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'Temos que pagar': o que disseram Cuca e os outros 3 no escândalo de Berna

Cuca, técnico do Corinthians, durante jogo contra o Remo na Copa do Brasil - Ettore Chiereguini/AGIF
Cuca, técnico do Corinthians, durante jogo contra o Remo na Copa do Brasil Imagem: Ettore Chiereguini/AGIF

Marinho Saldanha

Do UOL, em Porto Alegre

29/04/2023 04h00

Diferente do que acontece hoje, Cuca, Eduardo, Fernando e Henrique não se esquivavam de perguntas sobre o que aconteceu no quarto 204 do Hotel Metropole, em Berna, na Suíça. A acusação de violência sexual contra menor aos quatro, que na época defendiam o Grêmio, gerou declarações que mostravam algum arrependimento, mas principalmente detalhavam sofrimento na prisão.

O que eles disseram (entrevistas ao jornal 'Zero Hora' em 31 de agosto de 1987)

Cuca pensou no pior. "Jamais pensei que uma coisa assim pudesse acontecer comigo. Não sei se foi ato infantil, um passo em falso, mas é difícil julgar os 50 dias em poucos minutos. Só posso garantir que isso nunca se repetirá. A tensão e a angústia quase me mataram. Se tivesse que ficar preso, eu preferia morrer. Eu pensava na minha mulher, quase nunca dormia. Quando conseguia, acordava, passava a mão do lado e não encontrava a Rejane. Aí me batia o desespero. Passei 10 dias sem falar nada e só me acalmava com injeções e sedativos. Cheguei ao desespero, cheguei a desacreditar em Deus, mas só podia falar com ele, por isso minha fé foi reafirmada. Foi um longo martírio de reflexão... Tive medo de ficar traumatizado sem saber qual a reação das pessoas, dos torcedores, dos dirigentes. Estou de braços abertos para qualquer decisão. Temos que pagar, todos os envolvidos. Não adianta separar menor ou maior participação"

Eduardo admite falha. "Esse fato mudou toda minha vida. Amadureci muito e nunca serei o mesmo... Naquela cela de dois por três metros com uma pia, vaso e cama, passei os piores momentos da minha vida. Eu estava sozinho, não falava com ninguém, nem saía, só para falar com advogados, uma única vez vi outros presos. Eu estava tenso e angustiado. Duas vezes que me tiraram sangue, senti formigamento e caí desmaiado. Tinha vontade de berrar, gritar, mas isso poderia me prejudicar, então passei a escrever. Depois de quatro dias comecei a escrever, e escrevi muito. Chorava toda hora que pensava como meus pais estavam em Porto Alegre. Sei que falhamos, mas somos humanos. Pensei muito no prejuízo que causamos ao Grêmio e aos companheiros neste sentido psicológico. O conselho que dou a um atleta jovem é: pense muito na vida antes de fazer algo que possa ser errado"

Fernando chorava muito. "Nunca vou esquecer o que passei na prisão da Suíça. Não tenho ideia do que o Grêmio vai fazer comigo, e o que decidir, vou aceitar. Mas tenho certeza que nada pode ser pior do que ser preso... Nos primeiros dias não comi. Nunca fui espancado ou maltratado pela polícia, mas era uma solidão... Eu chorava muito, dormia mal e só uma vez vi o sol. Apesar de ser um sujeito alegre e saber que não havia feito nada grave, cheguei a ficar desesperado e com medo de nunca sair dali. Sei que todo o Brasil soube do caso e espero que isso não prejudique minha carreira. Agora é aguentar essa barra"

Henrique, o religioso. "Não sei como classificar esse caso. Penso que foi uma espécie de brincadeira que terminou como um pesadelo. Eu não podia imaginar as consequências, mas quanto estava na prisão em Berna, sozinho num espaço de três metros por dois, com apenas uma janelinha para o corredor, pensei muito. Perdi peso, estou um bagaço fisicamente, mas acho que vou me recuperar. Eu lia muito. Não cheguei a fazer promessa, mas peguei uma bíblia que o Silas [ex-colega de seleção de base] e li muito. Foram longas horas de reflexão e a palavra de Deus, que eu havia abandonado, me manteve psicologicamente com resistência"

O crime de Berna

Cuca, Eduardo, Fernando e Henrique retornaram ao Brasil após quase 30 dias presos na Suíça em razão do episódio ocorrido na concentração do Tricolor durante a participação na Copa Philips.

A liberação deles ocorreu antes do fim do processo, para que eles respondessem em liberdade.

De volta ao Brasil em agosto daquele ano, todos se manifestaram abertamente sobre o caso, posando até juntos para matérias de jornais e revistas.

O que diz a defesa de Cuca

A defesa de Cuca reputa ser lamentável o irresponsável linchamento por situações ocorridas há 34 anos e contrária à realidade dos fatos. Reafirme-se que Cuca não manteve qualquer relação ou contato físico com a vítima, que, aliás, não o reconheceu, conforme confirmado por diversas reportagens daquela época".

Injustificável a imprensa ressuscitar um processo atingido pela prescrição e definitivamente arquivado. Distorções e especulações serão responsabilizadas cível e penalmente, ainda mais por se tratar de processo sigiloso, evidenciando a precariedade e inconsistência de qualquer pretensa informação fornecida por terceiros".
Daniel Leon Bialski e Ana Beatriz Saguas, advogados de Cuca.