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Goleiro ucraniano foge da guerra para viver sonho no interior gaúcho

Danylo Liutyi, goleiro do União Frederiquense, nasceu na Ucrânia - Arquivo Pessoal
Danylo Liutyi, goleiro do União Frederiquense, nasceu na Ucrânia Imagem: Arquivo Pessoal

Marinho Saldanha

Do UOL, em Porto Alegre

27/05/2023 04h00

Com apenas 18 anos, Danylo Liutyi tem muita história para contar. Nascido em Kiev, o goleiro deixou a Ucrânia em razão da guerra com a Rússia, viveu na Polônia e deixou a família na Espanha para viver o sonho de jogar futebol no Brasil.

Hoje ele defende o União Frederiquense e depende da abertura da janela de transferências internacionais, em julho, para atuar em partidas oficiais. O time da cidade de Frederico Westphalen, distante aproximadamente 365 quilômetros de Porto Alegre, disputa a Série A2 do Gauchão.

Aos 17 anos, Danylo treinava no Ucsa, da quarta divisão ucraniana, na cidade de Kiev, e já tinha o desejo de ser atleta profissional. Mas tudo poderia ter acabado em 24 de fevereiro do ano passado, quando um barulho muito forte mudou a rotina de sua casa, às 5h. Era um míssil interceptado pela defesa antiaérea da Ucrânia.

"Eu escutei uma explosão. Era nossa defesa interceptando um míssil da Rússia. O barulho foi muito grande. Eu acordei e corri até o quarto dos meus pais, estava com muito medo. Perguntei se tinham ouvido, disseram que sim. Ali eu tive um ataque de pânico, fiquei 30 minutos na cama, sem conseguir fazer nada, tremendo de medo. Depois do ataque de pânico passar, começamos a conversar sobre buscar refúgio e deixar a Ucrânia", contou Danylo ao UOL.

De Kiev, ele, os pais e a avó partiram para Lviv carregando apenas o que conseguiram pegar. "Não sabíamos para onde ir, para Polônia ou para Romênia. Decidimos sair da Ucrânia quando a guerra começou. Mas conseguimos levar só o que realmente era necessário. Nossas roupas ficaram todas em Kiev", contou.

Depois de quase um mês em Lviv, a família teve a oportunidade de sair da Ucrânia pela Polônia e foi para Varsóvia, onde tinha amigos. A saída foi autorizada apenas porque o pai de Danylo é diabético e ele tinha 17 anos, ou seja, não prestariam serviço militar.

Sem possibilidade de refúgio permanente na Polônia, a família precisou partir novamente. Foi em Madrid, por intermédio da Cruz Vermelha Espanhola que a família conseguiu se estabelecer. Por lá ficaram os pais e a avó do goleiro. Mas ele seguiu seu sonho.

Danylo começou a estudar português aos 14 anos, pois frequenta a Igreja Universal e convivia com muitos brasileiros. Hoje é fluente na língua. E no clube em que atuava na Ucrânia firmou um laço que o fez cruzar o oceano. O empresário Pablo Bueno é representante do Ucsa e tinha conhecido o goleiro quando levou o meia-atacante Tetê — atualmente no Leicester, da Inglaterra — para atuar no Shakhtar Donetsk.

Hoje, o agente é ligado ao União Frederiquense e foi quem convidou o goleiro a seguir seu sonho no Brasil. O desafio foi aceito porque os objetivos são grandes. Danylo quer voltar para Ucrânia um dia, quer jogar em gigantes da Europa, deseja Real Madrid ou Liverpool.

"Eu quero esperar a guerra acabar para voltar, não é algo para agora. Tenho muita saudade do meu país, é minha casa. Quero ajudar o serviço militar ucraniano, porque confiamos neles, eles são muito fortes. Mas meu objetivo é jogar na Europa, no Real Madrid, no Liverpool", contou.

Hoje sua única ligação com o Velho Continente são as videochamadas com a família ou as notícias que acompanha sobre a situação em seu país.

"Tenho contato com um amigo que morava em Cracóvia [Polônia] e foi horrível porque quase todos os dias têm alarme [antimíssil]. Ainda hoje é assim. As pessoas se acostumaram até hoje escutar alarme. No início, as pessoas ficavam com medo, agora eles estão mais tranquilos, acham que é normal. Eu acompanho muitas notícias da Ucrânia, hoje em dia, os russos saíram de Kiev, o que foi bom, mas os mísseis são complicados", explicou.

Vida no Brasil

Danylo já está totalmente adaptado. Desde março no Brasil, ele se sente confortável com os colegas de clube, tanto os brasileiros quanto um inglês e um angolano que vivem a mesma situação dele: esperam a janela de transferências para começar a jogar.

"A rapaziada do União é muito top, são muito bons", disse. "Eu fiquei surpreso quando cheguei ao Brasil, porque ouvir falar é uma coisa, estar aqui é outra. As pessoas são muito abertas, falam muito, na Ucrânia normalmente não falamos muito. Eu sou uma pessoa fechada, só falo com meus amigos, meus pais, quem eu conheço, mas aqui já falo com todo mundo", acrescentou.

"O futebol brasileiro é muito diferente do ucraniano. Lá, nosso campeonato é muito físico, aqui é mais técnico e rápido. Eu gosto muito do nível do clube, do pessoal, dos jogadores, para mim é uma grande oportunidade e uma alegria. Todos os dias estou crescendo e quero chegar no topo", finalizou.