Palmeiras revê palco de título 'surreal' no PR a um mês do 10º aniversário
Para Mazinho, a melhor definição é "surreal". Para o goleiro Bruno, o termo mais associado àquele título é "História". Em um mês, o Palmeiras vai comemorar 10 anos de uma de suas conquistas mais improváveis, no mesmo Estádio Couto Pereira em que hoje, às 18h (de Brasília), encara o Coritiba para retomar a liderança do Campeonato Brasileiro.
Em retrospecto, é difícil ponderar o que foi mais improvável naquele ano: se a conquista de uma Copa do Brasil na qual o Palmeiras foi azarão das quartas de final em diante —contra Athletico-PR, Grêmio e Coritiba— ou o rebaixamento do mesmo time à segunda divisão, quatro meses depois.
"Quando a gente ganhou [a Copa do Brasil], não dava para prever o que ia acontecer. Infelizmente, fomos esquecendo o Brasileiro. A gente ainda estava festejando, e a torcida já nervosa, pegando no nosso pé, pouco tempo depois", disse Mazinho ao UOL Esporte.
Nas redes sociais, é nítida a divisão entre os torcedores mais jovens e os mais velhos. Enquanto aqueles mais familiarizados com o período vencedor de 2015 para cá, por exemplo, esbravejam quando o Palmeiras bicampeão da Libertadores demora para contratar um centroavante de peso, os mais velhos se lembram bem de quando o time não apenas contratava, mas apostava alto em jogadores até talentosos, mas desconhecidos, como o "Messi Black".
"É difícil alguém, que foi direto de um [time] pequeno como o Oeste para o Palmeiras, não ficar deslumbrado. Cheguei e, pouco tempo depois, estava numa final de Copa do Brasil", conta Mazinho. "Mas eu acabei indo bem e fiz alguns gols", diz ele. Na primeira semifinal, Mazinho foi o autor, aos 40' do 2º tempo, do gol que abriu a vitória por 2 a 0 sobre o Grêmio, no Olímpico.
Com confiança, mas por uma bola
Aconteceram coisas impensáveis naquelas duas decisões com o Coritiba, como a apendicite de Barcos antes do primeiro jogo, bem como a expulsão de Valdivia, logo após abrir o placar. Mas, mesmo assim, o goleiro Bruno afirma que o Palmeiras viajou confiante para Coritiba, em função da vitória por 2 a 0, em Barueri, uma semana antes —o Allianz Parque ainda não estava pronto, e Felipão vetava que o time jogasse no Pacaembu.
"Não ter tomado gols no jogo de ida foi fundamental. Antes de viajar, treinamos bem em Barueri. Sabíamos que Curitiba estava com um tempo chuvoso e isso favorecia o nosso jogo", diz o goleiro Bruno. Não favorecia muito, porém, a saúde do zagueiro Henrique, que jogou a final com febre. Tampouco deu sorte a Thiago Heleno, que saiu com uma lesão na coxa esquerda na primeira etapa.
"É claro que fomos nos defender e jogar por uma bola, para dificultar ainda mais a tarefa do Coritiba, que tinha que buscar o resultado", conta Bruno
No lugar de Valdivia, o Palmeiras foi com Daniel Carvalho, que lutava para entrar em forma. E para o lugar de Barcos, mais uma contratação típica daqueles anos teve de ir a campo, o anônimo centroavante Betinho, recém-chegado do São Caetano.
"Eu me lembro de que ele [Betinho] estava muito nervoso. Se não me engano, ele nunca tinha sido titular antes", relembra-se Mazinho, atualmente sem clube, depois de jogar a A2 do Paulista pela E.C. Lemense. "Recebo propostas que não valem a pena. Prefiro ficar aqui. Estou sossegado demais", diz ele, que mora em Fênix, no norte do Paraná, perto de Maringá, e mexe com plantação de soja e milho.
"Calma, que o empate é nosso"
O Couto Pereira pulsava naquela noite de quarta-feira. Havia muitos palmeirenses, mas a torcida da casa fazia valer sua propriedade e a superioridade numérica.
"Lembro de entrar em campo para aquecer com o Carlão [preparador de goleiros Carlos Pracidelli], o campo estava molhado, e bem na hora que entramos começou a tocar rock, não sei se Iron Maiden ou AC/DC, que o Carlão sabia que eu gostava. Aquilo foi motivador, ali no campo, aquecendo, levando xingamento da torcida deles, aquela atmosfera de jogar uma final fora de casa", conta Bruno.
O jogo foi tenso. "Principalmente no 1º tempo, o volume de jogo deles foi muito grande", diz Bruno. "Mas a gente soube se defender e ainda quase abrimos o placar com o Betinho". No segundo tempo, porém, aos 16', o Coxa abriu o placar com gol de falta de Ayrton, que viria a jogar no Palmeiras.
"Quando saiu o gol deles, assustou. Mas a gente se reuniu e os mais experientes diziam pra gente se concentrar, porque o empate era nosso", conta Mazinho. "Em nenhum momento, deu desespero, ou a sensação de 'não vai dar'. A gente sabia que ia sair com o título. É claro que a torcida deles se inflamou, mas o gol do Betinho foi fundamental, porque praticamente decretou o título", completa Bruno.
Cinco minutos depois de o Coxa abrir o placar, Mazinho prendeu a bola pela direita do ataque e sofreu falta de Everton Costa na entrada da área. No momento em que o juiz apita, a torcida da casa começa a gritar "vergonha". Como se soubesse que da falta, considerada por eles duvidosa, sairia o gol do Palmeiras.
"Foi falta sim. Foi uma faltinha boba, mas foi. Pela TV, parece que não, mas ele chuta meu pé, e depois, a bola", garante Mazinho.
O medo maior dos paranaenses era Marcos Assunção acertar o pé e fazer mais um das dezenas de gols de falta por ele anotados naquele ano. E ele, de fato, acertou, só que um cruzamento. Que Betinho desviou de cabeça, de costas para o gol, entortando o pescoço para trás e matando o goleiro Vanderlei com uma bola no cantinho direito.
"A partir dali, o Felipão mandou a gente se fechar e marcar sem parar. Foi sufoco, mas eles vinham, e a bola saía em tiro de meta pra gente, um atrás do outro. E o estádio do lado deles foi murchando", relembra-se Mazinho.
"Não tem como explicar"
"Eu só queria sair correndo e gritar", relembra-se Mazinho, sobre o que fez após o apito final e o troféu garantido. "A certeza da vitória era tanta que o Felipão levou todos os jogadores para Curitiba, toda a comissão técnica. O Valdivia, suspenso, o Barcos, operado, o Marcos (aposentado)", relembra-se Bruno. "Até o Fábio e o Alemão, terceiro e quarto goleiros, também estavam lá".
"O avião, com todo mundo virado, foi uma bagunça só, cerveja, todo mundo tomando, menos eu, que não bebia na época. Depois de velho, aprendi a beber um pouquinho", conta Mazinho, entre risos. "A gente chegou direto para um caminhão de bombeiro. Fui dormir só na madrugada do dia seguinte", relembra-se.
"Foi fantástico. Era um sonho de criança para mim, que cresci como palmeirense e nunca escondi, poder dar essa alegria para meus pais e tios. Eles foram comemorar na avenida Paes de Barros, na Mooca. Fiquei muito feliz quando soube disso", diz Bruno.
"É, esse sentimento me deixa feliz até hoje, de ter entrado para a História do clube. Mesmo sendo um atípico, em que acabaríamos caindo. Foi um título muito importante para o Palmeiras, mesmo não sendo tão lembrado quanto outros. Havia 12 anos de jejum de títulos nacionais", diz Bruno. "Muita gente falou que a gente abafou a Libertadores que o Corinthians tinha ganhado uma semana antes", acrescenta.
Para muitos palmeirenses, a improvável conquista que se aproxima de 10 anos foi o primeiro título comemorado. "Pessoas até hoje me falam e agradecem, dizendo 'eu tinha 10, 15 anos, foi a primeira vez que eu vi o Palmeiras campeão', e isso é muito gratificante", diz Bruno, hoje técnico universitário de futebol, nos EUA, na Flórida.
"Para a minha carreira e para minha vida, não tem preço. Não tem nem como explicar", resume Mazinho.
FICHA TÉCNICA
CORITIBA X PALMEIRAS
Motivo: Campeonato Brasileiro, 11ª rodada
Estádio e Horário: Couto Pereira, 18h (de Brasília)
Árbitro: Leandro Pedro Vuaden - RS
Assistentes: Jorge Eduardo Bernardi e José Eduardo Calza - RS
VAR: Wagner Reway - PB
Palmeiras: Weverton; Marcos Rocha, Luan, Murilo e Piquerez; Danilo, Zé Rafael e Gustavo Scarpa; Dudu, Rony e Veron. Técnico: Abel Ferreira
Coritiba: Alex Muralha; Natanael, Henrique, Luciano Castán e Guilherme Biro; Val, Bernardo e Thonny Anderson; Igor Paixão, Adrián Martínez e Alef Manga. Técnico: Gustavo Morínigo
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