Carlos Alberto virou capita por se opor à queda no bicho 'causada' por Pelé
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O filho conta a história de seu pai. E a preferida do ex-zagueiro Alexandre Torres a respeito de Carlos Alberto Torres é de quando um dos maiores laterais-direitos da história do futebol se tornou capitão do Santos de Pelé.
O enredo, ao fim das contas, mostrou que se não fosse um episódio em 1968, provavelmente não seria Carlos Alberto o homem a erguer a taça Jules Rimet na conquista do tricampeonato mundial da seleção brasileira, em 1970. E é possível entender o motivo.
A capitania no Santos, de início, não foi resultado de uma situação harmônica. Havia desconexão entre diretoria e jogadores de um dos maiores times de todos os tempos.
O volante Zito fora por anos um líder e o capitão do Peixe. Fez 733 jogos com a camisa santista e não por acaso se tornou lenda. Mas a aposentadoria ao fim de 1967 deixou uma lacuna naquela equipe cheia de craques. A capitania rodou por vários jogadores do elenco até o dia em que um impasse foi criado no grupo.
O time iria para mais uma excursão no exterior e a diretoria santista negociou um aumento do bicho pago a Pelé, individualmente. Só que para custear o valor extra ao camisa 10, os cartolas da época resolveram reduzir o que os demais jogadores receberiam.
"Ele já comprou briga de muitos jogadores", diz Alexandre Torres, ao UOL.
Bem, aquela de 1968 foi uma dessas.
O time ficou indignado e bateu o pé. No debate entre os jogadores, o grupo se dispôs a não viajar. Todos se sentiam injustiçados. Coube a Carlos Alberto, já um dos líderes e há três anos no time, fazer o comunicado a quem mandava no clube. O lateral, então com 23 anos, foi à sala de Athiê Jorge Coury, que presidiu o Santos de 1945 a 1971, e colocou a posição do grupo. Ouviu em resposta que haveria uma reunião após o treino.
Quando o cartola se colocou diante dos jogadores e perguntou quem não iria viajar, Carlos Alberto levantou a mão, imaginando que todos ficariam firmes na reclamação. Enganou-se. O lateral se posicionou sozinho.
Por isso, o dirigente santista o chamou para uma conversa posterior. Torres já ficou preocupado com o que poderia acontecer. Seria uma dispensa? Em casa, mulher e dois filhos para criar. Se o Santos quisesse, poderia complicar a carreira dele, já que ainda existia o passe, meio de fixar jogadores a clubes.
"Meu pai disse que entrou, andando devagar, perto da mesa. O diretor levantou e aí deu parabéns. 'A partir de agora, você vai ser o capitão e o único a ganhar o bicho normal'. É uma boa história. Mostra que ele era firme, segurava a onda", diz Alexandre Torres.
Da frustração ao beijo na taça
Carlos Alberto carregou consigo a capitania desde a formação como jogador. Ele exerceu essa função na base do futebol e na seleção brasileira que conquistou o ouro nos Jogos Pan-Americanos de 1963, em São Paulo.
Antes do auge na única Copa do Mundo que disputou, Carlos Alberto Torres viveu a frustração de não ser chamado para o Mundial de 1966, na Inglaterra. Djalma Santos, veterano bicampeão do mundo, foi o titular na maioria dos jogos. Como segunda opção, o técnico Vicente Feola escolheu Fidélis, do Bangu, que até atuou na partida de eliminação do Brasil, diante de Portugal.
Carlos Alberto foi capitão da seleção pela primeira vez logo no quarto jogo com a Amarelinha: vitória em um amistoso contra a Hungria, no Pacaembu, por 5 a 3, em 1965. Ele recuperou essa condição em junho de 1968, quando o Brasil era comandado por Aimoré Moreira. Os sucessores João Saldanha e Zagallo mantiveram a capitania com o lateral no ciclo que culminou com o tri. O motivo para ele estava claro:
"Foi o fato de eu ser capitão do Santos, talvez o melhor time", disse Capita, numa entrevista à CBF em 2015.
Na seleção, a liderança era exercida de várias formas. Uma delas foi a liberdade de participar do bloco que sugeriu a Zagallo que não escalasse Marco Antônio na lateral-esquerda, e, sim, Everaldo. Para Capita, "Marco Antônio estava empolgado, de sapato alto" e disse que Everaldo era "mais experiente e mais responsável".
Na Copa de 1970, o golaço que deu toques finais a goleada por 4 a 1 na final diante da Itália é o símbolo do futebol-arte do Brasil na ocasião. Um time irresistível.
Mas Capita mostrou no jogo contra a Inglaterra que também sabia fazer o trabalho "sujo". O confronto ainda estava tenso, empatado sem gols e os atuais campeões do mundo pressionavam o Brasil. Em uma dividida no ataque, Francis Lee atingiu a cabeça do goleiro Félix com um chute.
Carlos Alberto foi um dos que tiraram satisfação com o atacante inglês. Não demorou muito, o troco veio. Desengonçado para dar um pontapé, Torres fez uma falta dura em Lee. Capita dizia que nem sabia bater direito. Pensou que seria expulso, mas ficou em campo. O Brasil cresceu no jogo e venceu por 1 a 0, gol de Jairzinho.
"Capita elogiava quando tinha que elogiar e chamava a atenção quando tinha que chamar. Sempre foi um cara disciplinador, incentivador, foi um cara de muita qualidade e técnica. Era um lateral difícil de ser driblado. Além de ter um bom posicionamento, tinha uma recuperação de alto nível. Tinha boa colocação, sabia ser lateral, volante e meia, tanto que fez gol lá. Ele sabia ser capitão", disse ao UOL o Furacão da Copa de 70.
A imagem final do Capita na Copa é o beijo na taça, algo que ele disse ter inaugurado, assim como Bellini foi o primeiro a levantar o troféu acima da cabeça, em 1958.
Carlos Alberto Torres morreu em 25 de outubro de 2016, após um infarto. Ninguém no futebol brasileiro se tornou sinônimo de "Capita" como ele. É por isso que o filho Alexandre, os netos e quem mais ama futebol contam e recontam suas histórias.
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