Como La Liga combaterá o racismo na próxima temporada após o caso Vini Jr.

Delegado de La Liga no Brasil, Daniel Alonso contou em entrevista exclusiva ao De Primeira as medidas que serão tomadas para combater o racismo na próxima temporada do Campeonato Espanhol, que começa na sexta (11). Ele também reconheceu os erros do presidente da liga, Javier Tebas, na condução do caso Vinicius Jr.

Medidas antirracistas: "Para a gente, é um tema fundamental, conseguir passar o que a gente faz, consegue fazer e não consegue fazer. Primeiro, não podemos permitir, tolerar, La Liga vem lutando veementemente nos últimos 10 anos contra o racismo, mas é importante colocar o que La Liga consegue fazer e o que não consegue. La Liga não consegue punir quem comete esse crime, não tem poder de punição, as competências. Lá tem a Federação Espanhola e tem La Liga, que organiza o campeonato na parte de gestão, não na parte esportiva ou de autoridade de punição. É a Federação quem controla a arbitragem, quem tem o poder de punir um clube, de fechar a arquibancada ou de estabelecer um mecanismo de perda de pontos ou o modelo que for melhor. O que La Liga faz é denunciar esses infratores, pegar todas as imagens e recursos que a gente consegue para encontrar e punir esses infratores. A gente gostaria de ter essa competência, a gente vem trabalhando nessa linha, mas não conseguimos ainda porque é um trabalho de lobby, de mudança de linha. Tudo que muda a lei, leva tempo. A gente não vai cessar nesse trabalho".

Plataforma La Liga X racismo: "O que a gente pode fazer? A gente acabou de lançar uma plataforma que é 'La Liga versus racismo'. A gente realmente tem um problema com isso, temos que combater, combatemos durante anos, mas talvez não comunicamos do jeito certo ou não agimos no limite. É o que vamos fazer esse ano, essa plataforma vem para colocar todo um conjunto do que a gente vem fazendo e vai fazer, coisa práticas: temos já uma plataforma de denúncia para os torcedores, vamos colocar QR Codes nas arquibancadas para o torcedor, se identificou alguém com qualquer tipo de xingamento racista, comportamento não aceitável, seja racismo, homofóbico, o que for, você consegue denunciar anonimamente e identificar quem está fazendo. A gente vai fazer campanha para isso".

Formar torcedores e clubes: "Não é só formar os torcedores, mas os clubes, os dirigentes, olhar também para a gente e ver como que a gente estava tratando esse problema e o que conseguimos melhorar. Fizemos um trabalho interno: faço parte de uma rede de 47 pessoas no mundo com 11 escritórios, pegamos 20 pessoas em volta do mundo, nos mercados-chave, mais impactados pelo temas do racismo, e com pessoas de todo tipo, de raça, classe e condição social que trabalham na La Liga, para ter essa diversidade e enfrentar o problema entendendo o problema. A partir daí, criamos propostas de como podemos agir, do que podemos fazer e adotamos uma linha. Vamos fazer projetos de formação com crianças, torcedores, incentivar os clubes a punir esses torcedores. Não é toda a torcida, são grupos específicos que têm esses comportamentos, mas o clube não pode permitir, tem que punir e banir. Só que a gente não pode impor, a gente tem que incentivar o clube, tem que formar os clubes e esses torcedores, para não haver esse comportamento".

Confira outros trechos da entrevista com Daniel Alonso, representante de La Liga

Ele rechaçou que La Liga tenha sido conivente nos ataques racistas sofridos por Vini Jr. na última temporada, mas admitiu os erros de Javier Tebas.

Afirmou que La Liga vai trabalhar para melhorar as condições no estádios para o craque brasileiro e demais jogadores do Campeonato Espanhol.

Admitiu que houve uma crise de imagem na marca e falou sobre as mudanças no conteúdo visual para a próxima temporada, com a parceria com a EA Sports, empresa de jogos eletrônicos.

Javier Tebas errou com Vinicius Jr?

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"O Tebas errou, errou no tom, no momento e no caso do Vinicius. Ele mesmo pediu desculpas, não sou eu que falo, ele mesmo saiu e pediu desculpas. A gente denunciou às autoridades, mas não conseguimos punir. Quem pegou os 10 casos do Vinicius nos últimos dois anos, foi lá no Ministério Público e colocou nossos recursos, imagens e nossos advogados para proteger o atleta foi La Liga. Quem não fez, quem realmente não puniu foi o Ministério Público. E nem o clube, o Real Madrid, colocou seus advogados a serviço do Vinicius, fomos nós, isso é um fato. Quando Tebas errou nesse último caso, e ele errou mesmo no tom e como explicou o caso, ele mesmo saiu e pediu desculpa porque estava errado, a gente realmente entendeu que estava errado e pediu desculpas. Não tem desculpa, mas por que ele falou [em alusão a Vini Jr.] de se informar? Às vezes os jogadores ficam numa bolha e o entorno não permite que chegue a informação de como funciona realmente alguns processos. Se você vai ver, no Brasil, tudo fica na CBF, então você olha e fala 'olha, La Liga não está fazendo nada, não está punindo, tinha que ser mais efetiva, fechar arquibancada', como acontece recentemente no Brasil. Mas La Liga não pode por lei, não dá para medir na mesma régua porque não é comprável."

La Liga foi conivente com o racismo?

"A gente não fica imóvel, não é essa realidade. Além do lobby, a gente pode agir na parte da formação dos clubes, incentivar para punir esses torcedores, não podemos punir, mas vamos cobrar para que os clubes façam, a gente não pode ficar parado. [...] Sempre dá pra fazer mais, estamos no caminho, mas não dá para fugir de que a realidade hoje são as limitações da lei. Mas não vamos ficar parados, não."

'Queremos que Vinicius fique e vamos dar condições'

"Acreditamos que o Vinicius vai, sim, permanecer e vamos dar as condições para ele permanecer, apoiar ele e proteger todos os jogadores. Para essa nova temporada, fizemos uma mudança de marca e de posicionamento, a gente quer bancar essa mudança também contra o racismo nessa parte da marca, de chegar mais próximo das novas gerações, desse novo consumidor, que é um desafio da indústria, desses adolescentes que têm mais dificuldade de acompanhar um jogo completo, são mais do videogame. A EA Sports entrou no naming da La Liga, é uma aposta deles na seriedade do campeonato e no potencial de impacto social do campeonato. Como a gente quer também dar essa condição de estrelas como o Vinicius continuar no campeonato? É melhorando a marca, o impacto na sociedade, a gente assume essa responsabilidade de impactar positivamente na sociedade, dar as condições para que estrelas como Vinicius se sintam à vontade, que também seja bom para eles, ter um campeonato de qualidade, ter a segurança nos estádios para as grandes estrelas, é um desafio para a gente fazer isso realidade, estamos trabalhando nessa linha, fazer com que isso seja sentido pelos atletas e pelos torcedores. Não vamos parar pelo caminho, essa nova fase de marca, de imagem e de impacto em novas gerações vai também na parte de formação e sociedade, de trazer para eles os valores positivos do esporte, é tudo um conjunto. Então, sim, queremos que Vinicius fique e vamos dar as condições para que novas estrelas cheguem."

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Crise de imagem na La Liga

"Sim, sentimos, é uma crise global, de impacto global, tivemos que estar próximo dos nossos parceiros e explicar. A gente não vinha comunicando bem as nossas ações, porque existia a desinformação de quem fazia o quê. Teve um impacto forte para explicar às marcas, aos parceiros, de ter um compromisso forte contra o racismo e explicar o porquê a gente não podia punir, porque é a cobrança de qualquer torcedor. A gente está sofrendo ainda isso, estamos falando disso porque é um tema fundamental, que afeta a imagem da marca —- não só no Brasil, mais no Brasil porque é o Vinicius, mas afeta globalmente. É um tema que a gente tem que reforçar. E a parte de punição dos clubes pode ser um dos caminhos, a gente vê como outras competições estão agindo nesse caso, é um tema de lei, demora a mudar uma lei, tomara que a gente consiga essa competência."

Parceria com EA Sports

"Nessa mudança de posicionamento, com a entrada da EA Sports, traz um produto visual diferente, fazer a linha entre o virtual e o real — o jogo que você transmite, o jogo que é jogado, e quando você assiste na TV ter uma sensação mais próxima do que é o videogame. Justamente nessa linha de se aproximar de novas gerações, que é um desafio para qualquer entidade esportiva hoje, ser mais atrativo. Agora vai começar o campeonato, vocês vão acompanhar os jogos e perceber isso: vai mudar pouco a pouco o conteúdo visual, vai ser mais enriquecido com gráficos, vai ter mais pegada de videogame. O torcedor mais antigo pode não gostar tanto, mas entendemos que é um movimento que faz sentido para a marca, nós temos que nos adaptar às novas gerações e a essa nova realidade de consumo de conteúdo esportivo."

Assista ao De Primeira na íntegra

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