Como STJD chegou à pena de 12 jogos para Bauermann em dia de tensão e choro
O suspiro e o choro contido de Eduardo Bauermann, quando ouviu o primeiro — e relevante — voto no julgamento pelo envolvimento em manipulação de partidas, apontaram o alívio e a surpresa com a punição de 12 jogos de suspensão.
A pena recebida por Bauermann na primeira instância do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) contrastou com os banimentos de Gabriel Tota e Matheus, por exemplo. Paulo Miranda? Mil dias de gancho. Quem saiu ainda mais feliz foi Igor Cariús — a denúncia contra ele não foi acolhida pelos auditores.
Mas há como explicar a linha de raciocínio dos julgadores e os elementos da sessão de ontem, que teve duração aproximada de oito horas, contando interrupções, o que aumentou a tensão para quem foi julgado.
Na prática, em relação a Bauermann, houve o seguinte:
O zagueiro do Santos, assim como os outros sete jogadores do processo, foi denunciado em artigos que previam penas pesadas pelos seguintes atos: descumprir o regulamento, atuar para prejudicar a equipe de forma deliberada — com agravante de que a ação fora cometida em troca de vantagem ou promessa de vantagem financeira —, além de atuar de forma contrária à ética do desporto.
As investigações do Ministério Público de Goiás, com base em conversas de celular e depoimentos, indicam que Bauermann aceitou e chegou a receber dinheiro para ser expulso contra o Avaí. Ele não cumpriu. Fez o mesmo para o jogo seguinte, novamente não cumpriu ao longo dos 90 minutos.
O jogador chegou a devolver o dinheiro, relatou que foi ameaçado e fez pagamentos de quatro parcelas de R$ 50 mil para os apostadores, totalizando R$ 200 mil.
A atitude de Bauermann foi identificada no STJD como atuação contrária à ética desportiva, cujo artigo prevê pena máxima de 6 jogos.
Como as atitudes de Bauermann envolveram dois jogos (contra Avaí e Botafogo), ele teve a pena duplicada. Logo, pegou 12 jogos de gancho.
Houve depoimento pessoal, confissão por parte do denunciado, foram esclarecidas várias questões, a gente teve o depoimento do médico, a situação de saúde. Nesse caso, a gente verifica que ele concordou, mas não executou. Ele recebeu e devolveu. Não vislumbro nos artigos trazidos pela procuradoria a hipótese narrada, na forma praticada pelo atleta. Contudo, ao concordar em manipular, fica realizada uma conduta antiética" Adriene Hassen, auditora relatora do processo em primeira instância
O auditor que recebe a relatoria é responsável por ir mais fundo na análise do processo. O voto do relator costuma ter peso simbólico nos julgamentos no STJD, embora os demais auditores sejam livres para discordar. Especificamente em relação ao zagueiro do Santos, só um dos quatro auditores votantes não aplicou os 12 jogos. Logo, foi voto vencido.
As provas usadas pelo STJD como ponto de partida surgiram a partir da Operação Penalidade Máxima, conduzida pelo Ministério Público de Goiás (MP GO). Caberia aos advogados de cada jogador adicionar elementos para refutar a tese da procuradoria do tribunal usada na denúncia.
Os meandros do julgamento
Por uma questão processual, Bauermann foi o último dos jogadores a depor e o último a ouvir o veredito sobre si a cada rodada de manifestação dos auditores da Quarta Comissão Disciplinar. Foi o único que ficou até o final e saiu satisfeito, embora tenha optado por não dar entrevistas.
Alguns advogados tentaram pedir suspensão da sessão para que houvesse desmembramento do caso e os oito não fossem julgados juntos. Os auditores rejeitaram e mantiveram a pauta. A partir de então, houve a colheita de depoimentos. Em fato raríssimo no STJD, houve pedido para que alguns depoimentos, o de Bauermann, inclusive, tivessem sigilo. Mas ficou público um primeiro depoimento que ajudou o zagueiro do Santos, dado pelo médico do clube, Guilherme Dilda.
O que ele disse? Bauermann estava com uma fratura no pé antes do jogo contra o Avaí e foi a campo mesmo assim. "Após esse jogo, voltou a relatar dor, optamos por fazer exames que constataram fratura. O tratamento é conservador porque a fratura estava alinhada e significa imobilização. O ideal seria a retirada do Eduardo, mas, pela situação que a gente se encontrava, ele se mostrou à disposição da equipe", disse o médico.
A estratégia da defesa foi atrelar, em partes, a decisão de tomar o cartão vermelho já depois do jogo contra o Botafogo — logo, sem efeito para as apostas. Isso também trouxe a reboque a sustentação de que não houve prejuízo ao Santos dentro do jogo e tampouco efeito no resultado das partidas em questão.
"É importante destacar que nesse processo há diferentes denunciados, diferentes imputações. A participação do Bauermann não foi de prejudicar o jogo ou prejudicar o Santos. Isso tem que ficar bem frisado. Ele teve a infelicidade de se envolver com essa quadrilha que está rondando o futebol brasileiro, mas em nenhum momento ele chegou a prejudicar a equipe e isso foi considerado no depoimento pessoal dele. Mas teve um atleta hoje aqui que foi até absolvido", disse o advogado Rogério Pastl, que defendeu Bauermann no processo.
Uma fala do advogado durante o julgamento chamou atenção. Ele afirmou que o zagueiro disse "sim" aos apostadores por não saber dizer "não".
"Quando isso foi dito, foi em um contexto que ele foi atraído para isso por uma pessoa da sua relação. E naquele momento, ele deveria ter trancado a conversa e ele não soube dizer esse 'não'. É isso que está trazendo essa punição para ele hoje. Ele deveria ter, sim, evitado essa conversa", completou Pastl.
Quando Eduardo Bauermann entrou no auditório e se sentou ao lado da mulher, Ingrid, em uma das cadeiras do plenário, a previsão já era de que o dia seria longo por ali. Enquanto outros jogadores estavam depondo, ele ficou em uma sala ao lado dos advogados. Discreto, falou pouco. Conversou mais ao pé do ouvido de Ingrid, que o abraçou e sorriu ao seu lado quando as lágrimas vieram.
Mas o caso não acabou. A decisão de ontem é passível de recurso. Criminalmente, é preciso aguardar o desfecho do processo na Justiça de Goiás.
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