Abel chega a 70º jogo exalando palmeirismo e pode completar 100 no Mundial
Abel Ferreira nasceu em Penafiel, Portugal. Mas se alguém dissesse que ele nasceu nos bairros paulistanos da Pompeia ou Lapa, redutos palmeirenses, apenas o sotaque indicaria tratar-se de uma mentira. Passional e sangüíneo, Abel encarnou o palmeirismo como talvez só Felipão tenha feito entre os técnicos do clube.
O técnico vai chegar a 70 jogos no comando do Palmeiras contra o Fortaleza, sábado (7), no Allianz Parque, quatro dias depois de ter completado nove meses no clube. A data redonda poderia ter acontecido dez partidas atrás, contra o Bahia, também em casa —o que faria do jogo do sábado o 80º. Mas Abel Ferreira não pôde dirigir o time em dez partidas, por covid-19, devido ao breve período de folga que teve em março e por ter sido suspenso algumas vezes.
Se tudo correr bem e o Palmeiras vencer a Libertadores novamente, o português pode chegar a 100 jogos pelo clube justamente em uma eventual final de Mundial de Clubes —ou disputa de 3º lugar—, em pouco mais de um ano de contrato. Se a marca for atingida, o Palmeiras ficará a quatro jogos de ser o time mais dirigido pelo técnico, que somou 103 jogos pelo Braga (POR) e 102 pelo Braga B. Para comparação, em um ano e dois meses no PAOK (GRE), Abel comandou o time apenas 58 vezes —doze a menos do que comandou o clube alviverde com cinco meses a menos.
Essa é a realidade com que Abel estava acostumado. Por isso, tudo no Brasil é superlativo para o treinador, do calendário à atenção dada pela imprensa ao clube em que trabalha, passando pela estrutura alviverde e pela cobrança sobre seu trabalho. Braga e PAOK não chegam minimamente perto de ter na Europa a relevância que o Palmeiras tem na América do Sul, por exemplo. Muito menos em número de torcedores —ou adeptos, como diz o técnico.
Independentemente disso, Abel vem saindo-se bem no desafio, colecionando momentos memoráveis e números expressivos desde sua chegada.
Os números falam com eloquência
O numeral 2, total de conquistas de Abel pelo clube, é o que melhor resume a trajetória do técnico. Mas Abel vai além. Nos 69 jogos em que comandou o Palmeiras, ele obteve 39 vitórias, 12 empates e 17 derrotas, tendo assim um aproveitamento de 62,3% dos pontos. Nessas partidas, o Palmeiras fez 109 gols e sofreu 53. O número total da comissão técnica portuguesa aponta 79 jogos, 45 vitórias, 17 empates e 17 derrotas, com 128 gols marcados e 62 sofridos.
A primeira entrevista e a reunião com funcionários deixaram boa impressão
Abel Ferreira chegou causando ótima impressão, em 3 de novembro. Na primeira entrevista coletiva, demonstrou saber detalhes do elenco, elogiou jovens e veteranos e de cara cunhou um de seus famosos bordões, ao dizer que o lateral Viña era "top, top, top, pãm, pãm, pãm". No mesmo dia, reuniu todos os funcionários da Academia de Futebol em um dos campos do CT, para se apresentar. Tal atitude foi muito bem encarada no clube.
O primeiro cartão de uma longa série veio em três jogos
O primeiro cartão de Abel pelo Palmeiras aconteceu nas quartas de final da Copa do Brasil, logo no terceiro jogo do técnico pelo clube. Contra o Ceará (11/11), foi logo um vermelho, apresentado a ele por Bráulio Machado. Estava entregue ali, também, o cartão de visitas do técnico, que conversa com a arbitragem o tempo inteiro ao longo dos jogos. No total, Abel já recebeu 14 amarelos e dois vermelhos.
Treinador fez história com dois títulos
Ao conquistar a Copa do Brasil e a Libertadores na mesma temporada, Abel entrou para a história do Palmeiras. Ele é o único técnico do clube neste século a ganhar dois campeonatos em uma mesma temporada. O feito o colocou ao lado de Humberto Cabelli (1933), Ventura Cambon (1951), Oswaldo Brandão (1972), Vanderlei Luxemburgo (1993 e 1994) e Felipão (1998), que também lograram o feito. Juntamente com Luxa, ele é o único a conquistar dois títulos em seu ano de estreia.
As decepções foram doloridas
O fracasso no Mundial de Clubes de 2020, quando o time caiu na semifinal para o Tigres (MEX), foi dolorido e potencializado pela derrota para o Al Ahly (EGI), nos pênaltis, pelo terceiro lugar. Também foi nos pênaltis que ele perdeu a Recopa Sul-Americana, para o Defensa y Justicia (ARG), a Supercopa do Brasil, para o Flamengo, e a vaga nas oitavas da Copa do Brasil deste ano, para o CRB. Com a bola rolando, perdeu para o São Paulo, a quem nunca venceu, na final do Campeonato Paulista da atual temporada. Na derrota por 2 a 0, no Morumbi, muito nervoso, ele peitou o volante Liziero, com quem se desculpou dias depois.
As reclamações foram constantes e sortidas
Abel não se furta de dizer o que pensa. Mais de uma vez, fustigou a arbitragem brasileira, cujo nível considera muito baixo. "Grandes equipes em campo merecem um árbitro do mesmo nível", disse, ao se queixar de Leandro Vuaden na Supercopa. Também queixou-se do calendário. "Agora eu percebo porque aqui os treinadores só duram dois, três meses: porque é impossível treinar nestas condições", disse em fevereiro deste ano. Mais de uma vez, queixou-se da falta de reforços para o time. A mais incisiva, em junho:
"Em março, entreguei relatório para a diretoria com tudo que era preciso para jogar a Recopa Sul-Americana, a Supercopa do Brasil e a final do Paulista. E, até hoje, eu não conto com reforços. Perdi as esperanças. Nossos reforços vão chegar em agosto? Não, aí já passou muito tempo. Fico desiludido", disse, após derrota para o Red Bull Bragantino (1 a 3) pelo Brasileiro.
Abel tem alguns jogadores em conta mais alta
Abel é um grande motivador e está sempre elogiando seus jogadores. Alguns, entretanto, parecem estar em melhor conta com ele. O goleiro Weverton é um deles. "É um dos melhores do mundo", disse em março. Felipe Melo e Gustavo Gómez também estão nesta lista. Titulares sempre que possível, estão entre os mais assíduos no time. Renan, que ele trouxe de base e fixou entre os titulares, também. Bem como Scarpa, que ele também fez titular e chegou sugerir para a seleção brasileira quando ainda improvisado como lateral.
Zé Rafael, porém, talvez seja o mais elogiado. Abel sempre relembra que o volante, a quem chama de guerreiro, jogou lesionado boa parte de 2020. Sempre que julga necessário, o treinador o defende de críticas. E, quando possível, o exalta: "O Zé Rafael é um exemplo. Tenho que tirar o chapéu para ele", disse em junho. Outro da lista de preferidos é o volante Danilo. "O que eu quero mesmo é que ele não saia e fique conosco. Espero que esse jogador continue conosco durante muitos anos", disse em julho.
O carinho pelo Palmeiras conquistou a torcida
Desde os primeiros dias de trabalho, Abel exalta o clube como o "maior campeão do Brasil". Encerra suas preleções no vestiário com um sonoro grito de "avanti, Palestra!". Aprendeu o significado de "cornetar", uma expressão nascida no Palmeiras, antes mesmo de começar a trabalhar. Captou a noção de "família" que tanto representa o sentimento palmeirense, com sua frase "todos somos um". E até o ditado "contra tudo e contra todos", que resume o sentimento de perseguição tão presente no palmeirense, já saiu de sua boca. E, para completar, teve rusgas com a imprensa recentemente.
Português, com certeza. Mas, definitivamente, palmeirense..
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