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Substituto de campeão mundial, Jean Mota tenta brilhar em time de Beckham

Conrado Giulietti

Colaboração para o UOL, em Miami (EUA)

06/03/2022 04h00

"Bend it like Beckham" é um filme pouco conhecido, daqueles que a tradução não refletia exatamente o que o título propunha. "Driblando o Destino", de 2002, contava a história de uma menina - Jesminder Bhamra (Parminder K. Nagra) - que sonhava em se tornar tão boa quanto seu ídolo, David Beckham. Bend it seria, em uma tradução livre, bater com curva/efeito. Exatamente como o galã inglês fazia. Exatamente como Jean Mota gosta de fazer.

O que liga o jogador de 258 partidas e 20 gols pelo Santos ao inglês é o fato de Mota ter sido uma das contratações feitas por Beckham no final da última temporada para o seu Inter Miami, que disputa em 2022 apenas a terceira temporada de vida.

Beckham - Divulgação - Divulgação
David Beckham, dono do Inter Miami
Imagem: Divulgação

A saída do Peixe se deu pela decisão do presidente Andrés Rueda de reduzir custos na folha salarial. O clube faturou cerca de R$ 3 milhões com a venda para time que tem Beckham como um dos proprietários - não se divulgou ao certo a porcentagem de ações dele e dos outros sócios, os irmãos Jorge e Jose Más. Sabe-se, porém, que no final do ano passado, o ex-Manchester United, Real Madrid, Milan e LA Galaxy adquiriu nova fatia do bolo.

"Eu pude conhecê-lo um dia antes do jogo. Ele foi no treino, conversamos, ele me deu boas vindas, perguntou como estava a família, se já estava adaptado. No jogo também ele foi com sua família. Todos os jogos ele está presente", conta Jean Mota, em entrevista exclusiva ao UOL, dias após sua estreia na Major League Soccer.

No último dia 26 de fevereiro, o Inter Miami não venceu diante de sua torcida o Chicago Fire (0 a 0), mas o volume de jogo chamou atenção. E neste quesito, Mota se destacou. De acordo com as estatísticas oficiais da MLS, o brasileiro teve a melhor porcentagem de acerto de passes (86,2%) entre todos os colegas de equipe.

Mota define o novo chefe como alguém acolhedor: "O pessoal já me falou que uma ou duas vezes por semana ele está no clube, às vezes treina com a gente. Um cara bem tranquilo, que dá todo o suporte. Não é aquele presidente que só vai quando tem a bucha, quando tem que resolver alguma coisa, não, ele está lá no dia a dia também".

Jean Mota - Divulgação - Divulgação
Jean Mota, do Inter Miami
Imagem: Divulgação

Canhoto, Jean Mota tem outra sombra para seus primeiros momentos no clube da Flórida. Jogou 90 minutos na posição ocupada por Blaise Matuidi nas últimas temporadas. O campeão do mundo pela França, inclusive, não ficará mais no Inter Miami. "Uma responsabilidade grande, né? Um cara que tem uma história gigante. Então você tem que mostrar todos os dias nos treinos e jogos porque você veio, porque eles foram atrás de você".

A adaptação a nova casa também passa pelo modelo de jogo, muito mais físico do que se comparado ao futebol brasileiro. "Desde os treinamentos, que são muito intensos. Porque é um jogo de muita transição. Os dois times querem jogar. Não tem muito a qualidade do Brasil, mas aqui o pessoal joga sempre pra frente. Tem muitas chances dos dois lados, muita correria, você precisa estar bem fisicamente".

"Você pega um Santos contra um time menor: ele vai jogar um pouco mais retrancado, o Santos vai propor mais o jogo. Aqui não tem essa, o último colocado e o primeiro, os dois times vão jogar, não tem essa desigualdade".

Atuar nos Estados Unidos não é exatamente um propósito de férias, ou de caminho para aposentadoria - como sugeriu recentemente Neymar. Jean Mota tem 28 anos. Quando as coisas pareciam chegar ao fim no Santos, recebeu ofertas de clubes da Turquia. Escolheu os EUA e a Flórida - como muitos brasileiros fizeram nos últimos anos.

"Inclusive a casa onde estou é de um brasileiro. No nosso condomínio aqui tem brasileiros também, meu filho já está adaptado, indo para a escola. O clima é o clima de Santos praticamente, sol? Era um sonho conciliar o futebol com a qualidade de vida para minha família. Creio que na MLS eu vou conseguir isso. Morar num lugar legal, desempenhar meu trabalho, e fazer história. Tenho me dedicado para conquistar os objetivos e que possa deixar um legado".

Para tal meta, Mota tem um aliado fundamental. Gregore, ex-Bahia, no seu segundo ano pelo Inter Miami e hoje capitão do time. "Ele tem essa característica de líder. Tinha conhecido ele quando cheguei ao Santos em 2016, ele ainda era do sub-23. Conhecia de treinar junto, mas não cheguei a jogar profissionalmente, porque antes de subir ele foi para o Bahia. É um cara muito respeitado no clube. Estamos nos alinhando nessa função, eu de segundo volante, ele o primeiro, para que a gente se conecte o mais rápido e dê suporte ao restante do time".

Extra-campo e divergências atrapalham no Santos

Craque do Paulistão em 2019, Jean Mota continua em contato com os ex-companheiros de Vila Belmiro. Cita conversas frequentes com os atletas provenientes da base, como o atacante Ângelo. "É um menino que daqui a alguns anos vão falar muito dele".

Ao avaliar o momento do time, começando a temporada com nova troca de treinador, Jean Mota deixa escapar - mas não se aprofunda - em possíveis problemas nos bastidores.

"Eu, por ter estado cinco anos lá, eu sei muita coisa que acontece internamente - que não convém falar... Independente do extra campo, das divergências que tem ali, eles sempre entram em campo pra dar seu melhor. Muitas vezes não vai dar certo, mas estou sempre torcendo".

Seu melhor momento na Vila teve um argentino no comando, Jorge Sampaoli. O compatriota Fabián Bustos, novo comandante, tem sido motivo de comparações pelo estilo do hoje treinador do Olympique de Marselha. "A gente jogou contra ele no ano passado. Vimos que é um cara de qualidade. Espero que ele consiga, com os mais experientes e os meninos que estão subindo, colocar o Santos onde ele deve estar, brigando por títulos".