Por que o VAR no Brasil é pré-histórico se comparado com o da Inglaterra?
Marília Ruiz
Do UOL, em São Paulo
13/08/2024 19h58
"Arcaico" ou joça?
Por que nosso VAR parece pré-histórico se comparado com o também muitas vezes questionado VAR da Premier League, por exemplo, se a empresa que presta o serviço (Hawk-Eye Innovations), criadora do software, tem na sua cartela de clientes tanto a Premier League quanto a CBF?
Não, não há mistério. Há uma clara diferença entre as câmeras usadas no Brasil e na Inglaterra. Diferença que se reflete na qualidade da imagem reproduzida. Diferença no número de aparelhos em cada estádio. A tecnologia pode ser a mesma (software e sistema), mas o produto depende, obviamente, da qualidade dos equipamentos (hardware e componentes) e também das pessoas escaladas para a função.
Software é uma coisa, e a CBF garante que utiliza o mesmo software das principais ligas. A nossa operação é que, literalmente, distorce a imagem. Dependemos do número de câmeras, da infraestrutura dos estádios para o posicionamento do equipamento (distância x ângulo) e dos árbitros treinados para operar e interpretar as imagens.
Finalmente, mas não menos importante: dependemos do contrato de prestação de serviços de quem gera as imagens. No caso do Campeonato Brasileiro, por exemplo, a detentora dos direitos (Globo) repassa à CBF as imagens. Em cada jogo da Série A, por exemplo, não há um número fixo de câmeras: apenas um mínimo de sete; não há máximo. Então, há partidas com VAR que trabalha com as imagens geradas por sete câmeras e há jogos que são "espiados" por 21 (clássicos em TV aberta, por exemplo). Há VAR em estádios "padrão-Fifa" em que as câmeras ficam posicionadas conforme o manual de melhores práticas; e há jogos em estádios que "sombreiam a imagem".
Outra diferença marcante é a ausência do uso da tecnologia de impedimento semiautomático - uma das postulações feitas por dirigentes a Ednaldo Rodrigues, presidente da CBF, em maio passado. A informação é que ela é "inviável" no país. Inviável = estádios sem estrutura para fixar câmeras (além dos custos e responsabilidade pela manutenção); 12 câmeras só para essa operação (segundo a FIFA, que as utiliza na Copa e no Mundial de Clubes); muitos campeonatos (com direitos de transmissão pulverizados entre várias empresas).
"Arcaico", como disse Abel Ferreira, pode não ser o melhor adjetivo para qualificar o VAR. Mas "joça" certamente é. Não tem cabimento o "alargamento" do protocolo da FIFA do uso das imagens como se faz por aqui. Não tem cabimento a falta de critério no mesmo campeonato. Não tem cabimento que decisões em campo sejam colocadas em xeque por imagens que não esclarecem nada. Não tem cabimento a disparidade na quantidade de câmeras em jogos da mesma competição. Não tem cabimento.
O VAR não é uma entidade com vontade própria que decreta verdades absolutas: VAR é o resultado da combinação entre as imagens coletadas e a habilidade das pessoas escaladas. Passou da hora de se falar o óbvio.