto que eu amo ele. Ele é uma pessoa importante na minha vida. Que eu o amo muito e quero o melhor pra ele e pra família dele. Desejo tudo de melhor. Ele foi bom pra mim e sei que ele é bom pra muitas pessoas."
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