Choro, aplausos e surpresa: bastidores da entrevista histórica de Vini Jr.
A sala de imprensa da Ciudad Deportiva do Real Madrid estava cheia. Eram 17 câmeras com tripé, duas dezenas de celulares e quase 100 jornalistas. Vinícius Júnior ia falar.
Uma entrevista naquela sala do brasileiro era, por si só, um acontecimento. No Real Madrid, os jogadores não participam das coletivas. E Vini não falou em eventos do clube desde que os casos de racismo se intensificaram, em 2022.
Quando a entrevista começou, ficou claro que o encontro com a imprensa não seria especial apenas por ser raro. Ele seria histórico por ser único.
As primeiras perguntas foram sobre racismo: os casos na Espanha, a luta de Vinícius, os motivos que o levam a sofrer, as razões que motivam a não desistir. Na terceira, Vini desabafou. "Cada vez estou mais triste, tenho menos vontade de jogar. Mas vou seguir lutando." A voz embargou, e parte da sala de imprensa aplaudiu.
Na sexta pergunta, Vini falou do peso antirracista na sua vida. "Preciso me concentrar muito todos os dias. Só quero jogar futebol e fazer o melhor para a minha família", disse. E desabou, num choro que poderia ter encerrado a entrevista. Foi novamente aplaudido.
Rodrigo Paiva, diretor de comunicação da CBF, perguntou se ele queria continuar e até foi a um repórter para saber se poderia mudar o assunto para proteger o atacante. Vini quis continuar. Mas jogar com a torcida contra no Bernabéu, ajudar Endrick a se adaptar, liderar a seleção brasileira? Nada era mais importante.
O assunto voltou. Os dirigentes da CBF — entre eles o presidente Ednaldo Rodrigues e o coordenador Rodrigo Caetano - olhavam-se surpresos. Nada estava combinado ou ensaiado. Era Vinícius Júnior se abrindo diante dos jornalistas em uma sala de imprensa, e diante de milhões de pessoas que, segundos depois, faziam o tema ganhar as redes sociais.
A repórter Kiyomi Nakamura, que cobre a seleção brasileira há quase três décadas, pediu o microfone. E também se emocionou ao tentar fazer uma pergunta. "Ela está chorando?", perguntou um jornalista espanhol a um colega.
Em seguida, vieram as perguntas dos espanhóis. Havia muitos temas: a temporada do Real Madrid, o duelo com Lamine Yamal e o grande assunto do momento na capital espanhola: Kylian Mbappé.
Mas a emoção de Vinícius não deu margem a nenhuma outra pauta "Era impossível perguntar sobre Mbappé depois que vimos hoje", disse Anton Meana, da Cadena SER. O repórter, um dos mais conceituados na cobertura do Real Madrid, perguntou sobre a possibilidade de Vini deixar a Liga Espanhola por causa dos casos de racismo.
"Pensei em sair, sim. Mas se saio daqui, estou dando o que querem aos racistas. Vou seguir lutando e jogando no melhor do mundo, ganhando títulos e fazendo muitos gols, para que vejam cada vez a minha cara", disse Vini. E foi novamente aplaudido.
Fernando Burgos, da Onda Cero, também se emocionou ao perguntar sobre o apoio de outros jogadores. "Nunca vi algo assim, e olha cubro o Real Madrid há 20 anos. O que ele fez hoje é histórico".
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