Pelé inaugurou ação de marketing com chuteira e abriu guerra entre gigantes
Entre tantos feitos do camisa 10 mais famoso do mundo está também o fato de ter inaugurado o "marketing de guerrilha". Durante a Copa do Mundo de 1970, Pelé, que morreu na última quinta-feira, assinou contrato de patrocínio para usar a chuteira Puma King e quebrou o "pacto Pelé", um acordo informal entre as empresas de material esportivo Puma e Adidas que visava não contratar o jogador.
- As duas empresas alemãs de material esportivo tinham uma rivalidade que transcende o negócio. Nos anos 20, os irmãos Adolf (Adi) e Rudolf Dassler criaram a Adidas na pequena cidade alemã de Herzogenaurach. A Adidas cresceu e foi pioneira na Olimpíada de Berlim, em 1936. Mas com o início da Segunda Guerra Mundial, e o fato de Rudolf ser recrutado para defender as trincheiras alemãs durante o confronto, a situação começou a mudar.
- Depois da Guerra, os irmãos se separaram e Rudolf criou primeiro a "Ruda", que depois virou a Puma. E iniciou-se uma briga entre as duas companhias pela hegemonia na confecção de materiais esportivos. Passaram a contratar esportistas e para ampliar as marcas. Mas estabeleceram uma "regra", que era não abordar Pelé. Imaginavam que assinar com o atleta do século levaria as empresas à falência.
- Na Copa de 1970, no México, Adolf e Rudolf não estavam mais à frente das empresas, que eram administradas pelos filhos de ambos, Horst e Armin, respectivamente. Horst se aproximou das federações esportivas e conseguiu fechar um contrato de exclusividade com a Fifa, que perdura até os dias de hoje.
"Ao que tudo indica, a Puma enviou um representante da empresa para a seleção brasileira e após algumas negociações Pelé aceitou um lucrativo acordo para vestir chuteiras Puma. A Adidas ficou naturalmente furiosa porque a Puma violou o 'Pacto Pelé' e a feroz rivalidade entre as duas empresas recomeçou", conta ao UOL Mario Leo, CEO da RESULT Sports, uma empresa que coleta e analisa dados e estatísticas digitais de esportes com sede na Alemanha.
De acordo com Barbara Smit em seu livro Sneaker Wars: The Enemy Brothers Who Founded Adidas and Puma and the Family Feud That Forever Changed the Business of Sports (Guerra do tênis: os irmãos inimigos que fundaram a Adidas e a Puma e a rivalidade familiar que mudou para sempre o negócio dos esportes, em tradução livre), Pelé recebeu US$ 120 mil (algo perto de US$ 1 milhão corrigidos para os dias atuais, ou R$ 5,2 milhões) para ser o "outdoor" da chuteira por apenas alguns segundos.
Assim, criou-se a icônica cena de Pelé ajoelhando antes do início do jogo contra o Peru, quando o camisa 10 amarrou pacientemente sua chuteira. A cena foi registrada pelas câmeras da transmissão e retransmitida ao vivo mundo afora — a Copa de 1970 foi a primeira a ser transmitida ao vivo —, e reabriu a crise entre as empresas de material esportivo Adidas e Puma. Pelé, então, inaugurou uma nova modalidade, a do patrocínio pessoal. Que cresceu e hoje contempla jogadores mundo afora.
"Terminada a sua fantástica carreira de jogador, Pelé manteve-se muito próximo do futebol! Tornou-se um especialista em TV, não só no Brasil, mas em emissoras do mundo todo. Durante a Copa do Mundo de 2006 na Alemanha, acompanhei sua análise pela TV alemã. Foi um ícone global, o que o tornou também muito interessante para marcas e produtos. Ele viveu dessa fonte de renda por décadas após sua grande carreira", analisa o especialista em marketing esportivo.
A parceria com a Puma continuou por toda a vida do Rei do futebol. E quase 50 anos depois, a marca alemã assinou contrato com Neymar, atual camisa 10 da seleção brasileira.
"Se Pelé pudesse jogar hoje, estaria no Top 5 dos maiores patrocínios globais. Seu legado e marca permanecerão relevantes. O mundo inteiro, desde jogadores antigos e atuais, clubes, ligas e federações mudaram seu conteúdo de mídia social para lamentar a morte de um ícone e lenda global. Seu legado viverá para sempre, pois o esporte e principalmente a família do futebol valorizam a contribuição de Pelé para o futebol, como jogador e depois de sua carreira como embaixador e pessoa", finaliza Mario Leo.
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