Ex-técnico revela como 'inventou' Patrick e Danilo volantes no Palmeiras

"Futebol, você sabe como é: não tem amanhã nem passado. É o hoje, aquele momento", define Wesley Carvalho, ex-técnico do sub-20 do Palmeiras, desligado do clube em 25 de agosto sem mágoas, rusgas ou problemas extracampo, conforme ele garante. Por suas mãos, passaram todas as crias da base alviverde nos últimos quatro anos. E alguns, como Patrick de Paula e Danilo, foram "invenções" suas.

Meias ofensivos, apelidados de Pelé (Patrick) e Neymar (Danilo), antes de jogarem com Wesley, ambos se tornaram volantes de primeira linha nas mãos do treinador. E o processo de convencimento rendeu boas histórias.

"É difícil convencer um jogador, no fim já de sua trajetória na base a recuar", diz Wesley. "Você chegar para um cara que é 10 é falar: você agora é cinco. 'Pô, então eu vou ter que marcar, agora?', normalmente, eles dizem", comentou Carvalho.

"Se o Gérson joga de 8, porque você não poderia?"

Convencer Patrick de Paula a se transformar em volante foi tarefa dura. "Não foi fácil. O PK —apelido de Patrick— é aquele estilo carioca, jogava nos campos da favela. No time do bairro dele, o Cara Virada, jogava com a 10. E ele cresceu jogando na rua, onde, o prazer é você driblar, dar uma caneta, um chapéu", ilustra.

O começo de Patrick não foi fácil. Ele chegou para o sub-17 e não conseguiu jogar. Promovido ao sub-20, Wesley começou a recuá-lo. Primeiro, colocou de segundo volante. E já ouviu queixas. "Aí, eu falei para ele: se o Gerson joga de 8, porque você não poderia?", em referência ao hoje jogador do Olympique de Marselha (FRA) . Mas os planos de Wesley eram ainda maiores.

"A gente estava na Holanda, no Torneio de Terborg. E eu fiquei sem meu primeiro volante", conta. "Aí, cheguei para PK falei: eu vou te trazer para primeiro volante", conta.

De "8 para 5 [primeiro volante] ", a mudança foi menos traumática para Patrick, que foi bem demais no campeonato, fazendo inclusive o gol do título. "Quando voltamos, ele não foi só meu 5, mas também meu capitão", conta. "Patrick foi meu jogador mais inteligente no campo, consegue enxergar tudo", diz Wesley.

Já como volante, Patrick foi com o Palmeiras enfrentar o Vasco em São Januário, em 2019. Segundo Wesley, ele fez gol da vitória, além de jogar muito bem. E quem estava na arquibancada naquele dia era o então técnico do Vasco, Vanderlei Luxemburgo.

"Assim que ele chegou no Palmeiras, veio conversar comigo e já falou: 'eu quero aquele neguinho'", referindo-se a Patrick, relembra-se.

"Esquece esse negócio de Neymar, Danilo"

Quando chegou ao Palmeiras, Danilo trouxe com ele a alcunha de "Neymar do Nordeste".

"A primeira coisa que eu fiz foi mandar ele parar com isso, esquecer esse negócio de Neymar", conta Wesley aos risos.

Danilo foi mais um camisa 10 recuado por Wesley, mas volante não foi a primeira função que o técnico quis dar ao meia.

"Houve um jogo em que só estava com um lateral-esquerdo, que era o Lucas Esteves, que hoje está no futebol dos EUA [ele joga no Colorado Rapids]", relembra-se.

"Eu experimentei o Danilo na lateral, mas não deu certo. Depois, puxei para segundo volante, e ele correspondeu. Até que encaixei como primeiro volante e deu ainda mais certo", conta. "Muita gente fala que eu não gosto de um camisa 5 clássico, um volante de marcação, e que jogo sempre com dois camisas 8".

"Quando eu o vi jogar, até por ser canhoto, pensei: encontrei o novo Patrick de Paula", diz.

Saída de Wesley pegou muitos de surpresa

A saída de Wesley do Palmeiras surpreendeu muita gente, mesmo dentro do clube. Ainda que, dois dias antes, a equipe tenha feito um jogo muito ruim contra o São Paulo, que chegou a abrir 4 a 0, antes de o Palmeiras fazer dois gols.

Amigo de João Paulo Sampaio, diretor das categorias de base, desde a infância na Bahia, Carvalho jura que saiu sem mágoas. "Foi uma parceria. Eu ganhei, eles ganharam. Deixamos ativos, mudamos a forma de o clube e a torcida verem a base, quebramos paradigmas", diz ele.

"No elenco do profissional, há vários jogadores construídos na base. E o clube me colocou em São Paulo, me trouxe para esse mercado", pondera. "Foi de comum acordo. Tem horas em que os estilos do time e do técnico não combinam. Encerramos o ciclo, era bom mudar", diz.

No Palmeiras, Wesley conquistou o Campeonato Brasileiro (2018), Copa do Brasil (2019), Campeonato Paulista (2017, 2018 e 2019), Copa RS (2018), além de outros títulos internacionais, como o bicampeonato (2018-2019) do Torneio de Terborg, na Holanda.