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Como a volta de Suárez pode ajudar a tirar o futebol uruguaio de crise

Luis Suárez tem acerto para jogar no Nacional, do Uruguai, até o fim deste ano - Divulgação/Puma
Luis Suárez tem acerto para jogar no Nacional, do Uruguai, até o fim deste ano Imagem: Divulgação/Puma

Marinho Saldanha

Do UOL, em Porto Alegre

28/07/2022 04h00

Luis Suárez está de volta ao Nacional após 15 anos. Depois de confirmar em vídeo que tem acordo com o clube, o regresso do Pistolero, oficializado ontem (27), é o principal assunto no Uruguai. E isso vai muito além do campo. Ter novamente um jogador deste calibre nos pobres campos do país vizinho movimenta uma gama de patrocinadores, sócios e atrai atenção do mundo todo.

Suárez poderá, então, salvar o futebol uruguaio? Tudo indica que sim. O vídeo de Suárez não virou apenas notícia ao redor do planeta, mas ganhou reações de celebridades do mundo da bola, como Messi e Neymar. Até o presidente do país, Luis Lacalle Pou, 'curtiu' a publicação.

Além da celebração e do que Suárez poderá contribuir com o time em campo está um cenário de futebol sucateado que precisa investir em estrutura e atrair patrocinadores para deixar de perder jogadores talentosos tão cedo para países vizinhos e outros mercados.

Uruguaios em crise

Não há um time do Uruguai campeão da Libertadores desde 1988. O último finalista foi o Peñarol, que perdeu para o Santos em 2011. Na Sul-Americana, nunca houve campeão do país.

A falta de títulos recentes no âmbito continental revela um futebol que se sustenta em tradição, mas deixou de figurar entre os mais competitivos do continente. A crise no futebol uruguaio tem como razões a condição financeira inferior dos clubes, com contratos de patrocínios e televisionamento bem abaixo dos principais centros do continente, como Brasil e Argentina.

"Hoje estamos muitos escalões abaixo de outras Ligas, como Brasil e Argentina. Em infraestrutura, em potencial econômico, em campos de jogo, em qualidade do futebol. A chegada do Suárez vai potencializar muita coisa", contou o jornalista Rodrigo Vázquez, da Rádio Sport 890 ao UOL Esporte.

Desta forma, talentos uruguaios que surgem facilmente pelo país ao sul do Brasil logo se despedem para outros mercados. Se é duro aos uruguaios concorrer com brasileiros e argentinos, há outros compradores bem mais robustos. Jogadores com idade inferior a 20 anos brotam aos montes em equipes da MLS (Liga Norte-Americana de Futebol). E, é claro, a Europa consome o que há de melhor na produção de atletas.

"Não podemos nos enganar. A dura realidade é que a Liga do Uruguai não é muito competitiva. Entre os países da América do Sul, talvez estejamos atrás de Brasil e Argentina, que estão em outro patamar, além de Chile e Colômbia. Nosso campeonato não é muito competitivo, nosso futebol é mais doméstico, caseiro", completou o jornalista Martín Gómez de Freitas, da Rádio Vichadero.

Suárez já rende mais de R$ 1 milhão

Dar suporte financeiro aos clubes é o principal 'rebote' da chegada de Suárez. Se bastou um vídeo, que sequer oficializava seu retorno, para todas as atenções do planeta voltarem-se ao Nacional, imagina a entrada dele em campo, a viagem aos demais campos — normalmente precários — do país, ou a presença em jogos internacionais.

"Todo o mundo agora olha para o Uruguai. É uma contratação de olho na Copa do Mundo. Em outros países o Suárez não seria tratado como aqui. O Nacional não vai pensar apenas no jogador Suárez, mas na seleção uruguaia, nele como pessoa... Ele não será exposto e vai subir o patamar do futebol uruguaio", disse Martín.

O Nacional, antes mesmo de sequer ter o jogador no país, já começou a monetizar a presença. Desde ontem (27), longas filas se formaram na sede do clube. São torcedores que querem ser sócios para acompanhar os jogos do maior goleador da seleção nacional de perto.

Luís Suárez em ação pelo Nacional, do Uruguai, em 2006 - Divulgação/Site oficial do Nacional - Divulgação/Site oficial do Nacional
Luís Suárez em ação pelo Nacional, do Uruguai, em 2006
Imagem: Divulgação/Site oficial do Nacional

"Em 24 horas, 700 novas cadeiras no Parque Central já foram vendidas, totalizando aproximadamente US$ 240 mil [cerca de R$ 1,2 milhão na cotação atual] para o Nacional. De ontem [segunda] até hoje [terça], cinco mil novos sócios firmaram ligação com o clube. E o sócio no Nacional não paga mês a mês, mas tem obrigação de pagar o ano inteiro na entrada", comentou Vázquez.

A chegada dele foi acompanhada de uma grande mobilização da torcida. Nas redes sociais, a hashtag #SuárezANacional esteve entre os assuntos mais citados no mundo, além de se manter como o tema mais abordado na região nos últimos cinco dias. Tudo partiu de uma mobilização voluntária da torcida, sejam anônimos ou torcedores famosos do Nacional, como comunicadores e políticos do país. E, quando aceitou o regresso, Suárez disse que a decisão partiu do sentimento recebido em tal manifestação.

"Foi a torcida do Nacional que impulsionou a chegada do Suárez, e ela poderá desfrutar dele em campo. Certamente no jogo contra o Atlético-GO [terça-feira, pela ida das quartas de final da Copa Sul-Americana], os ingressos estarão esgotados. O marketing já está trabalhando muito, e já há muitas camisas dele sendo vendidas, além das cadeiras vendidas no estádio e dos novos sócios", disse Martín.

Pelo interesse, a campanha voluntária de sócios também tomou a mídia, atraindo ainda mais fãs para o clube.

O regresso já virou, também, propulsor do futebol uruguaio. Novos patrocinadores se movimentam para fixarem seus nomes junto da Liga do país e os contratos de televisão também devem crescer.

Patrocínios? Parceiros!

E não são só patrocinadores que chegam ao Uruguai agora atraídos por Suárez. Uma campanha entre torcedores do Nacional tem desejo ainda mais ousado. Os aficionados mobilizam-se nas redes sociais para convencer mais um craque da seleção que está sem clube a voltar ao país e formar dupla de ataque no Nacional, como na seleção: Edinson Cavani. A chance, porém, é pequena de sucesso.

O presidente do Nacional, José Fuentes, dará ao Pistolero o maior salário do futebol do país, ainda que seja inferior ao que ele recebia em outros países. O vínculo do atacante de 35 anos com o Nacional será apenas até o fim de 2022 e está presente nas cláusulas do contrato a liberação para a seleção em todas as convocações.

"Ele [Suárez] abriu mão de muito dinheiro para vir jogar no Nacional. Sua chegada não será positiva apenas para nossa torcida, mas para todo o país. Vamos trabalhar para esta chegada, temos algo planejado, mas é importante que a torcida saiba que é muito importante", explicou Fuentes ao El País.

Expectativa pela chegada

Suárez é esperado para realizar exames e assinar contrato. O clube prepara uma grande festa para a apresentação do ídolo. "Vamos receber o Suárez como ele merece", disse o presidente do clube.

Outro reflexo positivo foi a mobilização do país pelo futebol. Desde que o sonho de ter o craque novamente jogando 'em casa' se tornou realidade, Suárez toma o noticiário dos meios de comunicação uruguaios. Todo o país se mobiliza para saber em quais estádios ele jogará. O jornal El País, inclusive, comenta que o 'efeito Suárez' deve ocasionar a mudança de local de muitos jogos pela expectativa de crescimento de público nas partidas, outra influência positiva dele no ambiente esportivo de seu país.

"O ambiente no Nacional é muito bom para ele, e em outros clubes também. Vários presidentes estão alinhados sobre este tema, se preparando para receber o Suárez, empolgados com a venda de ingressos e a visibilidade que isso terá no mundo. Em todos os pontos de vista, é muito bom para o futebol uruguaio", salientou Vázquez.

O jogador deve participar de aproximadamente 15 jogos pelo clube, e já tem confronto com brasileiro agendado, o Atlético-GO, pela Sul-Americana.