Ex-Corinthians parou carreira por filha; doença é mesma de filha de Leifert
O jogo Portuguesa x São Bento pela terceira rodada da Série A2 do Campeonato Paulista aconteceu na última quinta-feira (3) e não virou manchete. Mas para um jogador que esteve em campo com a camisa do time visitante foi daqueles dias para não sair da memória. É que Nenê Bonilha voltou a atuar profissionalmente depois de um ano.
Campeão paulista pelo Corinthians em 2013 e com boas passagens recentes pelo Fortaleza, o volante subiu para a elite do Brasileirão com o Cuiabá em janeiro do ano passado — a temporada 2020 varou 2021 pela pandemia. Depois do acesso, a carreira que estava em alta ficou parada até anteontem, no Canindé. A explicação é um problema familiar que só agora vem à tona.
Maria Luísa, filha de um ano e nove meses de Nenê Bonilha com a esposa Flávia Oliveira, está em tratamento contra o retinoblastoma, o tumor ocular mais comum na infância. É a mesma doença que enfrenta Lua, filha dos jornalistas Tiago Leifert e Daiana Garbin. A revelação causou comoção na semana passada e inspirou Nenê e Flávia a também compartilharem sua luta com o propósito de alerta para outras famílias.
No caso de Malu, os pais perceberam um "leve estrabismo" do olho esquerdo, o que permitiu o diagnóstico precoce. O relato de Tiago Leifert foi semelhante: foi notado um movimento estranho, irregular, no olho da filha, como se ela olhasse de lado. Além destes sinais, é muito comum a identificação do retinoblastoma pelo reflexo branco, semelhante ao do olho do gato, quando um feixe de luz artificial (o do flash no momento de uma foto, por exemplo) incide através da pupila. Em olhos saudáveis, esse reflexo é vermelho.
Após o diagnóstico do câncer de Maria Luísa, o tratamento acontece na Tucca (Associação para Crianças e Adolescentes com Câncer), do Hospital Santa Marcelina, em São Paulo, com sessões de quimioterapia intra-arterial. Nenê Bonilha e família viviam em Fortaleza e decidiram mudar-se para São Paulo para acompanhar todas as etapas de mais perto. Daí veio a pausa com o futebol.
"Assim que descobrimos decidimos cuidar de perto. Família para mim é tudo, está em primeiro lugar. Então eu decidi parar para acompanhar o tratamento. No início é assustador, a gente começa a questionar: por que comigo? Mas nós somos pessoas de fé e sempre acreditamos que daria certo", diz ao UOL Esporte, antes de completar:
Não tive nem peso, nem medida. Tinha proposta do Brasil e para fora e nem hesitei. Achei que era momento de ficar com a minha família e pararia mil vezes se fosse preciso. Se fosse da vontade de Deus e eu tivesse que ficar mais tempo parado eu ficaria, mesmo amando futebol. Mas amo mais minha filha, não tinha como não parar."
O estafe de Nenê Bonilha diz que houve consulta de um time do Qatar e sondagens de alguns clubes brasileiros depois do acesso com o Cuiabá, mas nada foi considerado pelo foco na questão familiar. Durante o ano parado, manteve a forma com treinos individuais, academia e futevôlei e também cuidou de negócios paralelos — é sócio de uma construtora em Fortaleza.
A proposta do São Bento para a Série A2 de 2022 veio num momento mais leve do tratamento da filha e com a possibilidade de estar por perto. "O clube entendeu minhas necessidades e me fez um convite. O projeto que me apresentaram eu gostei para essa retomada e foi esse o motivo da escolha. Eu cheguei lá para ser campeão, esse é o intuito. Se não der, pelo menos subir."
O elenco se apresentou no dia 10 de janeiro, mas pouco antes da estreia o volante testou positivo para covid-19, o que atrasou a reestreia em mais alguns dias. "Estou parecendo um garoto indo fazer teste em clube", brincou, antes do jogo contra a Portuguesa.
Causos com treinadores marcam carreira precoce
Nenê Bonilha foi contratado pelo Corinthians quando tinha 19 anos, em 2011. O time tinha acabado de ser eliminado pelo Tolima-COL na chamada pré-Libertadores e também vendido Jucilei, um dos seus jogadores mais importantes. Apesar do contrato longo, ele atuou somente seis vezes pelo clube, especialmente no Paulista 2013.
"Não tem como não se orgulhar de jogar num dos maiores clubes do país, ainda mais na época que eu joguei. O pessoal da minha cidade, meus amigos, ficavam bravos: 'como você não joga?' Meu filho, vou jogar como? Olhava para o lado era Ralf, Paulinho, Danilo e Alex, só cara consagrado, de seleção. Eu de 18 para 19 anos, vou fazer o quê?", relembra o volante, que apesar das poucas chances tem gratidão por Tite, hoje na seleção brasileira.
O Tite me preservava, dizia 'o menino não está pronto', era um paizão. Ele me colocava na hora que dava e eu fui aprendendo com o pessoal que estava lá. Eu fui na época errada, porque eu peguei o melhor time da história do Corinthians, o time que foi campeão de tudo. Só de ter oportunidade de viver esses momentos lá vou contar para as minhas filhas, ainda mais por ter trabalhado com o Tite. Nos treinos a gente falava que ele ia ser treinador da seleção. Antes de ser campeão brasileiro, mundial. Além de conhecer muito do futebol e de tática, como pessoa ele é sensacional."
Antes de Tite, Nenê Bonilha foi dirigido por Fernando Diniz no Paulista de Jundiaí — ele voltaria a trabalhar com o treinador por empréstimo, no Osasco Audax. Entre eles nasceu uma relação de amizade, para além do futebol.
"Um dia ele me levou para assistir aula da faculdade de Psicologia, para você ter noção. Eu tinha acabado de ir para o Corinthians e ele me chamou para jantar. Parei na casa dele, saímos e ele pediu para eu passar num lugar com ele, disse que ia pegar um negócio na faculdade. Eu entrei num auditório, sentamos. O professor, um aluno, ele e eu. E fiquei assistindo aula por uma hora. Ele: 'e aí, tá entendendo?". Eu: 'claro que não, eu não estudava nem quando ia para a escola, imagina agora (risos)'. Um cara fantástico, acho que ele queria que eu fosse mais tranquilo."
Nenê Bonilha também trabalhou com Fábio Carille, por quem diz ter gratidão e admiração, e Rogério Ceni, que considera "um dos melhores com quem trabalhei": "O que esse cara entende de futebol é impressionante. Ele vive futebol, não dorme. Tinha dia na pandemia que ele ligava para a gente 3h, 4h da manhã de vídeo para ficar falando de futebol. O que ele transformou o Fortaleza é impressionante, mudou o patamar do clube."
Agora sob o comando de Paulo Roberto Santos no São Bento, Nenê Bonilha espera retomar o bom rendimento e voltar ao cenário nacional. Mas isso é o de menos. O que interessa mesmo é a saúde da Malu. Que vai bem, obrigado.
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