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Um ano após rebaixamento, Cruzeiro ainda junta os cacos e vê acesso difícil

Um ano após queda à Série B, clube ainda apaga incêndios e tenta resolver graves problemas financeiros - Guilherme Piu
Um ano após queda à Série B, clube ainda apaga incêndios e tenta resolver graves problemas financeiros Imagem: Guilherme Piu

Guilherme Piu

Do UOL, em Belo Horizonte

09/12/2020 04h00

Um ano se passou desde que o Cruzeiro foi rebaixado pela primeira vez em sua história à Série B. E para quem achou que seria fácil o retorno de um dos maiores clubes do futebol nacional à elite do Campeonato Brasileiro, enganou-se. Apenas em posição intermediária na tabela de classificação da divisão de acesso, a Raposa dentro de campo é um reflexo do que ainda acontece fora de suas quatro linhas.

O UOL Esporte enumerou alguns dos grandes problemas vividos e ou/acentuados pelo Cruzeiro no pós-rebaixamento, e que dificultam, e muito, a situação do clube na temporada de 2020. Com o agravante da pandemia da Covid-19, que acertou em cheio as finanças dos clubes.

Processos trabalhistas

O Cruzeiro soma mais de uma centena de processos ativos na Justiça do Trabalho. Ex-funcionários, jogadores, técnicos e membros de comissões técnicas, dentre outros, cobram valores estratosféricos. As cobranças judiciais são feitas por falta de pagamento de salários, bonificações, prêmios e direitos trabalhistas, como 13º, férias, Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

A atual diretoria celeste negocia acordos para reduzir o passivo trabalhista, que o presidente Sérgio Santos Rodrigues chegou a comentar em setembro, poderia atingir R$ 150 milhões. Dentre os acordos já realizados, um chama bastante a atenção: o do atacante Fred.

O atual camisa 9 do Fluminense, que cobrava mais de R$ 70 milhões do clube na Justiça, aceitou receber do Cruzeiro R$ 25 milhões. O pagamento será feito em cinco anos, dividido em 61 parcelas de R$ 400 mil mais 12 parcelas de R$ 50 mil. O primeiro pagamento a contar a partir de 2022, tendo a Raposa, então, um ano de carência para iniciar a quitação da dívida.

Quase R$ 1 bilhão em dívidas

A atual diretoria comandada por Sérgio Rodrigues assumiu em junho deste ano, após passagem de bastão do Conselho Gestor, grupo de empresários que gerenciou o clube entre dezembro de 2019 e maio de 2020. Antes dos "notáveis" cruzeirenses se tornarem os responsáveis por administrar o Cruzeiro, Wagner Pires e sua cúpula diretiva promoveram uma devassa nas finanças. O balanço patrimonial do exercício de 2019 apontou dívida próxima a R$ 1 bilhão e déficit anual de R$ 394 milhões, recorde negativo no cenário brasileiro.

Antes mesmo do antigo presidente, que renunciou por denúncias de corrupção à época — hoje é réu na Justiça por crimes de ordem financeira contra o Cruzeiro — as contas do clube na gestão Gilvan de Pinho Tavares mostravam que era necessária uma política mais conservadora, com menos gastos e mais poupança. O que não aconteceu e levou a Raposa à bancarrota em 2019.

No começo de 2020 não havia dinheiro para nada nos cofres. Contas de água, luz e salários não foram pagos. Chegou a faltar alimento na Toca II para a nutrição dos atletas e demais funcionários da Toca II. Um patrocinador precisou enviar produtos para suprir necessidades básicas logo no início da pré-temporada.

A atual gestão já disse que mais de R$ 50 milhões em dívidas foram pagos nesta temporada.

Problemas com salários

O Cruzeiro tinha a segunda maior folha salarial no futebol em 2019 e ficava atrás apenas do Palmeiras. A Raposa tinha R$ 15 milhões por mês de obrigações com atletas, R$ 2 milhões a menos que o Palmeiras e R$ 1 milhão a mais que o Flamengo. O Rubro-Negro venceu praticamente todos os torneios que disputou em 2019, levantando troféus no Brasileirão, Libertadores e o Campeonato Carioca.

Em 2020 a redução salarial no clube foi drástica, ficando em um terço, aproximadamente, do que era pago na temporada passada. O Conselho Gestor instituiu logo em janeiro um teto de R$ 150 mil e negociou com jogadores essa redução de pagamento, com obrigação de restituição a partir de 2021. Período que pode ser renegociado em caso de a Raposa não alcançar o acesso à Série A no ano que vem, como revelou o UOL Esporte. Hoje a chance de o time azul, na parte de baixo da tabela, voltar à Série A, é bem pequena.

Novo atraso salarial

Falando em salário, alguns funcionários do departamento administrativo estão com uma folha atrasada (novembro) e não há perspectiva, segundo apurou o UOL, do pagamento do 13º, que já deveria ter sido pago (primeira parcela). Há quem esteja com os vencimentos por mais tempo atrasados.

No departamento de futebol já são duas folhas e meia em atraso. Antes do jogo com o Brasil de Pelotas, alguns atletas aproveitaram a presença de Sérgio Santos Rodrigues na Toca II e foram conversar com o presidente. Lideranças do elenco estiveram presentes neste encontro, segundo informações passadas à reportagem.

Dívidas na Fifa

O Cruzeiro foi punido com a perda de seis pontos na Série B do Campeonato Brasileiro deste ano por dívida com o Al Wahda, ainda pela contratação por empréstimo do volante Denílson, em 2016. Esse débito é discutido com o clube dos Emirados Árabes Unidos e o processo está suspenso na Fifa até que um recurso da Raposa seja julgado. O que deve acontecer em 2021.

Além disso, o clube já pagou quase R$ 10,5 milhões em outras ações também na entidade máxima do futebol mundial. Quitou a dívida com o Zorya (UCR) referente ao atacante Willian Bigode — valor superior a R$ 9 milhões — e pagou ao Instituto (ARG) quase R$ 740 mil pelo mecanismo de solidariedade na venda do atacante argentino Ramon Ábila, além de ter desembolsado quase R$ 500 mil ao técnico português Paulo Bento, por dívidas de 2016.

Há outras discussões que envolvem o nome do Cruzeiro na Fifa e o clube terá que resolvê-las em breve caso não queira sofrer novas punições.

Outro problema e que trava o clube para novas inscrições de atletas (pela segunda vez no ano) é a dívida com o PSTC, do Paraná, pela venda do zagueiro Bruno Viana.

Acordos judiciais

Apesar dos problemas, houve feitos comemorados pelo Cruzeiro. Como o acordo para o pagamento de dívidas fiscais e tributárias com a União pelo advento da Transação Tributária, permitida após decisão do presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido).

O Cruzeiro reduziu suas dívidas fiscais em R$ 152 milhões e pagará outros R$ 182 milhões em 12 anos. Essa negociação chegou para impedir uma enxurrada de bloqueios judiciais ocasionados pela saída do clube do Profut (Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro).

Briga política

Os problemas políticos envolvendo o Conselho Deliberativo do Cruzeiro seguem em 2020. Discussões por eleições de membros do legislativo, aprovação de um novo estatuto e disputas pela cadeira presidencial acirraram os ânimos nos bastidores.

Os casos envolvendo os conselheiros expulsos por terem sido remunerados durante a gestão Wagner Pires de Sá — o que é vedado pelas normas do clube — dividem os membros da pasta e causam desavenças que envolvem até o nome do presidente Sérgio Santos Rodrigues.

Aposta em Felipão

O Cruzeiro conta com a ajuda de um parceiro para pagar dívidas e na contratação do técnico Luiz Felipe Scolari. O treinador, o quarto comandante do time no ano — depois de Adilson Batista, Enderson Moreira e Ney Franco —, tem bom aproveitamento no comando da Raposa, e vive a difícil missão do acesso.

A multa contratual de Felipão no Cruzeiro está na casa dos R$ 10 milhões, como noticiou o UOL.

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