Discípulo de Parreira, técnico do Al Ahly combate preconceito com africanos
Pitso Mosimane não ganhou holofotes apenas por sua entrevista contundente ou pelo feito do Ah Ahly, que mesmo sem 11 jogadores considerados titulares entre lesões e desfalques forçados pela seleção do Egito, conseguiu vencer o Monterrey pelo Mundial de Clubes, no sábado (5), e se credenciou para enfrentar o Palmeiras na semifinal da competição.
Antes mesmo de pisar em Abu Dhabi, o técnico já carregava títulos coletivos e individuais que o colocam como um dos principais — talvez o principal — treinador africano em atividade. Mas o reconhecimento ainda passa longe de seu continente e a luta contra o preconceito é uma das bandeiras erguidas pelo comandante.
"Eu quero dedicar esta vitória a Carlos Alberto Parreira, ele é meu mentor como treinador de futebol", disse Pitso ao BandSports na zona mista do estádio Al Nahyan. "Aprendi muito com ele, sobre táticas, sobre treinamentos", completou.
A relação com o técnico tetracampeão da Copa do Mundo com a seleção brasileira vem do trabalho na seleção da África do Sul. Mosimane foi auxiliar tanto de Parreira quanto de Joel Santana na preparação e na Copa do Mundo de 2010.
Sua carreira como treinador decolou exatamente depois daquele mundial. Os Bafana Bafana foram eliminados na primeira fase do torneio, Parreira decidiu deixar o comando e Mosimane assumiu o posto.
O início, porém, não foi nada promissor. Depois de algumas convocações criticadas e da desclassificação bizarra da Copa das Nações Africanas de 2012, quando a África do Sul segurou empate contra Serra Leoa e comemorou a vaga na competição, mas de fato estava eliminada e tinha interpretado equivocadamente o regulamento, ele acabou demitido.
Mas se faltou sucesso na seleção, sobrou em clubes. Ele foi contratado pelo Mamelodi Sundowns, clube conhecido pelo apelido de 'Os Brasileiros', em razão das cores do uniforme. E, sob comando da amarelinha, brilhou. Foram cinco títulos do campeonato da África do Sul, duas Copas Nedbank, duas Copas Telkom, uma Supercopa Africana e uma Liga dos Campeões da África, levando pela primeira vez um time do país ao Mundial de Clubes, em 2016.
Eleito melhor técnico de seu país em cinco temporadas, e em uma melhor treinador do continente, ele resolveu deixar a equipe em setembro de 2020 e partir para o Al Ahly. Foi quando se deparou com uma barreira que não poderia ser vencida com táticas, treinamentos, dribles ou chutes: o preconceito.
Mosimane foi o primeiro africano não egípcio a comandar o Al Ahly, que vinha de apostas em treinadores europeus e sul-americanos. De cara, percebeu questionamentos além dos que esperava. "Houve pessoas que questionavam se eu tinha credibilidade para treinar o maior time do continente", contou em entrevista ao New York Times.
O tempo mostrou que a desconfiança era infundada. Ele ganhou, pouco após assumir o time, a Liga dos Campeões da África, levou sua equipe ao Mundial de Clubes e acabou em terceiro, batendo o Palmeiras, nos pênaltis, na disputa da temporada passada. Antes, deu trabalho ao Bayern de Munique na semifinal. Além disso, foi campeão nacional. Nesta temporada, novamente venceu a Liga dos Campeões, e colocou as taças de duas Supercopas Africanas do museu de sua equipe, e novamente foi eleito melhor treinador do continente.
Mas a luta contra o preconceito, vencida no Egito com resultados, cruza o oceano. Pitso Mosimane entende que a Fifa não observe como deveria qualquer profissional que trabalhe longe da Europa. Ele, mesmo com tamanho reconhecimento na África, jamais esteve entre os melhores técnicos do mundo selecionados pela entidade.
"Não é apenas a África, é como se não significasse nada quando você ganha uma competição que não gera a maior quantia em dinheiro ou as maiores audiências", reclama.
O discurso foi o mesmo após vencer o Monterrey. Além de questionar a questão individual, Mosimane citou Jorge Jesus para sublinhar sua opinião sobre as decisões da Fifa. Para ele, quem trabalha fora da Europa não é visto. "Ele ganhou tudo e não foi lembrado", falou após a vitória contra o Monterrey.
Hoje, Mosimane trabalha não apenas por suas taças. "Não há mais nada para eu ganhar na África", ressaltou ao jornal dos EUA. Mas para romper a barreira que, na visão dele, persiste contra treinadores africanos e negros em grandes centros do futebol. "A verdade, infelizmente, é essa", lamenta.
O exemplo é claro e está próximo. Bradley Carnell, técnico do St. Louis City, clube que vai estrear na MLS [Major League Soccer] em 2023, é sul-africano e foi jogador da seleção com Mosimane como auxiliar. Não tem nem perto de sua experiência ou conquistas. "Quer dizer que eu poderia treinar na MLS? Acho que não", completa. Carnell é branco.
Por reconhecer tais dificuldades, o técnico do Al Ahly pensa em voltar ao mercado de seleções, algo que poderia ser catapultado pelos feitos no Mundial de Clubes. Nesta terça-feira (8), novamente o Palmeiras estará pela frente.
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