Topo

Palmeiras

Erro no Conecte SUS faz palmeirense quase perder viagem para o Mundial

Caio Rogério Ribeiro quase perdeu viagem para assistir o Palmeiras no Mundial por erro no Conecte SUS - Arquivo pessoal
Caio Rogério Ribeiro quase perdeu viagem para assistir o Palmeiras no Mundial por erro no Conecte SUS Imagem: Arquivo pessoal

Ana Flávia Oliveira e Bruno Madrid

Do UOL, em São Paulo

06/02/2022 04h00

Apenas dois dias depois de o Palmeiras levantar a taça do tricampeonato da Libertadores, Caio Rogério Ribeiro, de 34 anos, já estava com as passagens para Abu Dhabi, com escala no Qatar, compradas. Afinal, ver seu time do coração disputando um Mundial era o "maior sonho" da vida do executivo de tecnologia. Mas um erro no sistema do Conecte SUS quase fez Ribeiro perder anos de planejamento e economia.

Apaixonado pelo Palmeiras, o paulistano tinha o dinheiro guardado para uma viagem como essa desde 2004, quando começou a trabalhar. Ele calcula que gastou cerca de R$ 10 mil em passagens, hospedagem e ingressos para ver o Palmeiras, que estreia na terça-feira (8) no Mundial. No ano passado, ele teve que adiar os planos por causa da pandemia.

"No ano passado eu fiquei louco, fazendo de tudo para tentar ir, mas não tinha como, o Qatar estava fechado. Neste ano, não pestanejei duas vezes, tanto que o título foi no sábado e na segunda emiti a passagem", contou Ribeiro ao UOL.

Naquele momento, ele nem imaginava o perrengue que passaria para realizar o sonho. Imunizado contra a covid-19 com duas doses da Coronavac e uma da Pfizer, ele estranhou que a dose de reforço não constava no Conecte SUS, plataforma do Ministério da Saúde que permite que os cidadãos acompanhem seu histórico de vacinas. Sem esse documento, ele não poderia entrar no Qatar, ponto de conexão antes de seguir para os Emirados Árabes.

Comprovante de vacinação do Conecta SUS não mostra terceira dose - Reprodução/Arquivo pessoal - Reprodução/Arquivo pessoal
Comprovante de vacinação do Conecta SUS não mostra terceira dose
Imagem: Reprodução/Arquivo pessoal

"O governo do Qatar tem uma série de vacinas que considera aprovadas, que é AstraZeneca, Pfizer... e tem uma série de vacinas que considera restritivas, entre elas a Coronovac. Já sabendo disso, e com a passagem comprada, eu falei: 'vou tomar a terceira dose da Pfizer'. E foi bem na época que houve o hackeamento do sistema do SUS. Tomei a terceira dose no dia 18 de dezembro e aguardei os dez dias que [o comprovante] demora para aparecer no Conecte SUS. Não apareceu", contou o palmeirense.

O susto foi grande, mas Ribeiro não se desesperou. Afinal ainda havia muito tempo para o embarque. No dia 10 de janeiro, ele voltou a consultar o sistema do SUS. Nada ainda.

Ele então foi ao posto de saúde onde tomou a terceira dose para verificar se a vacina constava no sistema. "A mulher [que o atendeu] mostrou o sistema em que eles lançam a vacina no SUS. As duas doses apareciam como sim e a terceira como não. Ela falou que não tinha o que fazer ali", recorda Ribeiro.

A atendente, no entanto, sugeriu que ele entrasse no site do Poupatempo para emitir um certificado de vacinação do governo do Estado de São Paulo. O documento tem QR Code e é inglês, conforme exigido pelo governo do Qatar, e deve ser enviado 72 horas antes da chegada ao país. Um alívio momentâneo para Ribeiro.

"Eu pensei: 'Estou seguro com meu certificado, parece que vai funcionar'. Na terça-feira à noite (1), eu ainda dei uma segunda olhada no Conecte SUS e a terceira dose não estava lá. Enviei esse PDF emitido no site do Poupatempo em inglês, bonitinho. Na quarta-feira à tarde, eu recebi a devolutiva do governo do Qatar, dizendo que minha entrada não tinha sido aprovada." A partir daí foi um desespero.

Comprovante de vacinação emitido pelo governo de SP mostra as três doses - Reprodução/Arquivo pessoal - Reprodução/Arquivo pessoal
Comprovante de vacinação emitido pelo governo de SP mostra as três doses
Imagem: Reprodução/Arquivo pessoal

Corrida contra o tempo

Como tinha pouco tempo para resolver o problema, Ribeiro buscou soluções na internet. A primeira medida foi mandar um e-mail para a ouvidoria do SUS. A resposta, embora tenha sido rápida, não ajudou. Afinal, dizia que os dados na plataforma já estavam restabelecidos após o sistema ter sido hackeado e, em caso de divergência, ele deveria procurar o posto de saúde onde tomou a terceira dose. Ele voltou à Unidade Básica de Saúde, e nada mudou.

Em suas pesquisas, encontrou o caso de uma mulher que entrou na Justiça e conseguiu uma liminar para que o Ministério da Saúde corrigisse os dados no aplicativo. Ligou para um amigo que é juiz, que lhe indicou alguns advogados. Mas, de acordo com Ribeiro, nenhum profissional consultado aceitou o processo. Eles disseram que não havia tempo hábil para que um juiz emitisse uma liminar obrigando a pasta a ajustar a informação na plataforma e ele pudesse enviar o documento para o governo do Qatar.

"Afinal, eu precisava dessa autorização de entrada já para embarcar no Brasil, não quando eu chegar lá. Se fosse assim, pelo menos, ganharia umas 18 horas", contou.

Ribeiro chegou a considerar a compra de outra passagem, dessa vez direto para os Emirados Árabes Unidos, que têm uma política menos restritiva em relação à entrada de estrangeiros na pandemia. "Só que agora as passagens estão R$ 15 mil, só a ida".

Enfim, a solução em um telefonema

Neste meio-tempo, Ribeiro também foi até o guichê da Qatar Airways, no Aeroporto Internacional de Guarulhos. O funcionário que o atendeu lhe devolveu a esperança ao dizer que outras pessoas com o mesmo problema estavam conseguindo resolver ligando para um número, que ele não sabia qual era. "E eu comecei a procurar formas de procurar fazer isso funcionar".

Ele então procurou a embaixada do Qatar no Brasil e o consulado brasileiro em Doha, onde foi orientado a ligar para um serviço de atendimento do governo qatari.

"Eu liguei para o Ministério da Saúde do Qatar, em um call center para atender os cidadãos. Foi complicado explicar [a origem do certificado emitido pelo governo paulista]. Ele [atendente] falou: 'me envia novamente'. Foi esquisito até: uma ligação de uns 10 minutos e, depois de meia hora, a entrada estava aprovada. A impressão que deu é que eu ter ligado de fato agilizou o processo. Eu enviei o mesmo certificado do governo de São Paulo que havia sido negado", disse, aliviado, o torcedor palmeirense, poucas horas antes de embarcar. Embora tenha conseguido entrar no Qatar, Ribeiro teme que o problema possa se repetir no retorno ao Brasil.

Ministério da Saúde nega falha

Questionado pelo UOL, o Ministério da Saúde negou que haja alguma falha no funcionamento do Conecte SUS, explicando que o aplicativo espelha os dados repassados pelos Estados e municípios. Embora a reportagem tenha repassado à pasta os dados pessoais de Ribeiro, como nome completo e número de documentos, não há nenhuma menção ao torcedor na nota enviada à redação.

Confira a nota na íntegra:

O Ministério da Saúde informa que o aplicativo Conecte SUS Cidadão está funcionando normalmente. Vale esclarecer que o app espelha exatamente o que é registrado nos sistemas de informação dos estados e municípios.

Cabe ressaltar que a Pasta orienta que, o cidadão que não tiver seu registro disponível no aplicativo em até 10 dias após a data da sua vacinação, ou que o registro apresente informações incorretas deve procurar o local de vacinação ou as Secretarias Estadual ou Municipal de Saúde de sua região, para solicitar o registro ou correção e envio de seus dados à Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS).

Após 72h do envio dos registros para a RNDS, os dados já estarão disponíveis para visualização no Conecte SUS e emissão do Certificado Nacional de Vacinação Covid-19, para o usuário que concluiu o esquema vacinal.

Por fim, o usuário pode acessar o suporte no próprio aplicativo, através do menu "Fale com o Conecte SUS".

Palmeiras