Maior goleador do Gauchão, Sotilli virou hit com perfil de humor nas redes
No Rio Grande do Sul, especialmente, mas em toda região, é raro alguém que não conheça Sandro Sotilli. Seja pelos gols quando atleta, afinal ele é o maior goleador histórico da primeira divisão do Campeonato Gaúcho, ou pelo perfil que bomba nas redes sociais: o Sandro Sotigol. Depois de pendurar as chuteiras, ele mantém uma página de humor focada no interior gaúcho e une até fãs que não o viram jogar.
Antes de chegar ao perfil —repleto de memes e brincadeiras voltadas ao público do interior gaúcho, com citações a bailão, rasante de quero-quero [ave típica do Sul], chimia [que talvez você conheça por geleia], cuca, linguiça, latão e muita bergamota [também chamada mexerica ou tangerina]—, Sandro Sotilli foi um jogador com carreira sólida nos campos do interior gaúcho. E é por ela que abrimos os trabalhos.
O goleador do interior gaúcho
Sotilli marcou 111 gols na primeira divisão do Campeonato Gaúcho. Com orgulho, ostenta o posto de maior goleador da história do torneio. "É um dado estatístico", brincou. "Eu joguei as três divisões do Gauchão".
E foram muitas vezes. Artilheiro isolado foram duas, em 2002, pelo XV de Campo Bom, e em 2004, pelo Glória de Vacaria, quando marcou 27 gols numa única edição do campeonato, ficando um atrás do maior goleador de uma única edição da história do torneio, que foi Baltazar, do Grêmio, com 28 gols. Sotilli teve ainda ao menos mais 10 participações no campeonato, por diversos times. "É mais fácil perguntar em quais eu não joguei, daí a lista fica menor", disse bem-humorado.
"Para quem tinha o sonho de ser jogador, chegar numa marca tão expressiva, olhar para trás é ver que tudo valeu a pena. Cada gol tem um significado muito importante. Como eu sou gaúcho, valorizo muito isso, ser goleador do meu Estado. Fui campeão do Gauchão com o Juventude, e isso agrega muito", completou.
A carreira se construiu basicamente no Rio Grande do Sul. Em 1997, ele defendeu o Inter, mas não teve muita sequência.
"Um dia eu estava treinando em Erechim, no Ypiranga, e no outro estava treinando com Gamarra, Christian, Fabiano, Arilson, foi uma mudança muito grande. Eu comecei tarde no futebol, com 19 anos, não tive muita preparação, e, naquela época, não havia o que tem hoje, de acompanhamento. Foi bom jogar no Inter para minha carreira, mas não tive muita sequência", lembrou, admitindo que não estava pronto para aquela oportunidade. Fora do Estado, atuou na Chapecoense, no Ceará, no Paulista, além de clubes do México e da China.
Convite para 'churrasco de cachorro'
"Fui um dos desbravadores do futebol chinês. Naquela época, era muito diferente de hoje. Não tinha salários milionários, nada disso", lembra o ex-atacante que hoje tem 48 anos.
Ele chegou ao Beijing Guoan no ano 2000. Em 2002, defendeu o Shaanxi Guoli. "Eu digo que o futebol tem etapas para o ego. A primeira é jogar no Brasil, ser profissional. Depois é fazer gols, e a terceira etapa é jogar fora do país. Naquele momento, realizei um sonho, mas nunca poderia imaginar que seria na China", brincou.
E se hoje em dia ainda tem jogadores que sentem o peso da adaptação, imagine há mais de 20 anos. Logo de cara, o cardápio era "assustador", e mesmo que tenha tentado variar na proteína, nem todas foram tão bem aceitas assim.
"Eu provei muita coisa. Cobra, tartaruga... Lembro que classificamos para a final da Copa da China e eu fiz o gol de ouro, que tinha na época [modelo de classificação no qual o time que marcasse primeiro na prorrogação levava a vitória]. Eu cheguei no vestiário e estavam todos contentes. Perguntei para o intérprete o que houve e ele me disse que o presidente tinha dobrado a premiação porque chegamos na final, e que estava tudo liberado para irmos na churrascaria... Mas lá, a churrascaria era com carne de cachorro [risos]. Falei na hora que iria para o meu hotel, comer meu lanche e dessa eu estava fora [risos]."
Fim da carreira, redes sociais e o Sotigol
Os anos passaram e o fim chegou. A carreira de Sandro Sotilli durou até 2014, quando se aposentou pelo Pelotas. E ali, meio que sem querer, um rumo nada comum se apresentou para ele: o humor. Foi graças a um encontro inesperado com Bruno Pires Schroder (juntos, na foto acima) que nasceu o Sotigol.
"Era 2013 e eu tinha 17 anos. Eu queria fazer um perfil para colocar minhas ideias, umas piadas, envolver a cultura gaúcha e o futebol. Tudo que envolve o tradicionalismo. Queria um perfil que unisse isso tudo, são todas coisas que eu gostava", contou Bruno ao UOL Esporte.
"Quando eu comecei a fazer, ele [Sotilli] ainda jogava, estava no Marau. Fiz umas piadas, criei o personagem dele, e viralizou. Em 2014 que explodiu com as piadas de latão, rasante de quero-quero, bandinha, as cornetas. Ele começou a ser mais lembrado pelas piadas do que pelo futebol, e depois fizemos uma parceria dentro da parte de rede social, porque a página viralizou e começamos a comercializar", completou o cérebro por trás das piadas, que é veterinário de profissão.
No início era Bruno se passando por Sotilli, sem que o ex-atacante tivesse qualquer contato. Mas a aceitação foi tão grande que a inspiração abraçou o personagem. "Começou no Twitter, mas nos conhecemos em junho [de 2014], depois veio Facebook, Instagram, e as coisas foram acontecendo. Ele me perguntou se eu queria que ele parasse, mas disse que não, eu gostava. Passou um ano e a gente começou a rentabilizar com marcas de produtos. Hoje tem público em todo lugar", contou Sotilli.
Só no Instagram, Sotigol tem 378 mil seguidores. São mais 506 mil no Twitter e outros 763 mil no Facebook. Atualmente, sobram patrocínios e realiza até eventos como lives durante a pandemia, a Sotilli Fest, o Bailão do Sotilli, partidas de futebol beneficentes, entre outras atividades.
"Eu costumo dizer que entro com a beleza e ele [Bruno] com a criação de conteúdo [risos]. Estamos muito felizes e satisfeitos com a aceitação. Eu vou a muitos eventos, ele tem a medida certa das redes sociais, as pessoas gostam. Eu tenho contato com o público, e este é nosso parâmetro", disse Sotilli, que acredita que muitos dos seguidores nem sequer o viram jogar, mas acompanham pelo humor.
O perfil é destinado a situações da cultura gaúcha. Abusa de termos do interior, produz vídeos, memes e publicações relacionadas a futebol sempre que possível: a famosa corneta.
"O processo de criação vem muito da minha profissão. Eu trabalho numa multinacional na área de veterinária, e tenho muito contato com pessoal do interior. Cada bordão que escuto, vou pensando em colocar no contexto. É natural, seguimos na mesma linha até hoje", comentou Bruno.
"Tem tudo para durar bastante tempo. É informação, com humor. Tentamos atender todo mundo, sem agredir ninguém. É tudo numa boa, sempre como brincadeira. Não foi uma escolha, as coisas foram acontecendo. Eu falo que temos que surfar na onda. Não sei quanto tempo vai durar, um ano, 10 anos, o que vai acontecer. Mas estamos nos divertindo muito e rentabilizando. Assim é legal, vamos inovando e o público segue aumentando", contou Sotilli.
Entre os últimos a aderirem ao "estilo Sotigol" estão os atacantes do Inter Alemão e Pedro Henrique. A dupla de "gringos do interior" empilha citações à página em suas redes sociais e segue no embalo da "chimia com bergamota".
"Nós gaúchos somos bairristas gostamos de valorizar a nossa cultura. E quem sai do Estado, sente saudade disso. Por isso temos público no Mato Grosso, na Bahia, em vários Estados. Nós ficamos muito felizes", contou Sotilli.
"Hoje tem muita gente que lembra mais dele [Sotilli] na parte humorística do que como ex-atleta. Falam em blogueiro, influencer, mas, na verdade, ele é um ex-atleta. Eu só agradeço ao Sotilli por toda abertura que me deu. Ele sempre escutou, nunca restringiu a parte criativa, nunca podou nada, sempre foi muito aberto, vestiu a camisa do personagem. Quem conhece ele sabe que é extremamente humilde, trata todo mundo igual, e ele é assim, gosta de bandinha, gosta da corneta, disso tudo. A imagem do perfil casou totalmente com ele", finalizou Bruno.
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