Na Copa Rio, Data Fifa tem buzina, bolas isoladas e poucas testemunhas

A estreita rua sem saída chamada de Léia Barcelos, em Belford Roxo, na Baixada Fluminense (RJ), te desemboca obrigatoriamente para um pequeno portão azul, com uma fachada que indica que ali situa-se o acanhado estádio Nélio Gomes.

Na chegada do UOL ao local, a resposta "só tem essa entrada para todo mundo mesmo" mostrava que após ingressar naquela espécie de portal, toda a modernidade das atuais arenas fica para trás e uma imersão automática acontece para o bom e velho futebol raiz, que não tem descanso nem mesmo em semana de Data Fifa.

O saboroso programa daquela fria e chuvosa tarde de quarta-feira (6), às 14h45, foi a partida entre Boavista e Serrano, pelas oitavas de final da Copa Rio, tradicional torneio carioca que reúne as equipes de menor investimento do estado e que coloca à disposição do campeão o direito de escolha entre participar da Copa do Brasil do ano que vem ou da Série D do Campeonato Brasileiro.

A entrada única "para todo mundo mesmo", ao qual o funcionário se referiu, era o acesso que serve tanto para a imprensa como para os torcedores mandantes, visitantes, familiares e convidados dos jogadores.

Disposta a viver aquela atmosfera ao máximo, a reportagem chegou ao jogo com bastante antecedência, cerca de duas horas antes de a bola rolar, e se deparou, naquele momento, com apenas cinco torcedores, sendo um deles bem à vontade, sem camisa e batendo papo enquanto cutucava os calos de suas solas dos pés.

À esquerda da entrada funcionava o bar, que além de bebidas e alguns biscoitos (ou bolachas para além do território carioca), vendia também pipocas feitas previamente e que foram ensacadas e amarradas com arames de pão de forma.

Atrás de um dos gols estava a arquibancada de poucos degraus destinada aos visitantes, no caso, o Serrano. No lado esquerdo, o setor separado ao mandante, o Boavista, com um espaço um pouco maior. Já no direito, a tribuna de imprensa, onde ficam também dirigentes dos clubes, olheiros e uma simpática churrasqueira de tijolo, ainda com carvões e um cheiro defumado que indicavam que não muito tempo antes uma carninha havia sido queimada por ali.

Buzina ensurdecedora e ex-Flu na chuva

Entrada para o estádio Nélio Gomes situa-se em uma estreita rua sem saída em Belford Roxo (RJ)
Entrada para o estádio Nélio Gomes situa-se em uma estreita rua sem saída em Belford Roxo (RJ) Imagem: Bruno Braz / UOL
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Não foram muitos, mas aos poucos os torcedores dispostos a ver a peleja foram chegando. E nenhum deles era mais animado e chamava mais atenção que um senhor fanático pelo Serrano, munido com uma buzina de carro ensurdecedora, a ponto de, posteriormente, atrapalhar até mesmo a comunicação entre os treinadores e os jogadores quando a partida começou.

Mas ele não queria nem saber. Com gritos muitas vezes solitários em prol do clube de Petrópolis (RJ) e algumas adaptações fora de ritmo das músicas dos quatro grandes do Rio, ele passava seu apoio ao time da Região Serrana.

Perto da hora do jogo, ganhou a parceria de dois integrantes da torcida "Somos a voz do Serrano", a única que estendeu faixa no duelo.

Bem próximo a ele, pegando chuva e tudo, se abrigou o reforço mais conhecido do time petropolitano até aqui: Tartá, ex-Fluminense, que foi anunciado na semana passada e ainda não estreou.

Também por ali estavam jogadores de outros times que disputam a Copa Rio e que conversavam invariavelmente com os atletas em campo.

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Sumiço das chuteiras e bolas roubadas para 'mercado paralelo'

Tribuna do estádio Nélio Gomes, em Belford Roxo, que recebeu a partida entre Boavista e Serrano
Tribuna do estádio Nélio Gomes, em Belford Roxo, que recebeu a partida entre Boavista e Serrano Imagem: Bruno Braz / UOL

Na tribuna de imprensa, olheiros atentos e funcionários de outros clubes acompanhavam o jogo e mantinham uma resenha contínua. Até que o celular de um deles, com short de um clube da Copa Rio, tocou e um mistério veio à tona: um par de chuteiras de um jogador da equipe havia sumido.

Após mais de cinco minutos de conversa, explicou que o local onde haviam treinado não fornecia chaves para guardar os calçados, a ligação foi encerrada, e ele fez questão de dizer a todos que não possuía responsabilidade alguma sobre o episódio.

O intrigante assunto, porém, não o intimidou a engatar outra resenha de sumiço, desta vez das bolas da agremiação.

"A gente tinha comprado um monte de bola nova e foi treinar nesse lugar lá. Aí quando fomos embora, me dei conta de que ficou faltando uma. Passou um tempo, voltamos lá e o senhor que fica em volta do campo virou para outro cara e falou: 'não quer comprar uma bola, não? Tem uma novinha aqui', só que ele não tinha me visto", disse aos homens que estavam ao redor, justificando que não a pegou de volta porque ela não estava identificada com caneta.

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Bolas isoladas em depósito de caminhões

Depósito de caminhões e guindastes, invariavelmente, recebe bolas isoladas do estádio Nélio Gomes
Depósito de caminhões e guindastes, invariavelmente, recebe bolas isoladas do estádio Nélio Gomes Imagem: Bruno Braz / UOL

Este parágrafo poderia começar citando a parte em que "a bola rolou" no Nélio Gomes, mas dada as condições do gramado, é mais recomendado dizer apenas que o jogo teve inicio.

O campo, aliás, não foi problema para alguns. Um jogador do Serrano antes da partida, por exemplo, encheu os pulmões para dizer ao companheiro: "Eu sou bom em campo ruim".

O duelo foi ríspido, com muitas entradas duras e algumas bolas isoladas no depósito de caminhões e guindastes vizinho ao estádio, e que fica atrás do gol à direita da tribuna de imprensa.

Árbitro 'da antiga' e filhos de Adriano, Edmundo e Kléber Leite

Filho do Imperador, Adriano Carvalho foi titular pela primeira vez como profissional na vitória do Serrano sobre Boavista
Filho do Imperador, Adriano Carvalho foi titular pela primeira vez como profissional na vitória do Serrano sobre Boavista Imagem: Bruno Braz / UOL
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A grande atração em campo, sem dúvida alguma, foram os filhos de Adriano e Edmundo, que atuam juntos no Serrano.

Adriano Carvalho, filho do Imperador e atacante de 17 anos, começou como titular já em sua segunda partida como profissional, mas teve uma atuação discreta e foi substituído ainda no fim do primeiro tempo para a entrada de Canela.

Edmundo Júnior, meia de 24 anos, ficou no banco de reservas e não entrou.

Na tribuna de imprensa estava ainda Kléber Leite Filho, que é filho do ex-presidente do Flamengo, Kléber Leite, e que é o gerente da empresa que administra o futebol do Serrano, a Interfut.

Na função de "técnico de arbitragem", que é uma espécie de quinto elemento que coordena os árbitros e auxiliares, estava um velho conhecido: Luis Antônio Silva dos Santos, mais conhecido como Índio, que por anos apitou no futebol brasileiro, principalmente o carioca.

Quando o jogo já não contava mais com tanta luminosidade, dada a falta de refletores e o tempo nublado, ele encerrou com a vitória do Serrano por 1 a 0, com um golaço de cobertura do atacante Fábio Polhão. Com os petropolitanos também haviam vencido na ida por 1 a 0, ficaram com a vaga para as quartas de final.

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