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Local de fundação do Vasco está em meio a impasse e com futuro incerto

Centro Cultural Cândido José de Araújo: local de fundação do Club de Regatas Vasco da Gama - Bruno Braz / UOL Esporte
Centro Cultural Cândido José de Araújo: local de fundação do Club de Regatas Vasco da Gama Imagem: Bruno Braz / UOL Esporte

Alexandre Araújo e Bruno Braz

Do UOL Esporte, no Rio de Janeiro

31/05/2022 04h00

Local de fundação do Vasco, o Centro Cultural Cândido José de Araújo, localizado na Gamboa, região central do Rio de Janeiro, se vê em meio a um impasse e tem futuro incerto, o que vem causando protestos de torcedores. O grupo Guardiões da Colina, que idealizou o projeto, entregou as chaves ontem (30) ao proprietário do imóvel, e o clube, agora, tenta viabilizar parcerias para voltar a utilizá-lo. A Ambev, que colaborou com a iniciativa, afirma que "acompanha a situação de perto".

A casa, localizada na Rua Sacadura Cabral - 345, foi esvaziada e até mesmo a placa de "Aqui nasceu o Vasco" foi retirada. Inaugurado em novembro de 2020, o empreendimento foi rapidamente abraçado pelos cruz-maltinos, que deram nome ao espaço e até mesmo auxiliaram na questão financeira, através de uma ação com o Zé Delivery.

"A gente manteve o espaço com vaquinhas e doações. Por mais que a gente tenha entregue a chave, o que aconteceu ali foi muito especial. O Candinho era aberto a todo mundo, todo mundo era muito bem recebido, e diversos grupos ajudaram. Após a eleição, a ideia era entregar o espaço ao Vasco, para que levasse à frente. E todas as chapas fizeram essa promessa de campanha, de continuar com o projeto. E assim foi feito. Após a eleição, fizemos todo o meio de campo", disse Raphael Pulga, membro do Guardiões da Colina, ao UOL Esporte.

Em março do ano passado, houve o primeiro problema com o local. A diretoria do clube não chegou a um acordo com o proprietário para o aluguel, e foi então que a Ambev resolveu ajudar.

Após ter ficado por um triz de ser desativado, o Candinho foi beneficiado por uma parceria entre o Vasco e a Brahma, que "bancou" um contrato de aluguel por um ano. Porém, para que tivesse as portas reabertas, seria necessário uma reforma estrutural, e foi então que surgiu a ação "Candinho — Nossa História Viva", na qual o torcedor contribuiu através de compras no aplicativo Zé Delivery. A meta de R$ 70 mil, com 14 mil cupons de R$ 5, inclusive, foi rapidamente batida.

O primeiro dos três andares do estabelecimento chegou a receber obras, no entanto, não voltou a funcionar. O prazo do aluguel pago se encerrou, e as chaves foram entregues. Agora, segundo o UOL Esporte apurou, a cúpula tem negociações em andamento para viabilizar a reabertura do local. Mas o assunto gera questionamentos sobre os recursos utilizados.

A diretoria vascaína entende que o valor apresentado para os aluguéis não se encaixa na atual realidade, mas entende que o local tem grande importância para a história do clube, e busca caminhos para manter o projeto

Questionada sobre a situação, a Ambev respondeu, em nota. "Não abrimos informações contratuais, mas o acordo para o Candinho foi cumprido, em prol da manutenção do local que é tão importante para a história do clube. Estamos acompanhando a situação de perto e esperamos que se resolva o mais rápido possível".

Durante o período de isolamento devido aos cuidados por conta do alto número de contágio do coronavírus, um tour virtual chegou a ser disponibilizado.

No endereço onde hoje é o Centro Cultural Cândido José de Araújo foi onde aconteceu a reunião de fundação do Vasco em 1898, e foi "descoberto" recentemente. Durante muito tempo, imaginou-se que o local de fundação do Vasco da Gama havia sido em outro ponto. Por conta da dificuldade de registros e documentos, por décadas, achou-se que a reunião que fundou o clube teria acontecido na sede da Sociedade Dramática Particular Filhos de Talma, importante reveladora de artistas amadores da época.

Um evento em 2011, com o presidente vascaíno da ocasião, Roberto Dinamite, aconteceu no local para celebrar o feito, inclusive.

O verdadeiro local foi conhecido e revelado tempos depois com a ajuda do historiador vascaíno Henrique Hubner, que já fez parte do Centro de Memória do clube. O nome do local foi escolhido em uma votação popular.

Quem foi Cândido José de Araújo?

Cândido José de Araújo, marcado, em um piquenique na Ilha do Engenho, em 1903, quando era tesoureiro do Vasco - Reprodução - Reprodução
Cândido José de Araújo, marcado, em um piquenique na Ilha do Engenho, em 1903, quando era tesoureiro do Vasco
Imagem: Reprodução

Candinho, como era conhecido entre os vascaínos, foi eleito em 7 de agosto de 1904, quando o futebol ainda não havia sido instituído no Vasco. Foi com ele que o clube conquistou seus dois primeiros títulos no remo, esporte tradicional da época. O bicampeonato foi fundamental para que o Cruz-Maltino aumentasse seu prestígio no cenário nacional.

Um ano antes de sua posse, foi o homem responsável por captar o maior número de sócios para o clube, feito que o fez receber como honraria uma medalha por sua contribuição ao Vasco.

Cândido José de Araújo, que era de uma família que ascendeu, se tornou o oitavo presidente do clube apenas 16 anos depois da abolição da escravatura, quando a sociedade carregava um extremo racismo.

Pequena África

O bairro da Gamboa, em que está a casa onde o Vasco nasceu, faz parte de uma localidade no Rio de Janeiro que ficou conhecida como Pequena África, que compreende ainda os bairros da Saúde, Santo Cristo e a zona portuária. Fica próxima ao Centro da cidade.

O nome de Pequena África foi dado pelo compositor Heitor dos Prazeres no começo do século 20 e já apareceu em algumas publicações, assim como músicas e enredos de Escola de Samba.

A região tem pontos como o Morro da Conceição, a Pedra do Sal, o Largo de São Francisco da Prainha, Cemitério dos Pretos Novos, o Jardim Suspenso do Valongo, e o Cais do Valongo, declarado Patrimônio da Humanidade em 2017, pelo Comitê do Patrimônio Mundial da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura).

A localidade tem grande importância na história da cultura afro-brasileira. Inaugurado em 1811, o cais foi o principal ponto de desembarque de escravos africanos nas três Américas. Naquela área, que ainda não era urbanizada, eram feitos o trânsito e o comércio de escravos.

Após a proibição do comércio de escravos no Brasil, escravos libertos passaram a trabalhar na região. Na virada do século 19 para o século 20, negros de diversas partes do país foram para a região em busca de trabalho e acolhimento.

Atualmente, há roteiros de visita pelos diversos pontos da Pequena África. Apesar da revitalização de alguns lugares, muitos locais importantes ainda sofrem com os recursos escassos.

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