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Injúria racial e abandono. A dor de uma trabalhadora agredida no Mineirão

Bruna Araújo foi agredida por um torcedor do Atlético-MG, no Mineirão - Arquivo Pessoal/Reprodução Instagram
Bruna Araújo foi agredida por um torcedor do Atlético-MG, no Mineirão Imagem: Arquivo Pessoal/Reprodução Instagram

Victor Martins

Colaboração para o UOL, em Belo Horizonte (MG)

13/11/2021 16h28

A euforia da torcida do Atlético-MG pela proximidade da conquista do Campeonato Brasileiro depois de 50 anos se contrasta com os relatos recentes de fatos ocorridos no Mineirão. Desde o assédio sexual sofrido pelas atleticanas ao caso de injuria racial e da agressão física que sofreu uma prestadora de serviço do estádio. Bruna Araújo Campos estava trabalhando em um dos bares do Gigante da Pampulha, no triunfo do Galo sobre o Corinthians, e passou por uma experiência traumática.

Bruna é modelo, mas por falta de trabalhos na área tem feito bicos no Mineirão. Ela recebe R$ 90 por jogo, para uma jornada que algumas vezes supera 12 horas. Como aconteceu no Atlético 3 a 0 Corinthians. Colocada para trabalhar em um dos bares do setor laranja superior, local de concentração da maior torcida organizada do Galo, Bruna pegou serviço às 7h e só largou por volta da meia-noite.

"Temos que deixar o bar limpinho", contou ela ao UOL Esporte. Especificamente na última partida o pagamento foi R$ 130 pelas horas a mais de trabalho.

Mas o jogo da última quarta-feira (10) foi diferente. Foi marcante, infelizmente para o lado negativo. Bruna sofreu injúria racial e depois foi agredida fisicamente por um torcedor do Atlético, que ainda não foi identificado. "Primeiro ele me chamou de macaca, por causa de um copo de cerveja que eu não podia pegar. Depois, quando fui ao banheiro, ele veio por trás e me pegou de surpresa", relembrou Bruna, que não quer falar mais sobre o assunto.

"Essa é a última entrevista que dou sobre o caso. Já falei muito sobre o que aconteceu e a cada vez que falo, eu lembro de tudo novamente e isso mexe muito comigo", disse em contato telefônico com a reportagem.

Mas não significa que Bruna deixará o caso passar impune. Pelo contrário. Ela garante que vai lutar até o fim para que o agressor receba a punição que merece. "Eu não vou ficar calada. Nos meus trabalhos como modelo eu sempre prego essa luta contra o racismo. Sempre levanto a bandeira dessa luta. Logo agora que aconteceu comigo eu vou ficar calada? Não mesmo. Vou até o fim para que o torcedor que fez isso comigo seja punido como ele merece".

As horas seguintes

"Não foi nada fácil", assim Bruna descreve os momentos seguintes às agressões que recebeu, verbalmente e fisicamente.

Também não foi nada fácil a quinta-feira, o dia seguinte ao ocorrido. "Dormir? Como que dorme? Era impossível", contou Bruna, que passou a noite em claro e com muitas dores. Anteontem (11) pela manhã, ela teve ajuda de familiares para ir até uma UPA (Unidades de Pronto Atendimento) em Belo Horizonte. Lá constatou as luxações no braço e no punho. Se as contusões estavam tratadas, Bruna ainda tem feridas emocionais.

"Fui embora com os meus colegas de trabalho. E foi difícil, pois eu estava com muito medo. Medo de que o torcedor que me agrediu estivesse me esperando lá fora ou então de que ele me reconhecesse. Eu estava em choque e precisei da ajuda dos meus amigos", revelou Bruna, que se sentiu abandonada pelo Mineirão e também pelo Atlético.

"Sou terceirizada. Presto serviço para a JM [empresa que administra os bares do Mineirão], que me deu todo o suporte e até falaram que vão ressarcir meu celular. Mas do Mineirão só ligaram para saber o que tinha acontecido, mais nada. E do Atlético nenhuma mensagem. E isso dói mais, pois sou atleticana".

Os próximos passos

Sem condições de procurar uma delegacia na última quinta, Bruna registrou Boletim de Ocorrência somente na sexta-feira. Depois de procurar a Polícia Militar, ela garante que também vai atrás da Polícia Civil. Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa do Mineirão informou que as imagens do ocorrido já estão à disposição da polícia. Basta que sejam solicitadas. As imagens do caso de assédio sexual relatas pelo UOL já estão em posse da polícia.

Mas mesmo depois de tudo o que aconteceu, Bruna deve estar no Mineirão para o duelo do Atlético com o Juventude, marcado para o dia 20. Como ela não pode abrir mão desse dinheiro, que tem ajudado bastante neste momento de dificuldade, a solução será trabalhar em outro setor do estádio ou até mesmo numa nova função para que não tenha contato com o público.