Para polícia, bombas usadas em emboscada ao SPFC podiam matar jogadores
As granadas caseiras utilizadas pelos agressores que emboscaram o ônibus do São Paulo no último sábado (23) tinham potencial para causar a morte de quem estivesse no local, como jogadores, dirigentes e funcionários do clube, policiais ou torcedores. A afirmação é de um especialista do esquadrão de bombas do Gate (Grupo de Ações Táticas Especiais) da Polícia Militar que atendeu à ocorrência e está presente nas mais de 300 páginas de documentos que formam a investigação policial sobre o atentado.
O incidente aconteceu antes do empate em 1 a 1 com o Coritiba, no estádio Morumbi. A investigação detalha a periculosidade das bombas de fragmentação que causaram danos severos ao veículo e lista as lesões sofridas por policiais no confronto.
O Gate encontrou as bombas no material apreendido depois do ataque, junto a pedaços de madeira, barras de ferro e outros explosivos. Eram compostas por bolas de gude e bolas de bilhar envoltas em um saco cheio de pólvora. Quando arremessadas, funcionam como granadas: a pólvora explode e as bolas são arremessadas em diversos ângulos como projéteis, podendo causar lesões graves e até morte em quem é atingido. Havia pelo menos quatro artefatos do gênero.
O policial Vitor Haddad, especialista antibomba que participou da operação, testou uma dessas granadas. "Houve o seccionamento controlado de uma das amostras, para fazer o teste de efetividade, ou seja, verificar se o artefato era explosivo. Faz-se uma ressalva sobre esse ponto, tratando-se do vídeo que faz parte dos autos em que um dos artefatos foi submetido à combustão, configurando-se o impacto e a capacidade lesiva da combustão. Ou seja, arremessados, os artefatos poderiam provocar danos, lesões e até mortes. Houve, portanto, verificação positiva", afirma, em depoimento no 14º Distrito Policial.
A investigação indica que pelo menos um explosivo foi detonado contra o ônibus do São Paulo. A reportagem teve acesso a imagens que mostram perfurações na fuselagem do veículo. Ao tentar conter o ataque, a polícia entrou em confronto com os agressores.
Veja imagens de ônibus do São Paulo após ataque em emboscada
Três policiais feridos e interrogatório a líder de organizada
Os policiais conseguiram conter a emboscada, mas três ficaram feridos e precisaram de atendimento no pronto socorro. Um sofreu uma lesão nos dedos da mão esquerda, decorrente de uma paulada. Outro foi atingido na perna por uma pedra. Um terceiro foi atingido com uma paulada no cotovelo esquerdo e um golpe com barra de ferro no joelho direito. Todos foram atendidos no Pronto Socorro da Lapa.
A investigação relata a suspeita de que um líder da torcida organizada Independente seria o mandante do ataque. "Os policiais ressaltam que, durante breve confabulação após a prisão em flagrante dos indiciados, ventilou-se a informação de que havia um indivíduo dotado do controle intelectual da conduta criminosa, o qual não estava presente quando da investida contra o ônibus da Delegação do São Paulo, mas que teria arquitetado o plano", diz documento da investigação.
Os policiais, então, entraram em contato com os responsáveis pelo policiamento no Morumbi. A PM localizou o líder da torcida citado, relatou que ele "aparentava tensão, utilizando, constantemente, o aplicativo Google Maps" e o convocou para prestar depoimento. Na delegacia, acompanhado de um advogado, disse que a Independente não teve participação no ato e "pediu, inclusive, aos policiais, dados dos 14 presos para que, caso constatado que pertencem aos quadros da organizada, sejam expulsos".
O celular do dirigente da Independente e os dos torcedores detidos foram confiscados. O promotor Roberto Bacal concordou com pedido da delegada que cuida do caso para que os sigilos telefônicos sejam quebrados. Falta a decisão da Justiça. O promotor também pediu que a Independente seja proibida, durante cinco anos, de frequentar estádios, centros de treinamentos e até hotéis em que o São Paulo estiver hospedado.
Presos optam por permanecer em silêncio e dificultam as investigações
Os 14 presos no episódio invocaram o artigo 5º da Constituição Federal, que dá o direito de permanecerem calados. Nenhum deles falou sobre o incidente. Dos 14, nove foram liberados — pesa na decisão de liberação, além dos antecedentes, a pandemia do novo coronavírus.
No São Paulo, há ampla desconfiança entre atletas de que alguém do próprio clube tenha vazado detalhes sobre a logística para os autores do atentado. O ônibus fez, no sábado, uma rota atípica, diferente da que costuma fazer para ir ao Morumbi — justamente em virtude do risco de manifestações de torcedores pelo momento conturbado. No novo trajeto, foi atacado em uma rua por onde quase nunca passa.
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