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Em time de príncipe na Malásia, "bicho" chega de limusine e escolta armada

Tunku Mahkota, príncipe de Johor, na Malásia, comanda o Johor Darul Ta"zim - Facebook/Johor Official
Tunku Mahkota, príncipe de Johor, na Malásia, comanda o Johor Darul Ta'zim Imagem: Facebook/Johor Official

Jeremias Wernek

Do UOL, em Porto Alegre

03/11/2021 04h00

A sirene rasga os céus e interrompe o treino. O som chega antes da imagem de uma caravana de carros que se move rápido, mas quem joga no Johor Darul Ta'zim, clube da Malásia, nem precisa ver para saber do que se trata. O barulho é de dinheiro em movimento. O comboio com batedores carrega a mensagem de Tunku Mahkota, príncipe herdeiro do estado malaio e dono do clube que atualmente domina o futebol local. A barulheira é para avisar que o bônus pela vitória mais recente chegou.

"Aqui eles falam bônus e não 'bicho'. Eles pagam no vestiário, em dinheiro, antes do jogo seguinte. O príncipe tem tanto funcionário aqui que nem sei dizer quantos e nem qual o nome do cargo de quem nos leva o dinheiro", conta Bergson, atacante revelado pelo Grêmio, ex-Ceará, Athletico-PR e que está na Malásia desde março.

O Johor ganhou as últimas oito edições do campeonato malaio e a transformação do clube é apontada como efeito da entrada de Tunku Mahkota, o príncipe do estado homônimo ao time, na diretoria. Com mais investimento, o futebol local se tornou presa fácil.

"O príncipe fala 'o bônus vai ser pago tal hora, no vestiário' e quando a gente escuta sirene da escolta, movimentação, já sabe que vem o cara trazendo o dinheiro", confirma Bergson.

Tunku Ismail ibni Sultan Ibrahim tem status de ícone na cultura local. No Instagram, a conta dele tem 3,9 milhões de seguidores e é ornada com fotos em praias paradisíacas, carros, aviões, armas, ao lado de David Beckham, Lionel Messi, visita a Juventus, na Itália, e registros no Johor Darul Ta'Zim, o clube, claro. A relação com o time é realmente intensa.

"A gente tem dois grupos no WhatsApp: um com todos do vestiário e outro só do príncipe com a gente, jogadores. Ele manda uns textão (sic) e o capitão é sempre o primeiro a responder, mas todos precisam interagir. Ele gosta que a gente se expresse, que a gente participe", explica Bergson. "Às vezes, quando o time perde, ele escreve lá e é fogo, né? (risos). Mas ele mostra muito respeito pela gente também", acrescenta.

Tunku Mahkota também convive com os jogadores fora das instalações do clube.

"Eu só tinha visto esse tratamento, que ele tem aqui, em filme. Lógico que no começo a gente fica impressionado, mas depois se acostuma. Tem escolta quando ele vai ao CT, quando vai ao estádio. Os caras descem com armas fazendo a escolta. Carros e carros atrás. É limusine, Ferrari, Bugati? Carros e carros. É um mundo paralelo, assim por dizer, e eu via em filmes e tal, mas na realidade a gente fica impressionado. Mas depois fica normal, ele frequenta normal, reunião e vídeo. Vamos a casa dele", revela.

Bergson, ex-Grêmio, Athletico-PR, Ceará e Fortaleza, é artilheiro na Malásia - Facebook/Johor Official - Facebook/Johor Official
Imagem: Facebook/Johor Official

Os jantares na casa do chefe são frequentes e são usados para aumentar a identificação do elenco com a cidade e o clube.

"Ele tem um polo na casa dele e tipo um bar com a coleção de carro dele. Ele leva a gente lá direto. Costuma fazer isso uma vez por semana", explica Bergson.

Natural de Alegrete, próximo da fronteira com a Argentina, Bergson fechou com o Johor por empréstimo, mas foi tão bem que já teve os direitos econômicos adquiridos pelo clube da Malásia. Foram 23 gols em 20 jogos na chamada Super League, o campeonato nacional. Artilheiro do time, vice-goleador da liga e dono da melhor média de gols do campeonato.

"Eu estava em um momento que queria tentar algo novo fora do Brasil. Eu fui jogar na Coreia do Sul com 19 anos, então era muito novo e não estava pronto. Foi uma situação financeira bacana, mas eu não estava pronto. Agora, estou mais maduro. Foi uma decisão pelo lado financeiro, mas também para jogar, me sentir valorizado", lembra Bergson.

A oferta chegou no início do ano e fez o atacante se mexer.

"Eu nunca tinha ouvido falar do futebol na Malásia antes, cara. Eu não sabia qual era a capital do país, mas fui atrás de referências. Falei com o Diogo, que agora está na Tailândia, e foi só elogios ao clube, a liga, ao país. Os meus amigos falam 'pô, o Bergson está na Malásia, cara!'. Mas quando eles olham o clube, a estrutura, a liga, notam que é bom. Aqui só pode haver três estrangeiros em cada clube, então a exigência é muito grande", afirma.

O Johor, com Bergson, foi campeão malaio com 18 vitórias, três empates e apenas uma derrota. Foram 57 pontos em 22 jogos e o brasileiro marcou quase metade dos gols do clube. Uma rotina que explica porque o elenco já identifica o dinheiro pelo som.