'Só o sim é sim': como estupro coletivo mudou lei usada contra Daniel Alves
Do UOL, em São Paulo
23/02/2024 16h49
O caso "La Manada" levou milhares às ruas de Pamplona, na Espanha, em 2018 e inspirou a criação da lei "Só o sim é sim", em 2022, que foi usada para condenar Daniel Alves por estupro —ela unificou os crimes de agressão sexual e estupro.
Em 2016, cinco homens estupraram uma jovem de 18 durante a Festa de San Fermín (São Firmino);
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Eles foram julgados em 2017 e condenados a nove anos por abuso sexual, e não estupro;
A sentença revoltou os espanhóis, que foram às ruas protestar;
A pena foi revista e ampliada em 2019 e culminou na criação da Lei da Garantia Integral da Liberdade Sexual.
Caso "La Manada"
Os cinco homens levaram a vítima, alcoolizada, ao saguão de um edifício, tiraram suas roupas e a "penetraram por via oral, anal e vaginal". De acordo com a sentença, eles ainda gravaram a violação e roubaram o celular da mulher.
Os juízes apontaram o caso como "abuso sexual", e não agressão, por não haver comprovação de violência ou intimidação. Um deles, inclusive, votou pela absolvição dos cinco.
Não se percebe nenhum traço de oposição, rejeição, desgosto, nojo, repugnância, negação, incômodo, sofrimento, dor, medo, descontentamento, vergonha ou qualquer outro sentimento semelhante, alegou o juiz
Mobilização e nova lei
Mais de 30 mil pessoas foram às ruas de Pamplona protestar, e um milhão de pessoas apoiou, virtualmente, iniciativa que tinha como objetivo impedir a atuação dos juízes espanhóis que atuaram no caso "La Manada". As informações são da BBC.
Em 2019, o Tribunal Supremo da Espanha elevou de nove para 15 anos a pena imposta aos cinco homens. O órgão revogou as sentenças anteriores e qualificou os fatos como crime contínuo de estupro.
Depois, foi aprovada a "Lei da Garantia Integral da Liberdade Sexual". Popularmente, ficou conhecida como Lei do "só o sim é sim" e tem como principal ponto o "consentimento sexual" em casos de abuso ou agressão.
Ela elimina a distinção entre abuso sexual e agressão sexual, com punições distintas para cada caso. Dessa forma, não há a "obrigatoriedade" do uso de força ou tentativa de resistência da vítima para se configurar agressão.
Só se entenderá que há consentimento quando este tiver sido livremente expresso por meio de atos que, diante das circunstâncias do caso, expressem claramente a vontade da pessoa. Trecho da Lei da Garantia Integral da Liberdade Sexual.
Entenda a condenação de Daniel Alves
O jogador Daniel Alves foi condenado a 4 anos e 6 meses de prisão pelo estupro de uma jovem em Barcelona. A decisão judicial levou em conta o pagamento da multa de R$ 900 mil (150 mil euros) (com ajuda da família Neymar) como atenuante de pena. O valor será destinado à vítima por danos morais e lesões causadas.
Daniel Alves terá liberdade vigiada por cinco anos depois de cumprir os 4 anos e 6 meses em regime fechado, está proibido de se aproximar da casa ou trabalho da vítima e fica inabilitado para exercício de emprego, cargo público, profissão ou comércio relacionado com menores por cinco anos após cumprimento de pena.
Como denunciar violência sexual
Vítimas de violência sexual não precisam registrar boletim de ocorrência para receber atendimento médico e psicológico no sistema público de saúde, mas o exame de corpo de delito só pode ser realizado com o boletim de ocorrência em mãos. O exame pode apontar provas que auxiliem na acusação durante um processo judicial, e podem ser feitos a qualquer tempo depois do crime. Mas por se tratar de provas que podem desaparecer, caso seja feito, recomenda-se que seja o mais próximo possível da data do crime.
Em casos flagrantes de violência sexual, o 190, da Polícia Militar, é o melhor número para ligar e denunciar a agressão. Policiais militares em patrulhamento também podem ser acionados. O Ligue 180 também recebe denúncias, mas não casos em flagrante, de violência doméstica, além de orientar e encaminhar o melhor serviço de acolhimento na cidade da vítima. O serviço também pode ser acionado pelo WhatsApp (61) 99656-5008.
Legalmente, vítimas de estupro podem buscar qualquer hospital com atendimento de ginecologia e obstetrícia para tomar medicação de prevenção de infecção sexualmente transmissível, ter atendimento psicológico e fazer interrupção da gestação legalmente. Na prática, nem todos os hospitais fazem o atendimento. Para aborto, confira neste site as unidades que realmente auxiliam as vítimas de estupro.