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Ex-líder da Mancha fala sobre venda de drogas perto do Allianz: 'Amsterdã'

Colaboração para o UOL, em Aracaju

13/07/2023 15h01

Ex-presidente da Mancha Verde, Paulo Serdan afirmou em entrevista ao De Primeira que o entorno do Allianz Parque virou "terra de ninguém". Segundo ele, há livre comercialização de drogas e uma série de irregularidades em relação às medidas de segurança.

Terra de ninguém: "O que aconteceu com a Gabriella poderia ter sido evitado há muito tempo. O entorno do nosso estádio virou uma Amsterdã, pelo livre comércio de drogas, pelo livre comércio de tudo, todo mundo faz o que quer ali dentro. Qualquer leigo que andar no entorno do nosso estádio vai entender que a tragédia já estava escrita. No meio da rua, só tá faltando colocar umas bancas lá oferecendo, principalmente nas ruas Caraíbas e Palestra Itália, virou terra de ninguém."

Bares e garrafas: "Não adianta fechar bar, tem que ver quem está fazendo coisa errada, não o fiscal da Prefeitura tomar dinheiro do marreteiro. Está na cara, ficam 300 marreteiros, tem a GCM para fiscalizar e tem os fiscais da Prefeitura, e os caras estão trabalhando à vontade. (...) Não existe uma repressão contra isso, os marreteiros vendem cerveja em garrafa à vontade, não são nem os bares em volta. A cada dois metros, tem um marreteiro com cinco, seis, sete geladeiras de cerveja vendendo garrafa."

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Segunda morte: "É a segunda morte que tem no entorno do clube: na final do Mundial, a gente perdeu a vida de outro menino que tomou tiro de um guarda de presídio que estava no meio de 30 mil pessoas armado. Não tinha jogo no Allianz, tinha aquela multidão. Ele nem torce para o Palmeiras, e o que ele estava fazendo armado no meio de 30 mil pessoas? (...) A investigação parou. Por que o cara estava armado? Existia suspeita de que ele estava dando cobertura para quem estava roubando telefone, e todo jogo os caras roubam telefone para caramba, todo jogo acontece de tudo ali, é assim que está funcionando."

Confira mais trechos da entrevista

Poderia ter sido muito pior: "A rapaziada [torcida organizada] estava respeitando o que foi conversado [com a PM], entrou muita gente mais cedo no estádio. Quando chegou a notícia da possível morte da menina, ou que ela estava ferida gravemente, aí virou uma ebulição, poderia ter sido muito pior. É um efeito dominó, existem informações desencontradas, mas parece que pegaram o flamenguista, trouxeram para para colocar dentro da viatura e aí [os torcedores do Palmeiras] viram que estava colocando ali, nem eram eles os caras que tinham jogado, mas aí começa 'ah, foi o cara que atirou, que matou a menina'. O que aconteceu foi a irresponsabilidade de quem tinha que fazer a prevenção."

Prevenção e punição: "A palavra correta é prevenção, se tiver prevenção, se tiver investigação, inteligência, conversar com a torcida olho a olho, se tiver punição e fiscalização da punição, a coisa muda, porque a função da torcida é torcer pelo seu clube. (...) Se você fizer um trabalho de prevenção, de que uma vai por um lado, a outra vai pelo outro, você vê que a gente teve um bom período agora sem problemas. Não vou contar a torcida do Flamengo porque vem de fora, estou falando das torcidas do São Paulo, teve aquele último incidente envolvendo a Mancha e os Gaviões e depois disso houve uma parada.

Não tem investigação: "A Polícia prende grandes traficantes, grandes bandidos, prenderam quase duas mil pessoas nos atos lá em Brasília, fizeram tudo muito rápido. Em 40 anos, eles não conseguem ter um trabalho de investigação para saber quem é o incentivador, quem é que causa, o líder intelectual, porque alguém planeja, a coisa não acontece assim, se o jogo é em Presidente Prudente e os caras se encontram dois mil de cada lado, alguém planejou aquilo. O maior estado da Federação não tem competência de investigação, fica muito fácil passar tudo para o presidente da torcida, mas não é assim, existem grupos, grupos e mais grupos porque o Estado fez questão de acabar com a liderança das torcidas."

'Deixaram acontecer': "A gente está evoluindo, as Arenas estão ajudando para isso, mas o poder público está sentado na preguiça, deixa acontecer. Para mim, como foi o Pacaembu em 1995, essa daí foi mais uma que deixaram acontecer para não ter outras torcidas em São Paulo. Já não tem torcida única em clássico regional e também clássico nacional vai ser torcida única, ou seja, quem vai ter que trabalhar? Ninguém. Eles deixam acontecer e a primeira coisa é 'vamos acabar com os clássicos nacionais aqui'. Pode ser uma triste coincidência? Pode ser, mas para mim está na cara que deixaram acontecer, não dá para mim admitir que um Palmeiras e Flamengo, com toda a rivalidade que existe fora de campo desde os anos 80, o policiamento aja dessa forma, deixando a entrada da torcida visitante sem controle nenhum."

Falha da GCM: "Tinha três GCM's [Guardas Civis Metropolitanos] na placa, eles abandonaram a placa sem motivo nenhum. Eles viram as costas e saem fora no momento em que é arremessado alguma coisa na torcida do Palmeiras, que pega praticamente em cima da cabeça de um GCM que está na placa. Essa situação faz parte da preguiça da Polícia, da incompetência do Estado, de não identificar. Tem imagem para caramba. Identificou? Dois anos sem ir ao estádio e vai se apresentar no Batalhão, nos Bombeiros, vai prestar serviço para a comunidade, vai no hospital na hora do jogo. Mas quem vai fiscalizar isso? Não tem."

Torcida única?: "Mostra a preguiça e a falência do Estado. As torcidas têm CNPJ, lideranças, presidentes, diretoria, você tem as liderança de bairro, sub-sedes, qual a dificuldade do poder público conversar e identificar todo mundo, saber quem é quem? Na Alemanha, quando tem jogo de duas torcidas grandes, o trem, o metrô, cada uma tem um horário, elas não se misturam. Isso que aconteceu com a Gabriela acontece na Alemanha, na Grécia, na Inglaterra, em Portugal, mas aqui a proporção das coisas é muito maior, porque as torcidas organizadas aqui são muito maiores do que lá. Lá o assunto é muito mais sério porque envolve religião, racismo, política, aqui, não: a torcida é torcida, por isso acho mais fácil resolver. Mas, enquanto você tiver uma parte da imprensa, da sociedade que ficar batendo no poder público, na PM, questionando a escolta no ônibus da torcida, qual é o problema? Eles estão lá para isso."

'Quem fiscaliza isso?': "Você tem um departamento da Polícia Civil que cuida da intolerância, não existia isso antes, mas há uma preguiça de fiscalizar as coisas. Você vai aplicar uma pena, se o crime é grave e o cara vai em cana, ele está preso, vai pagar o que tem que pagar, mas quando é uma pena menor, ele vai ficar restrito a entrar no estádio, tem que se apresentar na delegacia, seja lá onde for; quem fiscaliza isso? Não tem, estou falando de uma experiência que eu vivi, eu não deixei de ir porque sabia que eu teria problemas, mas de todos que se prontificaram a pagar para a entidade não ser cobrada por isso — porque o erro é da pessoa física, não é da entidade —, metade não cumpriu. Se hoje tem identificação facial, é muito mais fácil, é só bater a foto. Tem uma lista na Federação, mas o PM vai ficar com uma lista na mão dele na porta do estádio? Não existe isso."

Impunidade: "A gente teve aquele problema com alguns integrantes da Tupi, que nem eram da Tupi, eram aqueles skinheads naquele jogo contra o Santos na rua Turiassú, que foi um escândalo. Na época, o [ex-procurador de Justiça] Fernando Capez queria fechar a Mancha de novo, eu conversei com ele e disse: 'Quem estava na frente era eu, fulano, beltrano, está todo mundo aqui, tem mais 10 ou 15 a se apresentar, a entidade não tem nada a ver com isso, nós fizemos a ação, qual é a nossa punição?' Eu fiquei dois anos precisando me apresentar no Distrito do Carandiru, mas só 15 cumpriram, os outros 15 não cumpriram porque eles não conseguem fiscalizar. Quem vai fiscalizar isso, quem vai ter a disposição?"

Sobre meninos e porcos

A violência entre torcidas foi retratada na terceira temporada do podcast UOL Esporte Histórias. A série "Sobre meninos e porcos" conta em seis episódios a história de como as torcidas organizadas saíram da festa e chegaram à violência.

O relato é centrado no assassinato de Cléo Sóstenes Dantas nos anos 1980, considerado o marco da chegada das armas de fogo às brigas de organizadas.

  1. Respeito é pra quem tem
  2. E ninguém vai me segurar
  3. Sangue derramado
  4. Calibre 38
  5. Chumbo de caça
  6. Sem saída

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Assista ao De Primeira na íntegra

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