Paixão pelo futebol une irmãos surdos em sonhos e conquistas
No país do futebol é comum garotos desejarem fazer sucesso com a bola nos pés. Mas há quem se veja impedido até de sonhar com esta possibilidade. Apesar de não terem comprometimento físico, portadores de deficiência auditiva ainda são raros nas grandes equipes de futebol. Em comemoração ao Dia Nacional dos Surdos, o auxiliar de almoxarifado Jean Krebs, de 27 anos, conversou por texto com o UOL Esporte e contou por que desistiu de fazer carreira neste esporte. Mesmo assim, conseguiu ajudar o sonho se tornar realidade para outra pessoa na família.
Jean sempre gostou de futebol e desde criança sonhava em ser jogador. Natural de Erechim (RS), ele hoje é casado e tem dois filhos e assim como mais de 10 milhões de brasileiros, segundo o IBGE, Jean é surdo. Sua surdez é de nascença.
Quando mais jovem, o gaúcho costumava jogar tanto com surdos quanto com ouvintes. Ele garante que a única diferença entre as duas modalidades é que, com surdos, o juiz costuma apitar com o auxílio de uma bandeira. "Mas toda forma de jogar é igual", afirma.
Embora não tivesse preferência por uma ou outra categoria, o surdo de nascença ressalta que as condições para os jogadores com audição são mais profissionalizadas. "Ouvintes têm verbas e salários, mas a maioria acredita que surdos não são capazes de jogar".
Jean lembra de um episódio na infância que o frustrou com o esporte. Foi quando olheiros de fora do Brasil visitaram Erechim para recrutar jogadores e ele, apesar do bom desempenho, não foi selecionado. Mais tarde, seus amigos ouviram dos avaliadores que a surdez era um dos motivos por trás da reprovação.
"A maioria das pessoas diz que surdos não podem jogar em times profissionais porque não ouvem quando o juiz apita. A maioria das pessoas tem medo de nos ter por perto", desabafa.
Mesmo desesperançoso com o esporte, Jean, ainda aos 10 anos, decidiu apresentar o futebol à sua irmã, quatro anos mais nova, que também é surda. Mal imaginava que, aos 17, a jovem seria eleita a melhor jogadora do Mundial de Futsal de Surdos, em 2015: "Ensinei minha irmã, ela continuou e conseguiu [se tornar jogadora]".
Incentivo familiar
Jean é irmão de Stefany Krebs, ex-jogadora do Palmeiras. Conhecida como Tefy, ela conquistou, aos 19 anos, o bronze inédito do Brasil nas Surdolimpíadas. Em 2019, no Campeonato Mundial de Futsal para surdos, foi novamente eleita a melhor jogadora.
Stefany, que sempre menciona o irmão como seu incentivador ao esporte, já treinou com a equipe feminina do Internacional. O currículo chamou a atenção do Palmeiras e, em 2020, ela assinou contrato com o clube. No Verdão, participou de apenas cinco jogos, entrando no decorrer de duelos —três no Brasileirão e dois no Paulistão.
"Senti muito orgulho quando ela foi contratada pelo Palmeiras", recorda o irmão. Atualmente, a irmã de Jean não tem contrato profissional com nenhum clube e está à procura de uma nova equipe.
Com o exemplo de Tefy, Jean vê o futebol feminino como mais inclusivo para pessoas surdas, enquanto o masculino ainda se mostra resistente em dar oportunidade a quem não tem audição. "Tem muitos surdos que jogam melhor que os ouvintes, mas, mesmo assim, não há interesse", diz.
Em 2019, o Palmeiras contratou para a equipe sub-20 o meio-campista paraguaio Gustavo Peralta, que é surdo. Campeão de dois torneios internacionais com o Alviverde, o jovem não teve sequência e não chegou a disputar partidas oficiais com o clube. Hoje, Peralta defende o Olimpia-PAR.
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