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Vasco vira soberano na areia em realidade paralela à do glamour do campo

Jogadores do Vasco erguem troféu que representa o tricampeonato brasileiro de Beach Soccer - Flickr da CBSB / Bruno Maia/NB Photopress
Jogadores do Vasco erguem troféu que representa o tricampeonato brasileiro de Beach Soccer Imagem: Flickr da CBSB / Bruno Maia/NB Photopress

Bruno Braz

Do UOL, no Rio de Janeiro

25/11/2020 04h00

Tricampeão brasileiro, tricampeão da Libertadores e campeão do Mundialito, além de outros diversos títulos ao longo de sua trajetória. Enquanto no campo as coisas não vão bem há algum tempo, na areia o Vasco vive um período de glórias e soberania, mesmo em uma realidade paralela à dos jogadores que atuam nos gramados.

A começar pela remuneração, os atletas do Beach Soccer sequer recebem salários do clube. Todos os custos para as competições são oriundos dos patrocinadores particulares captados pela equipe.

Na fase de preparação para o Campeonato Brasileiro, por exemplo, o elenco ainda enfrentou problemas com uniformes, já que o Vasco trocou de fornecedor — de Diadora para Kappa — e o time de futebol de areia teve dificuldades para recebê-los, o que fez com que treinassem com shorts da antiga marca.

Agora, com mais um título nacional conquistado no último domingo (22), em vitória nos pênaltis sobre o Sampaio Corrêa, o Trem Bala da Areia espera um suporte maior de investidores.

"Da forma que tem repercutido, espero que isso venha influenciar de uma forma positiva, até porque muitas pessoas não sabem da nossa realidade, nosso desafio sem uniformes antes do Brasileiro. Para não apontar ninguém, a gente sabe que o Vasco não deu [os uniformes], mas para o Vasco liberar tem uma pessoa encarregada disso. Depois, conseguiram a camisa da Kappa, mas o short de treino era da Diadora. Temos que ter um mínimo, mas como o grupo é bem forte, os mais experientes sempre reuniam a galera e diziam: 'a gente sabe que vai ser difícil, que está complicado, está feio, mas vamos continuar nossa caminhada, treinando, que Papai do Céu tem o melhor lá na frente", revelou Catarino, um dos destaques da equipe e também jogador da seleção brasileira da modalidade, em entrevista ao UOL Esporte.

Toda a parte de logística, estrutura e captação de recursos para a equipe fica por conta do coordenador Cesinha, ex-jogador de Beach Soccer e multi campeão pelo Vasco na modalidade.

"O que o clube faz é dar uniforme de jogo e treino, o resto é tudo por minha conta. Arrumar patrocínio, procurar hotel, lugar de alimentação, nossa área medica...", explicou o coordenador.

Mesmo com todas as adversidades, Catarino enalteceu a conquista e aproveitou também para provocar o rival Flamengo, que foi superado nas semifinais com uma vitória de virada, nos últimos minutos, com gol do goleiro Rafa Padilha. "Só nesse campeonato tivemos três títulos: vencemos as dificuldades extracampo, o Flamengo na semifinal, e o Campeonato Brasileiro"

Jogadores do Vasco Beach Soccer treinam com shorts da Diadora, antiga fornecedora de material esportivo - Divulgação / Instagram do Vasco Beach Soccer - Divulgação / Instagram do Vasco Beach Soccer
Jogadores do Vasco Beach Soccer treinam com shorts da Diadora, antiga fornecedora de material esportivo
Imagem: Divulgação / Instagram do Vasco Beach Soccer

Grana só na Europa

A realidade do jogador de Beach Soccer por aqui ainda é dura. Por conta disso, a única maneira de ser melhor remunerado é ir para a Europa, onde ficam de três a quatro meses antes de retornar ao Brasil. Catarino, por exemplo, já atuou na Itália, Rússia e Portugal.

Outros profissionais também foram integrados à Marinha, algo que lhes dá mais estabilidade na carreira.

"Aqui não temos salário, mas muitas vezes viajamos para a Europa, fazemos um pé-de-meia, e aí depois formamos esse 'time de amigos', de torcedores do Vasco. Juntamos o útil ao agradável", explicou Catarino.

Entrosamento é o segredo do sucesso do Vasco

Elenco do Vasco Beach Soccer atua junto há muito tempo e carrega um entrosamento de anos - Flickr do CBSB / Bruno Maia/NB Photopress - Flickr do CBSB / Bruno Maia/NB Photopress
Elenco do Vasco Beach Soccer atua junto há muito tempo e carrega um entrosamento de anos
Imagem: Flickr do CBSB / Bruno Maia/NB Photopress

Mas afinal de contas, qual o segredo para o Vasco estar tão soberano no Beach Soccer? Segundo Cesinha, o entrosamento é o mais importante, já que a base do time atua junta há anos.

"Nesse grupo, o que está há menos tempo é o Rafa Padilha [goleiro], que tem cinco anos de Vasco. Agora já estamos começando a mesclar com jogadores de 19, 20 anos... Estamos incorporando ao elenco, mas é um elenco que tem um entrosamento muito grande, já se conhecem há bastante tempo. O time tinha o Jorginho, eu, Bruno Xavier, Bueno... Alguns saíram, outros foram parando de jogar e entrou essa geração", explicou o coordenador.

Muitos desta nova geração se conhecem desde os tempos de "Colorado", o tradicional time de futebol de areia para 11 que atua nas praias do Rio de Janeiro.

"Sempre procuro dizer que o extracampo faz muita diferença, e isso também ajuda quando se tem qualidade. O Colorado é um time de tradição da praia e jogávamos todos juntos. No Vasco, com o passar do tempo, sempre mantivemos a nossa base", destacou.

A boa campanha no Campeonato Brasileiro fez com que o Vasco tivesse seis jogadores convocados para a seleção brasileira: Rafa Padilha, Catarino, Jordan, Benjamin Jr, Mauricinho e Lucão.

Na competição, Rafa Padilha foi eleito o melhor goleiro e Lucão foi o artilheiro ao lado de Datinha, do Sampaio Corrêa.

Objetivo de internacionalizar equipe

Jogadores do Vasco fazem a tradicional comemoração do "Trem Bala da Areia", como cantam os torcedores - Flickr da CBSB / Bruno Maia/NB Photopress - Flickr da CBSB / Bruno Maia/NB Photopress
Jogadores do Vasco fazem a tradicional comemoração do "Trem Bala da Areia", como cantam os torcedores
Imagem: Flickr da CBSB / Bruno Maia/NB Photopress

Soberano no Brasil, o Vasco quer agora expandir suas conquistas mundo a fora. Detentor de um Mundialito, em 2011, a equipe deseja novos títulos em outros continentes a partir do ano que vem.

"É um desejo meu, como coordenador, internacionalizar nosso time. Além de jogar pela América do Sul, na Libertadores ,tentaremos jogar ano que vem mais umas duas competições na Europa e América do Norte. Tem o Mundialito, que é um sonho antigo nosso. Tentaremos o bicampeonato, iria coroar o ciclo desses guerreiros, esses homens de caráter, de bem e apaixonados pelo Vasco", destacou Cesinha.

O coordenador da equipe admite que o momento ruim do Vasco nos gramados acaba refletindo na areia de alguma forma, mas mesmo assim a equipe tem conseguido superar as adversidades e dar alegrias à torcida:

"Ficamos tristes com o momento do campo, reflete na gente, com certeza. Quando o time está bem, está disputando títulos, para nós as coisas ficam mais fáceis também, mas tentamos dar o nosso melhor. Trabalhamos diariamente sempre em prol do melhor para o Vasco. Nossa gratidão, o que nos faz treinar bastante e conquistar títulos, é a nossa torcida, que tem um carinho muito grande por nós. Então queremos sempre retribuir esse carinho entregando vitórias e títulos. Isso é o que nos move todo dia a treinar e jogar".

Cria do Chapéu Mangueira, Catarino quase desistiu da carreira

Do atual elenco, Catarino é um dos jogadores mais identificados com o torcedor, fruto de sua entrega e paixão genuína pelo Vasco. Cria do Chapéu Mangueira, comunidade na zona sul do Rio de Janeiro, o atleta de 30 anos começou no campo, mas pela proximidade com a praia, já atuava também na areia, só que no futebol de 11.

Após ser descoberto pelo lendário Júnior Negão, multi campeão com a seleção brasileira da modalidade, ele passou a atuar no Vasco, mas sentiu muitas dificuldades com as adaptações às regras do Beach Soccer e, por pouco, não desistiu, principalmente após ser cortado de uma competição.

Jogador do Vasco e da seleção, Catarino também é terceiro sargento da Marinha e faz faculdade de Gestão Financeira - Reprodução / Instagram @catarino_oficial - Reprodução / Instagram @catarino_oficial
Jogador do Vasco e da seleção, Catarino também é 3º sargento da Marinha e faz faculdade de Gestão Financeira
Imagem: Reprodução / Instagram @catarino_oficial

"No final de 2010, comecei a treinar e jogar. Vi que tinha condições, oportunidades e continuei, até que teve um desafio na arena entre Vasco e Botafogo, levaram 11 jogadores e me deixaram de fora. Era meu sonho jogar naquela arena, sempre fui lá acompanhar quando era criança. Depois desse corte, eu decidi largar o esporte, mas um amigo me mandou uma mensagem que mexeu comigo, me incentivando, dizendo que tinha sido 'panela'. Então, decidi que, na segunda-feira, eu ia ser o primeiro a chegar e o último a sair do treino, até chegar o momento que eu mesmo ia selecionar o time que eu iria jogar. Acabou que fiz tudo o que falei que iria fazer, e as coisas começaram a acontecer", destacou.

Na sequência, acabou ganhando visibilidade na disputa de um Mundialito onde fez um golaço de falta sobre o Corinthians — que era a base da seleção — e a pintura foi narrada pelo histórico apresentador da Globo Léo Baptista durante a transmissão de um jogo do Vasco do campo. "Depois dali, fui para a Itália, onde fui campeão italiano, e, em 2013, fui convocado pela primeira vez para a seleção brasileira", disse.

Por conta de sua carreira vitoriosa, Catarino não mora mais na comunidade do Chapéu Mangueira e hoje vive na Tijuca, bairro de classe média da Zona Norte do Rio de Janeiro. Além disso, é terceiro sargento da Marinha do Brasil e cursa faculdade de Gestão Financeira.

"O esporte muda vidas. Eu sou uma vida que foi mudada, vim de comunidade. Se não fosse o Beach Soccer, não sei o que seria da minha vida", declarou.

Campello, Leven e Salgado parabenizam por título

Em meio a todo o caos do processo eleitoral do Vasco, o atual presidente, Alexandre Campello, e os candidatos que brigam juridicamente para oficializar suas vitórias, Jorge Salgado e Leven Siano, utilizaram as redes sociais para manifestar seus parabéns pela conquista do tricampeonato brasileiro. Veja nas postagens abaixo:

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