Atacante foi vendedor de doce e cumpriu promessa ao assinar com o Botafogo
O sorriso ainda meio sem graça e o tom de voz baixo são ingredientes de uma notória timidez. Recém-contratado ao sub-23 do Botafogo, Janderson ainda busca se acostumar à nova realidade, que contrasta com um passado não muito distante. Os pés que hoje fazem a bola estufar as redes adversárias já deram muitos passos pelas ruas de bairros do Rio de Janeiro enquanto o jovem vendia diversos tipos de doce.
O Alvinegro, inclusive, representa mais do que o primeiro clube grande na ainda curta carreira de Janderson. Vestir a camisa do Alvinegro foi a realização de um sonho e o pagamento de uma promessa feita a um amigo que ele perdeu há quase dois anos.
Nascido em São João de Meriti, Baixada Fluminense, Janderson iniciou no futebol como a maioria dos meninos, em uma escolinha na região onde morava. Após passagem por dois clubes, porém, viu as dificuldades financeiras baterem à porta da família, e decidiu tomar um rumo longe dos gramados.
"Comecei lá onde eu moro, na L.M.O [L.M.O Formação de Atletas]. De lá, me levaram para o Artsul e, depois, fui para o Audax-RJ, onde fiquei quatro anos. Do Audax eu parei de jogar bola. Bateu o desânimo. Quando a gente é novo... Na época, nestes times de menor investimento, jogadores de categoria inferior não recebiam. Eu passava dificuldades dentro de casa. Não tinha o que comer, o que vestir, e me bateu na cabeça que eu tinha de parar de jogar e procurar um trabalho", lembra.
Sem vagas mais concretas no mercado de trabalho, o jovem foi vender doce, com um extenso roteiro que começava em Madureira (zona norte do Rio), e ia até a Freguesia, em Jacarepaguá (zona oeste), passando por pontos como Campinho, Taquara e Praça Seca.
"Como não estava conseguindo emprego com carteira assinada, agarrei a caixa de doce e fui para a rua vender. É sofrimento, mas valeu a pena. Eu fazia um dinheiro justo. Dentro de casa, estava precisando. Foram uns dois anos e pouco assim", lembra.
Mas a história de Janderson no futebol não tinha ganho um ponto final. Surgiu a chance de defender o Angra dos Reis, e ele topou retornar. Vestiu ainda a camisa do Duque de Caxias até chegar ao São José, do Maranhão.
"Fiquei vendendo doce na rua, tinha parado mesmo, mas aí apareceu uma oportunidade de ir para o Angra dos Reis. Não pensei duas vezes. Fui bem lá, encontrei esse empresário [Marcos Bonfim] que hoje está me ajudando, e fomos caminhando. Ele me levou para o Duque de Caxias e, depois, fui para o Maranhão", conta.
No período em que defendeu o São José, o atacante recebeu uma triste notícia, e foi neste momento que o Botafogo passou de apenas um sonho para uma meta na carreira. Da Fúria [um torcedor fanático do Fogão], tinha um time de várzea e sempre chamava Janderson para jogar, fazendo com que um laço de amizade fosse criado. Nos contatos que tinham, ele mostrava vontade de ver o jovem em seu clube do coração:
"Eu viajei para o Maranhão e lá eu recebi a notícia [da morte do amigo]. Fiquei chateado demais, e foi aí que me dediquei ainda mais. Ele era um torcedor fanático do Botafogo e sempre falava que ia me ver no Glorioso. Eu tinha prometido a ele que ia jogar no Botafogo e me dediquei bastante, trabalhei duro para isso."
Janderson ainda vestiu a camisa do Bahia de Feira, que chegou às oitavas de final da Série D do Campeonato Brasileiro, antes de desembarcar em General Severiano.
No Glorioso, integra o elenco do sub-23, que é comandado pelo técnico Lucio Flavio, ex-meia com passagem marcante pelo próprio clube. Após a eliminação no Brasileiro da categoria, a equipe vem realizando amistosos e dando prosseguimento ao projeto desenhado por John Textor, que não esconde a possibilidade de utilizar o grupo no próximo Carioca.
"Primeiramente, quero agradecer ao Botafogo pela oportunidade. É um sonho de criança defender um clube deste tamanho. Quero dizer que não vai faltar garra e força de vontade. Vim para fortalecer o grupo, para ajudar a equipe, para conquistarmos muitas coisas, e fazer gol, que é meu forte (risos)", indicou.
"[Lucio Flavio] É um treinador excelente. O trabalho dele nos ajuda bastante, ele gosta de muita dinâmica. Eu vi ele jogando, era bom demais (risos). Estou me adaptando, cheguei agora e estou me adaptando. Estou pegando o trabalho do professor, o jeito que ele gosta. Lá na frente, vou pegando o que ele passou e criando oportunidades", completou.
Mas se Janderson fala no futuro, também não esquece totalmente o passado. O jogador fez questão de chamar Nario Marinho, amigo de infância e que esteve ao lado dele no período em que era vendedor de bala. O companheiro acompanhou as respostas do atacante e parecia reviver tudo aquilo que estava sendo contado. Quando chamado a falar, porém, não escondeu a emoção e foi às lágrimas:
"Fico muito alegre por ele. Desde pequeno... A gente passou sufoco junto, vendia doce para cima e para baixo. Às vezes, comprava uma quentinha e comia eu, ele e meu irmão... Eu não consigo nem falar".
O atacante ainda tem objetivos a cumprir, mas um deles é o que está em seu topo da lista de desejos. "Quero construir a casa da minha mãe. A gente passava muita dificuldade e, quando eu estava fora, minha mãe falou que a casa dela estava rachando. Isso ficou comigo. Minha mãe merece e estou fazendo o melhor possível para construir a casa dela, realizar o sonho dela", concluiu.
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