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Incêndio no Ninho faz três anos com família sem acordo e luta na Justiça

Torcedores prestam homenagem às vítimas do incêndio que  atingiu o alojamento no CT do Flamengo - Folhapress
Torcedores prestam homenagem às vítimas do incêndio que atingiu o alojamento no CT do Flamengo Imagem: Folhapress

Alexandre Araújo e Leo Burlá

Do UOL, no Rio de Janeiro (RJ)

08/02/2022 04h00

O incêndio no Ninho do Urubu completa três anos hoje (8) ainda com algumas questões sem solução e sem punições aos responsáveis. Das famílias das vítimas da tragédia no CT do Flamengo, ainda não houve acordo com a do goleiro Christian Esmério, que acionou a Justiça.

Ontem (7), o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) negou recurso extraordinário da Defensoria Pública do Estado (DPRJ), que solicitava o restabelecimento do pagamento de pensão aos familiares das vítimas.

A tragédia nos alojamentos da base terminou com dez mortes e outros três jovens encaminhados ao hospital. Jonathan Ventura, que teve cerca de 35% do corpo queimado, retornou aos gramados em junho.

Recurso negado

Ontem (7), o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) negou recurso extraordinário da Defensoria Pública do Estado (DPRJ), que visava restabelecer o pagamento de pensão aos familiares das vítimas do incêndio do Ninho do Urubu. O novo recurso buscava fazer com que a pauta fosse ao Supremo Tribunal Federal (STF) e, ao final, houvesse a restauração dos valores.

No ano passado o TJRJ acatou, parcialmente, o recurso do Rubro-Negro, extinguindo a ação civil pública que dizia respeito às vítimas cujas famílias haviam fechado acordo. Além disso, reduziu para cinco salários mínimos —o equivalente a R$ 5.225— a pensão das famílias que ainda não haviam chegado a um denominador comum.

Em outubro do ano passado, a DPRJ e o Ministério Público encaminharam recursos ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao STF solicitando a retomada da ação. O Tribunal de Justiça, porém, só admitiu os recursos para o STJ e negou os dirigidos ao STF.

Acordo pendente

O Flamengo ainda não fechou acordos com todas as famílias das vítimas. O caso mais recente foi o da mãe de Rykelmo, que chegou a um denominador comum em dezembro. Ela retirou a ação que havia feito ainda em agosto de 2019, citando Rodolfo Landim, presidente do Flamengo, e Rogerio Caboclo, então presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).

Christian Esmério, goleiro do Flamengo que foi vítima fatal do incêndio no Ninho do Urubu - Reprodução Instagram - Reprodução Instagram
Imagem: Reprodução Instagram

Desta forma, o clube chegou à décima resolução em 11 negociações. Também em dezembro, a família de Christian Esmério levou o caso aos tribunais. Os familiares acionaram o Rubro-Negro na na 33ª Vara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), pedindo um total de R$ 8.440.000,00, com danos morais e pensionamento.

"Como se disse, o clube réu detinha a guarda e vigilância das crianças vitimadas no trágico acidente, as quais estavam alojadas em suas dependências, diga-se, desde logo, sem as menores condições para tal e sem as devidas autorizações legais para tal", diz trecho do documento.

À época, Rodrigo Dunshee, vice-presidente Geral e Jurídico, lamentou a movimentação, mas afirmou que o clube está "mantendo a coerência". O dirigente assegurou que a cúpula está aberta para dialogar com a família de Christian:

"Não podemos ser injustos com todas as 25 famílias que fizemos acordos, em especial as nove dos nossos 10 atletas que perderam a vida. Estamos mantendo a coerência dentro dos padrões que foram realizados os últimos acordos. Lamentamos a ação (porque entendemos que é pior para todos) e seguimos abertos para conversar. Tenho carinho por essa família e eles sabem que estamos sempre aqui para conversar".

Inquérito

Em janeiro do ano passado, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ) recebeu a denúncia do Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) sobre o incêndio no Ninho do Urubu. Desta forma, 11 pessoas, dentre elas Eduardo Bandeira de Mello, ex-presidente do Flamengo, chegaram a ser tornar réus no caso, que responderiam pelo crime de incêndio culposo qualificado pelos resultados morte e lesão grave.

Posteriormente, a Justiça rejeitou as denúncias contra o ex-diretor de base Carlos Noval e o engenheiro Luiz Felipe Pondé. O monitor Marcus Vinícius Medeiros foi absolvido da acusação.

Em junho, houve a suspensão da ação criminal. A alegação do MP-RJ aponta "vício do julgado por violação do contraditório e prolação de decisão surpresa", após o juiz ter rejeitado a denúncia contra Noval e Pondé.

Quando o incêndio fez dois anos, o ex-presidente Eduardo Bandeira de Mello apontou que a denúncia contra ele era "injusta, sem fundamento e incoerente".

"Reitero minha total solidariedade às famílias das crianças. Conforme tenho afirmado, a denúncia contra mim é injusta, sem fundamento e incoerente com a atuação do próprio Ministério Público junto ao Clube desde 2012, além de ter ignorado todas as informações prestadas ao longo desses dois anos pela defesa e reveladas pela imprensa, inclusive por meio do portal UOL. Em juízo, apresentaremos elementos que restabelecerão a verdade", disse, ao UOL Esporte, na ocasião.

CPI da Alerj

A Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) realizou uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar alguns incêndios que aconteceram em 2019 no Rio de Janeiro, como o do Ninho do Urubu, em fevereiro, do Hospital Badim, em setembro, e da Whiskeria Quatro por Quatro, em outubro.

Rodrigo Dunshee, vice-presidente do Flamengo, Jaime Correia, vice de Administração, e o CEO Reinaldo Belotti na CPI que investiga incêndio no Ninho - Leo Burlá / UOL Esporte - Leo Burlá / UOL Esporte
Rodrigo Dunshee, vice-presidente do Flamengo, Jaime Correia, vice de Administração, e o CEO Reinaldo Belotti na CPI que investiga incêndio no Ninho
Imagem: Leo Burlá / UOL Esporte

O relatório final foi aprovado em 14 de dezembro, pede o indiciamento de, ao todo 19 pessoas, sendo nove ligadas ao incidente no Ninho, nove no Badim e o proprietário da "Quatro por Quatro".

Segundo relatado pelo site da Alerj, "a pedido do deputado Rodrigo Amorim (PSL), relator da CPI, foram retirados três nomes da sugestão de indiciamento, todos ligados ao incêndio do Ninho do Urubu", "são eles: o ex-presidente do Flamengo, Eduardo Bandeira de Mello, que esteve à frente do clube até 2018; do ex-vice-presidente de patrimônio do clube, Alexandre Wrobel; e do monitor Marcos Vinicius".

"Ouvimos essas pessoas e tivemos de utilizar, inclusive, de condução coercitiva para ter a presença do Alexandre na comissão. Mas entendi a explicação do deputado Amorim que considerou que essas pessoas não provocaram diretamente o incêndio. Por isso, concordei que seus nomes fossem retirados do relatório", concluiu Knoplock, na ocasião, de acordo com registro do site da entidade.

Jonathan volta aos gramados

Além das dez vítimas, o incêndio no Ninho deixou três jovens hospitalizados: O goleiro Francisco Dyogo, o zagueiro Jhonata Ventura e o atacante Cauan Emanuel.

Jonatha atuou em uma partida novamente apenas em junho do ano passado, em duelo entre o Flamengo e o América-MG, pelo Campeonato Brasileiro Sub-17.

Jhonata Ventura, sobrevivente do incêndio no Ninho do Urubu, CT do Flamengo, voltou aos gramados após mais de dois anos - Marcelo Cortes / Flamengo - Marcelo Cortes / Flamengo
Imagem: Marcelo Cortes / Flamengo

Francisco e Cauan voltaram a atuar ainda naquele mesmo ano. Ventura, com cerca de 35% do corpo queimado, em maioria na parte superior, chegou a ter o estado considerado como gravíssimo.

Após internações no Centro de Tratamento de Queimados (CTQ) do Hospital Municipal Pedro II e no Hospital Vitória, recebeu alta em 13 de abril, mais de dois meses após o incêndio, mas o tratamento ainda continuou.

Ele retomou os treinos em janeiro de 2020, iniciando um processo de transição até poder se juntar ao elenco. A pandemia de coronavírus, porém, atrapalhou os planos. Em junho, porém, pode realizar o sonho — o vínculo atual é até 2023.

"Desde que saiu a relação para o jogo, estava com frio na barriga enorme para estar aqui, ir para a concentração com com meus companheiros. Estava louco para voltar a jogar aqui. Passou filme na cabeça, não tenho o que falar. A sensação é muito boa de estar de volta, e, se Deus quiser, ajudar mais", disse, em entrevista à FlaTV à época.

"Muito feliz de estar de volta. Passei um momento muito difícil da minha carreira na base, que foi o acidente que aconteceu, mas estou aqui para falar que estou muito saudável, muito bem para jogar, competir", completou.