A prisão do ex-jogador Robinho no Brasil pode acelerar o julgamento do outro condenado no mesmo caso, o motorista Ricardo Falco.
Os advogados de defesa temem que a confirmação da condenação de Robinho abra um precedente que também levaria Falco, que está no país, para a cadeia.
Ambos foram condenados a nove anos de prisão pelo estupro de uma mulher albanesa na Itália — a justiça do país europeu pediu que eles cumprissem pena no Brasil.
O caso de Robinho chegou ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) antes e já foi julgado.
O julgamento de Falco ainda não foi marcado.
A advogada de Falco, Lorena Machado, afirma ao UOL que o artigo 216-k do Regimento Interno do STJ poderia permitir ao ministro Francisco Falcão confirmar a condenação do motorista usando a sentença contra Robinho como precedente.
A decisão seria assim tomada de maneira mais rápida e não precisaria ser submetida aos demais ministros da Corte Especial do STJ.
O parágrafo único desse artigo diz que "o relator poderá decidir monocraticamente nas hipóteses em que já houver jurisprudência consolidada da Corte Especial a respeito do tema".
"Ricardo tem o direito constitucional de ser julgado por uma corte, após sustentação oral por sua defesa.
Se aplicarem este artigo, esse direito pode ser violado", afirma a advogada, especialista em processo penal pela Universidade de Coimbra e em direito internacional dos direitos humanos pela Universidade de Utrecht, na Holanda.
A entrevista com a advogada está no oitavo episódio do podcast UOL Esporte Histórias - Os Grampos de Robinho, que está disponível nesta sexta-feira (12) para assinantes do UOL e pode ser ouvido no player acima.
A partir de amanhã (13), o novo episódio estará disponível também nas plataformas digitais.
Você pode ouvir os episódios anteriores no UOL Esporte.
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Quero receberA tese da defesa
Como a condenação de Falco já transitou em julgado na Itália, ou seja, já é definitiva, Lorena Machado não comenta sobre a participação de seu cliente no crime.
Ela prefere se ater aos aspectos técnicos da legislação que rege a possibilidade de confirmação de sentenças estrangeiras no Brasil.
Esse é um tema que vem dividindo juristas especializados no direito internacional, principalmente pelo fato de que a Lei da Migração, de 2017, usada como base no caso Robinho, nunca tinha sido aplicada a um brasileiro nato condenado por um crime na Itália.
"Eu jamais defenderei qualquer tipo de violência praticada contra a mulher, nem violência psicológica, violência física, muito menos violências sexuais", afirma Lorena sobre ser advogada de um homem condenado por estupro.
"Enquanto advogada, estou aqui por uma tese de defesa. Eu entendo pela inconstitucionalidade, inconvencionalidade e ilegalidade dessa transferência de pena. Além de ser mulher, eu sou uma advogada, uma profissional, professora e acadêmica. E na minha visão essa homologação não convém do ponto de vista jurídico", completa.
Os juristas contrários à confirmação da pena dos brasileiros nesse caso costumam apontar três argumentos principais:
- O artigo 100 da Lei da Migração, de 2017, não poderia ser aplicado a brasileiros natos, mas somente a brasileiros naturalizados ou estrangeiros morando no Brasil;
- Ainda que a Lei da Migração seja considerada, ela não poderia ser aplicada no caso de Robinho e de Falco porque o crime foi cometido em 2013, antes de sua vigência;
- O tratado de cooperação jurídica entre Brasil e Itália, apontado pela lei como um dos requisitos à confirmação de condenações entre os dois países, não prevê a execução de penas de prisão.
O ministro Francisco Falcão rebateu esses argumentos em seu voto no caso de Robinho e foi acompanhado por outros nove colegas.
Apenas dois ministros da Corte Especial do STJ foram contra a prisão, mostrando que existe quase um consenso a favor da confirmação da pena.
O advogado e professor de direito Valério Mazzuoli, doutor em direito internacional e professor da Universidade Federal do Mato Grosso, é frequentemente citado como um dos especialistas contrários à transferência da pena de brasileiros condenados na Itália.
Ao UOL ele criticou a decisão da corte:
"Se o STJ tivesse vencido bem esses argumentos, e na minha opinião, não venceu bem, a argumentação não foi boa do tribunal, a lei ainda diz o seguinte: que se fosse aplicado a brasileiros natos e que se pudesse retroagir ainda teria que ter um tratado internacional permitindo. E justamente com a Itália o Brasil tem um tratado que nega, [o tratado] fala: toda a cooperação entre Brasil e Itália não compreende as medidas de execução de pena. Com a Austrália existe possibilidade, com outros países existe a possibilidade, mas justo com a Itália não compreende."
Na argumentação dos advogados de Falco e de Robinho — o ex-jogador é defendido por José Eduardo Alckmin, primo do vice-presidente da República —, os brasileiros deveriam ser investigados e julgados novamente no Brasil.
Nesse caso, as autoridades brasileiras poderiam importar provas da Itália para recomeçar o caso do zero no país.
Outros quatro amigos foram denunciados pelo Ministério Público de Milão, além de Falco e de Robinho, mas o processo deles está suspenso porque eles já não estavam na Itália quando as investigações começaram e nunca foram encontrados pelos italianos.
O podcast Os Grampos de Robinho também está disponível no YouTube do UOL Esporte, Spotify, Apple Podcasts, Amazon Music, Deezer e em todas as plataformas de podcast.
Confira abaixo os episódios anteriores:
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