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Eliminatórias Sul-Americanas

Como argentinos conseguiram ir a campo contra o Brasil para jogo suspenso

Jogadores da Argentina deixam o campo da Neoquímica Arena - Marcello Zambrana/AGIF
Jogadores da Argentina deixam o campo da Neoquímica Arena Imagem: Marcello Zambrana/AGIF

Igor Siqueira

Do UOL, no Rio de Janeiro

05/09/2021 21h40

A seleção argentina chegou ao Brasil na sexta-feira (3), mas só por volta das 16h05 de hoje (5) os representantes da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) conseguiram impedir a circulação do quarteto que saiu da Inglaterra há menos de 14 dias e não cumpriu quarentena, conforme previsto na legislação vigente. O ápice da confusão teve contornos cinematográficos e pitorescos porque se deu já com a bola rolando na Neo Química Arena para o jogo contra o Brasil pelas Eliminatórias.

A origem da discussão se dá no desembarque da Argentina em São Paulo. Na declaração de saúde do viajante apresentada às autoridades, o goleiro Emiliano Martínez, o zagueiro Cristian Romero, o volante Giovani Lo Celso e o meia-atacante Emiliano Buendia — liberados por clubes ingleses — não teriam informado que vieram do Reino Unido a menos 14 dias. Naquele momento, a Anvisa não captou que a informação era falsa.

A Argentina treinou no Parque São Jorge logo no início da noite de sexta-feira. Segundo a Anvisa, na sexta-feira já se tinha notícia da irregularidade cometida pelos argentinos. A portaria de 23 de junho que estipula quarentena de 14 dias para quem é estrangeiro e vem ao Brasil da Inglaterra foi publicada durante a Copa América, última vez em que seleções estrangeiras entraram no país, mas quando os atletas já cumpriam os 14 dias longe dos países proibidos. Ela, porém, abre possibilidade de um pedido de exceção para a quarentena —o problema é que os argentinos não pediram esse tratamento diferenciado.

Seleção argentina treina na Neo Química Arena - Divulgação/AFA - Divulgação/AFA
Seleção argentina treina na Neo Química Arena
Imagem: Divulgação/AFA

Diretor da supervisão de Portos, Aeroportos e Fronteiras da Anvisa, Alex Machado Campos, disse à GloboNews que não houve qualquer pedido de excepcionalidade formalizado pelos argentinos ao governo federal. "Essa excepcionalidade é pedida de maneira antecipada. Se algum especialista, por exemplo, precisa entrar no país para fazer a manutenção em uma plataforma de petróleo, o pedido antecipado é avaliado e se estabelece o protocolo para aquela excepcionalidade. Mas esse pedido não ocorreu."

Na tarde de ontem (4), a Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo já estava ciente da notificação da Anvisa e também da programação de uma visita técnica ao hotel em que a seleção argentina estava concentrada. Uma reunião às 17h colocou frente a frente a Anvisa, autoridades de saúde paulistas e instituições envolvidas com a partida. O órgão federal diz que nessa ocasião foi informada a necessidade de quarentena. "No entanto, mesmo depois da reunião e da comunicação das autoridades, os jogadores participaram de treinamento na noite do sábado", disse a Anvisa, referindo-se ao trabalho de véspera de jogo ocorrido na Neo Química Arena.

Pela versão que vem da Conmebol, também no sábado chegou mais uma garantia do Ministério da Saúde de que o jogo aconteceria. A Anvisa, por sua vez, disse desconhecer qualquer articulação fora das fronteiras do órgão. O Ministério da Saúde disse que apoia a decisão da agência reguladora. Na manhã do jogo, a Anvisa informou que fez contato com a Polícia Federal para assegurar o cumprimento da quarentena por parte dos quatro jogadores, que seria seguida pela retirada deles do país.

Em vez de isolar Martínez, Romero, Lo Celso e Buendia, a Argentina confirmou a escalação dos três primeiros no time titular. Lá foram eles rumo ao estádio em Itaquera. A Anvisa disse que não conseguiu retê-los "desde a saída da delegação do hotel e mesmo em tempo considerável antes do início do jogo" —a reportagem do UOL confirmou ao menos uma tentativa no estádio de Itaquera: cerca de meia hora antes do jogo, um policial federal e um agente da Vigilância Sanitária se dirigiram ao portão de acesso das delegações, mas a tentativa de acessar o vestiário dos argentinos não deu certo.

"Nossas equipes estavam lá antes de o jogo começar. Há de se apurar o porquê da demora. Isso poderia ter sido evitado. Poderia ter sido evitado se a verdade prevalecesse na declaração de saúde do viajante, o que não aconteceu. Poderia ser evitado se aqueles orientados em ficar de quarentena tivessem efetivamente ficado", disse o diretor presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, à BandNews.

Messi e Neymar durante a paralisação de Brasil x Argentina, pelas Eliminatórias para a Copa do Mundo de 2022 - REUTERS - REUTERS
Messi e Neymar durante a paralisação de Brasil x Argentina, pelas Eliminatórias para a Copa do Mundo de 2022
Imagem: REUTERS

Nos bastidores da CBF, a informação era que havia um acerto com as autoridades para que os jogadores pelo menos disputassem a partida e logo em seguida fossem para o aeroporto. Mas, como se viu, isso não se concretizou. Faltando cerca de dez minutos para o horário do jogo, a seleção brasileira já estava perfilada no túnel de acesso ao gramado. Os reservas argentinos passaram ao lado antes da chegada dos titulares e de três dos quatro "ingleses". Passados a execução do hino e os primeiros cinco minutos de bola rolando, os servidores federais apareceram à beira do campo. Depois de muita discussão, tentativas de impedimento, houve a invasão ao gramado.

O UOL apurou que o delegado da Conmebol escalado para o clássico chegou a argumentar junto aos agentes da Anvisa para que esperassem pelo menos o intervalo do jogo para retirar os quatro jogadores. Os representantes não quiseram.

Após sair de campo, os argentinos ficaram cerca de três horas no vestiário da Neo Química Arena. A demora na saída tinha a ver com o destino da delegação: o hotel em que estavam hospedados ou o aeroporto de Guarulhos. Apenas por volta de 19 horas foi definida a saída direta para o aeroporto. Lá, os atletas foram ouvidos pela Polícia Federal para falar sobre as informações falsas dos formulários de entrada.

Em nota oficial, a Anvisa disse que ainda no estádio os jogadores "se recusaram a assinar a notificação entregue pelas autoridades presentes". Essas notificação falavam em "retorno imediato ao seu país de origem, com base na Portaria Interministerial 655/2021 e no art. 11 da Lei 6.437/1977".

Em Guarulhos, com a supervisão do embaixador da Argentina no Brasil, Daniel Scioli, o quarteto conseguiu embarcar junto com a delegação argentina para o país vizinho. De lá, Martínez, Romero, Lo Celso e Buendia devem voltar à Inglaterra.