Desmaio, organizadas e críticas à imprensa: palmeirense é velada em SP
Um chapeuzinho estampado com duas espessas listras verdes, uma branca e o nome do bairro que abriga a sede da torcida Mancha Alviverde — a Barra Funda — repousa sobre os pés inertes de Gabriella Anelli Marchiano. O mesmo chapéu aparece algumas vezes acima do caixão que acolhe seu corpo, em uma tela onde fotos deslizam incessantemente.
Nas imagens, Gabriella desfila camisas do Palmeiras, da Mancha, posa ao lado de familiares e junto de amigos nas arquibancadas do estádio. Em frente ao caixão, um banner seleciona fotos antigas, em que Gabriella aparece menina, mas já trajada com seu manto sagrado — a camisa do Palmeiras verde-limão entrega o ano do clique: 2008.
Gabriella Anelli Marchiano foi morta no domingo (9) aos 23 anos, após ser atingida por estilhaços de uma garrafa que teria sido arremessada por um torcedor do Flamengo em direção à torcida palmeirense, antes do duelo entre ambos os times, nos entornos do Allianz Parque. Seu corpo foi velado nesta terça-feira (11), desde as 6h, em Embu das Artes, na Grande São Paulo.
Dez coroas de flores, metade delas entregues por torcidas organizadas e uma do próprio Palmeiras, cercam o caixão e perfumam a capela do Cemitério Memorial Parque Paulista. Os cânticos cristãos ecoam nas caixas de som, fazendo do lado de dentro da cerimônia um espaço menos silencioso que a parte externa. Faz calor em São Paulo, mas as tantas árvores que preenchem o Memorial dão sinais confusos a respeito da temperatura, mais amena do que diz a previsão.
Palmeirenses reunidos em frente à capela, onde é velado o corpo de Gabriella, reclamam da ostensividade da imprensa, que, segundo o que dizem, são como abutres na dor alheia. Outros dão de ombros. "Melhor que falem sobre isso", pontua um. A capela foi destinada à família, num acordo não-verbal, mas postural. "Por favor, a família pede que não tirem fotos", dirige-se à reportagem uma mulher cuja idade não passaria dos trinta anos apesar da feição abatida. À imprensa, foi destinado um espaço distante de onde estava o corpo e os que o velavam.
Pais e avós de Gabriella não saíram do lado do caixão durante toda a cerimônia. Uma tia, pálida, esbravejava: "Era ela quem teria de me enterrar, e não o contrário". A fraqueza bambeou suas pernas, e os braços fortes dos familiares ao redor seguraram-na para que o desmaio não a levasse ao chão. Corre-corre até um banco, onde a pressão foi se normalizando até voltar a ter força para esbravejar.
Gabriella cuidava de crianças autistas e com síndrome de Down para juntar um dinheirinho e assistir aos jogos do Palmeiras todo mês. No fatídico dia em que personificou a realidade da violência nos estádios e seus entornos, Gabriella ganhou uma carona do pai, Ettore, até o terminal Campo Limpo, na zona sul de São Paulo. Dali, ela partiria para encontrar os amigos de sempre, e viajaria rumo à zona oeste, ritual frequente da palmeirense.
A cerimônia de celebração da vida de Gabriella tirou lágrimas e sorrisos dos que acompanhavam. Durante as exéquias, o padre pediu adesão: "Descanso eterno dai-lhe, senhor", dizia, seguido pelo coro de vozes: "Que a luz perpétua ilumine".
A despedida de Gabriella aconteceu sob aplausos dos presentes. O apelido de família foi citado diversas vezes ao fim da cerimônia. "Brilha no céu, bebê", desejavam.
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